Partidos turcos preferem governo de coligação a eleições antecipadas

Após 13 anos de hegemonia do AKP, a Turquia deverá ensaiar a experiência das coligações. A economia pressiona nesse sentido.

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Não é fácil fazer coligações num país polarizado, após 13 anos de governo do AKP BULENT KILIC/AFP

O primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu, apresentou na segunda-feira o pedido de demissão do seu governo ao Presidente Tayyip Erdogan, que a aceitou. O governo mantém-se em funções até ser formado um novo executivo, no prazo de 45 dias após a indigitação de um novo primeiro-ministro, Davutoglu ou outra figura.

Após as legislativas de domingo, em que o Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP) perdeu a maioria absoluta e Erdogan viu rejeitado o seu projecto de regime presidencial, os estados-maiores partidários começam a explorar a hipótese de um governo de coligação e fazem as primeiras sondagens.

As atenções estão concentradas no Presidente e no AKP, que têm duas hipóteses: um governo minoritário e instável, cujo desfecho óbvio seria a convocação de eleições antecipadas no Outono; ou um governo de coligação com partidos da oposição. Alguns quadros do AKP começaram por admitir a primeira solução, na mira de recuperar a maioria absoluta dentro de meses. A curta e discreta intervenção de Erdogan não apontou essa direcção: Disse: “Penso que estes resultados não dão a nenhum partido a possibilidade de formar um governo de partido único.”

Jogos partidários
Assinala o analista Cengiz Çandar que o AKP não pode correr o risco de um regresso às urnas porque “os resultados eleitorais indicam que uma nova relação de forças que não mudará em três meses”. De resto, “o AKP está à beira de uma crise interna e parece uma força política traumatizada e em declínio”.

O vice-primeiro-ministro Bülent Arinc, um dos fundadores do AKP e crítico de Erdogan, declarou ontem: “Nós estávamos habituados ao poder. Dirigimos o governo sozinhos por três vezes. Desta vez não tivemos essa sorte. Deste ponto de vista estamos decepcionados.” Vê como inevitável um executivo de coligação. O mesmo afirmou o ex-Presidente Abdullah Gül, outro fundador do partido que se mantém independente: “Devemos avaliar o resultado das eleições com prudência e sem pânico. Apesar de tudo vivemos num sistema multipartidário. (...) Deve tentar-se formar-se um governo em conjunto [coligação]. Ir para eleições não é fácil.”

E também não é fácil fazer coligações num país polarizado, após 13 anos de governo do AKP e de virulentos confrontos em que a oposição acusou Erdogan e o governo de “comportamento ditatorial” e “corrupção”. É uma experiência nova desde os anos 1990.

Kemal Kiliçdaroglou, líder do Partido Republicano do Povo (CHP), recusa eleições e avisa que os políticos “não se podem dar ao luxo de deixar o país sem governo”, o que foi entendido como disposição para fazer um acordo com o AKP. Também o Partido de Acção Nacionalista (MHP), de Devlet Bahçeli, admite uma coligação se for convidado por Erdogan. Ideologicamente, está mais próximo do AKP do que social-democrata CHP. Apenas o Partido Democrático do Povo (HDP, pró-curdo) se colocou de fora.

Para os analistas, a coligação “natural” seria entre o AKP e o MHP. Mas o processo negocial durará semanas e é imprevisível. Tanto Bahçeli como Kiliçdaroglou põem como condição prévia o fim da intervenção de Erdogan nas decisões do governo. E haverá duas pastas “muito quentes” em disputa: o Interior e a Justiça.

Entretanto, os meios empresariais pressionam os políticos a encontrar uma rápida solução dada a difícil situação económica.

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