Activistas querem grupo de trabalho para DST e medicamentos para VIH mais baratos

GAT leva à comissão parlamentar de Saúde um conjunto de propostas para facilitar o acesso ao tratamento de doenças sexualmente transmissíveis.

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O grupo adianta que existem sete mil portugueses com DST a precisar de tratamento ADRIANO MIRANDA

Medicamentos mais baratos, mais centros de rastreios, valências de saúde mais habilitadas e uma comissão de trabalho para as questões relacionadas com as doenças sexualmente transmissíveis (DST): são estas algumas das medidas que o Grupo de Activistas em Tratamentos (GAT) vai propor esta quarta-feira à comissão parlamentar de Saúde. O grupo quer ver aprovada pelo Parlamento uma resolução com medidas que facilitem o acesso e a continuidade de tratamentos no Serviço Nacional de Saúde (SNS) de doentes com VIH/SIDA, tuberculose, hepatites virais e infecções sexualmente transmissíveis.

Feito um balanço da anterior legislatura, o GAT encontrou uma “série de situações pendentes” que Luís Mendão considera urgente resolver. Em declarações ao PÚBLICO, o presidente do GAT justificou a urgência de rever a resolução de 2011 sobre o VIH, para que esta possa acompanhar os conhecimentos adquiridos nos últimos anos sobre a doença e seguir as recomendações das instâncias de saúde internacionais.

"Devido à dimensão do problema que tem, Portugal podia assumir-se exemplar no combate a estas epidemias", destacou Luís Mendão. Na reunião desta sexta-feira, querem “saber a disponibilidade das forças representadas na comissão de Ssaúde para retomarmos o trabalho”.

Esta retoma pode trazer à mesa uma nova negociação de preços dos medicamentos, que surtiu alguns efeitos durante a anterior legislatura, quanto aos fármacos de tratamento da hepatite C. “Nós precisávamos deste tipo de acordos, que asseguram acesso universal aos tratamentos a preços comportáveis, para garantir que a despesa com medicamentos é controlada”, reiterou o presidente do GAT.

O mesmo responsável defende que se conseguem “os melhores tratamentos a melhores preços se tratarmos mais gente do que aquela que estamos a tratar actualmente”. O GAT não quer ser “tropa de pressão” contra a indústria farmacêutica, mas reconhece que “estes tratamentos podem reduzir muito substancialmente de preço”. Luís Mendão lembrou que existem cerca de 30 mil pessoas exclusivamente em tratamento contra o vírus da SIDA, com um custo entre os 230 e 250 milhões de euros por ano apenas em medicamento retrovirais.

Sete mil a necessitar de tratamento

“Mas ainda há cerca de 7 mil pessoas que necessitam de tratamento. É no VIH que Portugal tem uma situação pior no contexto da Europa Ocidental”, afirmou. Segundo o activista, para serem atingidos os objectivos subscritos pelo país perante as instituições europeias, é necessário integrar mais 15 mil pessoas em tratamento. Aos preços atuais, a situação ilustra um aumento da despesa com medicamentos de 50%. Para os doentes com VIH, os medicamentos constituem 80% das despesas de tratamento.

Como “não é pouco provável que algum orçamento do Estado até 2020 o possa gastar”, o GAT reafirma a necessidade de investir na prevenção, identificação e ligação dos doentes aos cuidados de saúde. Ligação esta que é muitas vezes cortada, tendo o GAT recebido queixas de pessoas com VIH/SIDA que são “perdidas ou que são excluídas pelo sistema já depois de estarem identificadas como doentes crónicos”. O responsável avisa que o sistema “não vai atrás destas pessoas” que deixam de ir aos tratamentos ou de levantar a medicação.

Luís Mendão reiterou ainda a necessidade do SNS se adaptar aos cidadãos mais vulneráveis. “Temos muitas queixas de pessoas que têm dificuldade em aceder ao sistema, principalmente de migrantes em situação irregular, consumidores de drogas, reclusos, trabalhadores do sexo e homens que fazem sexo com outros homens”. O GAT registou uma série de queixas de cidadãos que dizem “discriminadas e sobretudo estigmatizadas pelo sistema.”

O GAT espera que este seja um primeiro passo, nesta legislatura, para eliminar as barreiras para apoiar cidadãos vulneráveis, como os consumidores de drogas, migrantes e reclusos com dificuldade de acesso a determinados cuidados de saúde. "Esperamos que sejam implementados direitos à século XXI", afirmou Luís Mendão.

Visão integrada de combate às DST

Para a GAT, esta não é uma luta apenas pelos doentes com VIH/SIDA. Luís Mendão reconhece que é necessário uma “visão e uma liderança integrada” em matéria de prevenção e identificação precoce destas doenças, uma vez que afectam populações-chave e partilham modos semelhantes de transmissão. Quer por isso propor à comissão a criação de um grupo de trabalho parlamentar para doenças sexualmente transmissíveis, que possa concentrar esforços na matéria e retomar alguns dos trabalhos da comissão para o VIH, criada na anterior legislatura.

À comissão parlamentar de Saúde levam ainda a proposta de criação de centros de rastreios de doenças para além do VIH/SIDA. “Que sentido faz termos apenas para VIH quando há doenças, como a tuberculose ou a hepatite C, que podem estar relacionadas?”, interrogou Luís Mendão.

O GAT quer que os casos de infecção em Portugal se enquadrem nas médias europeias. Pelo contrário, neste momento, o país tem níveis superiores à média dos países da Europa Ocidental em casos de VIH/SIDA, tuberculose e hepatites virais. É uma prioridade para o GAT a diminuição dos casos de tuberculose multirresistente e os de tuberculose activa. Em 2014, a DGS adiantou que havia cerca de 1940 novos casos de tuberculose.

“Na tuberculose estamos a assistir a uma diminuição lenta do número de casos, mas estamos longe daquilo que são os indicadores em Espanha, França e em Inglaterra”, explicou Luís Mendão.

O director da GAT acredita que o Governo já está no bom caminho ao ter nomeado a mesma pessoa, o médico Kamal Mansinho, para o Programa Prioritário VIH/SIDA e tuberculose e para o Plano para as Hepatites Virais.

Mais infectados, menos mortes

O ultimo relatório Global AIDS Update 2016, da UNSIDA, o órgão da ONU responsável pela prevenção e tratamento do HIV, destaca que as mortes relacionadas com o vírus da SIDA diminuíram 43% em todo o mundo, desde 2003.

Apesar da diminuição do número de mortes, nos últimos dois anos o número de pessoas infectadas com o vírus da SIDA a fazer tratamento anti-retroviral (tratamento e tentativa de eliminação de retrovírus no organismo) aumentou cerca de um terço. Foram cerca de 17 milhões de pessoas em 2015, mais 2 milhões do que em 2014. O estudo contempla 160 países.

Texto editado por Hugo Torres

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