Um buraco tem sempre cobertura quando o Estado paga a factura

O caso da morte do Banif tem ainda contornos por explicar, mas uma coisa é certa: quem beneficia com este triste episódio é o Santander Totta.

É muito difícil, senão impossível, aceitar que o processo não podia ter tido outro desfecho, menos penalizador para os contribuintes. Depois do tempo que o anterior Governo e o Banco de Portugal deixaram passar sem encontrar uma solução para o Banif, a saída foi fazer tudo a correr. Ora, como diz a sabedoria popular, “depressa e bem, não há quem”. Agora, podia-se criar outro provérbio, impopular: “Um buraco tem sempre cobertura quando o Estado paga a factura”. Aqui vale a pena parar um pouco, respirar fundo e fazer contas. Porque, apesar de serem volumosas, estão ainda mal explicadas, e, no final, vão ser pagas por todos nós.

Pelo que se percebe, as perdas do Estado são de 1766 milhões de  ajuda directa, mais 489 milhões via empréstimo ao Fundo de Resolução. Este último valor deverá ser pago por quem suporta o fundo, as instituições financeiras, mas, para já, entra como ajuda de Estado (até porque o fundo é, para todos os efeitos, uma entidade pública). Assim, chega-se aos 2255 milhões de euros. A esta parcela abate-se os 150 milhões pagos pelo Santander, passando o valor para 2105 milhões de euros. Falta perceber se os 825 milhões de euros que o Estado já tinha aplicado no Banif (700 milhões de capital e 125 milhões de Coco, o capital contigente) são para somar ou já estão nas contas do Governo.

Para o veículo criado pelo Banco de Portugal, o Naviget, foram activos (como imobiliário) até aqui avaliados em 2170 milhões e que transitam ao preço de 746 milhões de euros (levando assim um haircut de 66%). Se o valor global da venda ficar abaixo dos 746 milhões, a diferença em causa é somada às perdas já assumidas.

Não esquecendo ainda as perdas dos accionistas privados e de alguns obrigacionistas, resta olhar para quem ganha: o Santander Totta.

O banco, que já demonstrara vontade de crescer através de uma aquisição em Portugal (esteve na corrida ao Novo Banco), passa a ser o segundo maior entre os privados. Isto, por 150 milhões, um valor que é inferior aos lucros dos primeiros nove meses do ano e apenas seis vezes o valor das obras de expansão da sua sede em Portugal.

Além de se blindar contra futuras surpresas, pode ainda descer os custos com o encerramento de balcões e saída de trabalhadores. Isto sem ignorar uma certa ironia, já que o banco está em pleno litígio com o Estado por causa dos prejuízos causados pelos contratos swap que lhe vendeu. Tendo do seu lado a vantagem de o vendedor estar aflito, o Santander ficou com o lombo a preços de saldo. Cada espinha terá o seu preço.

Por fim, é preciso não esquecer que o problema do Novo Banco, e da sua venda (agora com menos um candidato de peso, o Santander), está longe de ser resolvido. Haverá certamente mais uma factura para pagar, e mesmo que o Estado não sofra directamente, a forte participação da CGD no Fundo de Resolução não promete nada de bom. A actual gestão do banco público está a acabar o seu mandato, e a instituição tem ainda de conseguir devolver os 900 milhões de euros que o Estado emprestou, o que, por sua vez, não é facilitado pela exposição ao Fundo de Resolução.

Depois do Banif, as atenções vão agora focar-se, por ordem de ideias, no Novo Banco e na capacidade da CGD devolver as ajudas de Estado. Ou seja, o actual Governo tem ainda muito trabalho pela frente na área financeira. Editor de economia. luis.villalobos@publico.pt

Nota: Este texto foi actualizado e alterado após esclarecimentos dados pelas Finanças, pedidos antes da elaboração do artigo mas que chegaram posteriormente.

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