BE: “Este Governo está sujeito a uma exigência sobre ética muito superior aos anteriores”

O caso Galp/Euro 2016 "não é saudável para a nossa democracia”, repetiu a líder do Bloco de Esquerda à chegada de Liberdade, o acampamento de jovens, que decorre até 8 de Agosto.

Foto
Catarina Martins no acampamento de jovens do BE Nelson Garrido

O tema era incontornável: as viagens dos secretários de Estado pagas pela Galp e nas respostas que deu aos jornalistas, antes de falar aos jovens do acampamento do Bloco de Esquerda, a coordenadora Catarina Martins repetiu várias e várias vezes a mesma ideia: “os governantes têm de compreender que este Governo está sujeito a uma expectativa e a uma exigência sobre a sua conduta ética muito superior aos governos que o antecederam.”

No Parque de Campismo de São Gião, em Oliveira do Hospital, a coordenadora do Bloco voltou a dizer o que outros dirigentes já tinham dito: “O Bloco de Esquerda já falou sobre isso, disse a sua posição desde o primeiro momento, nós consideramos eticamente reprováveis e inaceitáveis todas as ligações entre governantes, entre deputados e grandes grupos económicos. Achamos que não é saudável para a nossa democracia.”

Acrescentou, no entanto, duas notas: “Sobre o que nós dissemos até agora tenho apenas duas coisas a acrescentar. A primeira é que sendo certo que um código de conduta pode ser algo de interessante, nada substitui o bom senso. E todos os governantes têm de compreender que este Governo está sujeito a uma expectativa e a uma exigência sobre a sua conduta ética muito superior aos governos que o antecederam. A sua credibilidade depende disto e isto é para o Bloco de Esquerda algo de determinante.”

A segunda nota é a seguinte: “Há neste momento uma comissão eventual para a transparência a funcionar na Assembleia da República. O Bloco de Esquerda desde a primeira hora entregou projectos de lei sobre a transparência, sobre impedimentos e incompatibilidades de titulares de cargos públicos. Sobre uma série de matérias que evitam a porta giratória entre poder político e poder económico, e ajudam à transparência e à saúde democrática do nosso país. Este é o momento para essa comissão avançar com os seus trabalhos”, acrescentou.

Catarina Martins aproveitou ainda para lançar um apelo ao Parlamento: “O repto que deixamos é que o Parlamento seja capaz de ter leis e conclusões ainda antes do Orçamento do Estado, que promovam a transparência e que parem portas giratórias entre o poder económico e poder político.”

E voltou a sublinhar que, embora um “um código de conduta” pareça ao Bloco “um passo positivo, nada substitui o bom senso, e nada substitui esta consciência que todos os governantes têm de ter de que este Governo está sob uma expectativa e exigência sobre a sua conduta ética muito superior às dos governos anteriores, e é importante que perceba isso”.

E insistiu sempre nesta ideia: “Não é nunca bom para um Governo quando há qualquer confusão entre um cargo público e uma empresa privada, muito menos uma empresa privada com as dimensões que tem a Galp. Para o Bloco de Esquerda, repito: este Governo está sujeito a uma expectativa e a uma exigência muito maior sobre a sua conduta ética do que qualquer governo que o antecedeu. E é preciso que compreenda isso mesmo”. 

Questionada sobre se o Governo teria gerido bem a questão, nomeadamente retirando poderes ao secretário de Estado da Internacionalização, no que toca a decisões sobre a Galp, Catarina Martins disse que o Bloco vai “continuar a acompanhar”, mas assumiu que “nunca bom para um Governo quando há qualquer confusão entre um cargo público e uma empresa privada, muito menos uma empresa privada com as dimensões que tem a Galp”.

Finalmente, respondendo a uma pergunta sobre o estudo de opinião mais recente da Eurosondagem, publicado no Expresso deste sábado, e que dá o PS e o Bloco juntos à beira da maioria absolutos, Catarina disse: “Há um ano as sondagens diziam que o Bloco de Esquerda estava quase morto. Por isso eu sou a pior pessoa para comentar sondagens porque acho que valem muito pouco.”

"Temos muito de pedalar”

Depois das declarações à imprensa, Catarina Martins foi falar com os jovens. Não havia nenhum palanque. A coordenadora sentou-se numa roda de cadeiras e falou com eles. E ouviu. Sobre vários temas que interessam aos jovens, mas não só. Catarina Martins referiu-se a um “partido que é um movimento”. Esta é a definição de partido para o BE, um “instrumento valioso para a transformação” que querem fazer.

Aos jovens, lembrou que o Bloco se formou como uma força de esquerda radical que uniu causas que já existiam na sociedade, como o feminismo, as questões laborais. São um partido que quer intervir, que não se resigna à ideia de que não há alternativa. “Quem está no Bloco não espera que as coisas aconteçam por si só. Fazemos por essa transformação”, disse, referindo-se a várias causas, como a LGBT, por exemplo.

Avisou ainda os jovens, que a ouviam atentamente, que “o capitalismo não cairá de podre” e “reinventará” sempre formas de “manter a exploração”. Por isso o Bloco, que conseguiu conquistas no Parlamento, é preciso, mas não chega. Também é preciso que os movimentos sociais lutem. Porque, disse a coordenadora, a transformação legislativa precisa de ser acompanhada de transformação social.

No meio dos jovens, insistiu na necessidade de haver um movimento estudantil forte, que lute pelo acesso à escola e ao ensino superior. Que recuse a ideia de que os jovens não querem saber de nada e andam é a caçar pokémones. O Bloco “está aqui para ajudar” a que essas lutas sejam feitas. E elas passam pela precariedade – palavra, disse, que antes do BE não se usava –, passam pelo desemprego, pelos baixos salários, pelas horas de trabalho a mais. Por combater "o medo”.

No fim, admitiu mesmo que, sem esses movimentos, sem uma força sindical forte, a geringonça não consegue fazer tudo sozinha. O acordo com o qual se comprometeram com o Governo é para travar o empobrecimento do país. “É isto transformador? Não é. Este é o objectivo do Bloco? Não.” O BE quer “fazer a diferença na vida concreta das pessoas”, mas para isso “é preciso não esperar que a geringonça resolva problemas”. São precisas lutas estudantis, sindicais, movimentos. “Achar que um acto eleitoral muda as nossas vidas é um erro”, disse, insistindo que, a par disso, é preciso organizar, aumentar e continuar a luta social. “Ficar à espera nunca é boa ideia em democracia.” E acrescentou: “Temos muito de pedalar”. Até porque se não o fizerem, virá uma “voz” de Bruxelas e de Frankfurt dizer que tem de voltar a ser tudo com antes. “Ninguém fará as nossas lutas por nós”, concluiu antes de ouvir os jovens. E a uma das perguntas, sobre Cultura, não hesitou em admitir que “a cultura é uma das áreas onde não se vê grande diferença” em relação ao Governo anterior: “Este Governo não está a fazer nada de jeito na Cultura.”

Sugerir correcção
Ler 11 comentários