Dívida grega foi tema marginal na estreia de Tsipras nas cimeiras europeias

Confronto entre o primeiro-ministro grego e a chanceler alemã foi adiado. Crise ucraniana dominou a discussão dos parceiros europeus, que também discutiram medidas de combate ao terrorismo.

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A tradicional foto de família da cimeira europeia desta quinta-feira AFP/Emmanuel Dunand

Para a sua estreia em cimeiras europeias, o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, preparou um discurso optimista sobre o actual “momento crucial de viragem” que se vive na Europa, para reforçar a sua convicção de que os 28 Estados-membros serão capazes de se entender e chegar a uma “solução mútua viável” que permita “curar as feridas da austeridade, atacar a crise humanitária que se alarga pela União Europeia e retornar ao caminho do crescimento e da coesão social”.

Tsipras falava em interesse próprio, referindo-se tanto aos desafios quanto às oportunidades da negociação em curso entre a Grécia e os seus parceiros da união monetária e política – sem se deixar intimidar pela formalidade dos conclaves de Bruxelas. Mas as questões referentes à dívida grega acabaram por ser remetidas para outras reuniões noutras sedes, informou o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk. O que quer dizer que em o esperado braço-de-ferro entre Alexis Tsipras e a chanceler alemã, Angela Merkel – que se encontraram pela primeira vez ao vivo e a cores – não foi mais do que um aperto de mão.

Enquanto aguardava a chegada de Merkel da Bielorrússia (a chanceler alemã viajou com o Presidente da França, François Hollande, da Bielorrússia, atrasando o arranque da cimeira em mais de três horas), o primeiro-ministro grego encontrou-se primeiro com o seu homólogo britânico, David Cameron, e depois com o chefe do Governo belga, Charles Michel, que lhe falaram na urgência de um acordo de Atenas com os seus credores que devolva estabilidade à eurozona (Cameron) e na “criatividade” e “determinação” que serão necessárias para fechar um compromisso com os restantes parceiros europeus (Michel).

Tsipras repetiu aos dois – e mais tarde aos restantes 27 – que o seu objectivo é apresentar uma alternativa às políticas de austeridade “que estão a matar a economia”. No fim do dia, o líder grego conservava o seu inabalável optimismo. “Demos passos importantes, mas ainda há alguma distância a percorrer”, resumiu.

À entrada da cimeira, Merkel tinha menorizado a importância da questão grega, dizendo que esse seria um “tema marginal” na agenda da reunião, que incluía a discussão da crise política e de segurança da Ucrânia e o (consequente) braço-de-ferro entre a Europa e a Rússia, e também as medidas de combate ao terrorismo que os parceiros europeus estarão dispostos a aprovar no rescaldo dos atentados islamistas em França e das operações na Bélgica e Alemanha.

No mesmo tom, notou que ainda há tempo para avaliar as propostas da Grécia relativamente ao seu acordo com a troika. "Há um encontro dos ministros das Finanças marcado para segunda-feira, ainda temos alguns dias”, observou, indiciando a existência de alguma margem de manobra negocial. Mas a condescendência germânica é curta: logo a seguir, Merkel recordou que “a credibilidade da Europa depende do respeito pelas regras e da fiabilidade dos acordos”, palavras imediatamente interpretadas como um sinal de que não tenciona desviar-se da linha (e da política) seguida até aqui.

“O sucesso da Europa sempre foi o de saber chegar a compromisso. Isso acontece quando as vantagens ultrapassam as desvantagens “, prosseguiu Angela Merkel. “Naturalmente, a Alemanha está sempre disposta a encontrar compromissos, mas regras são regras”, declarou, acrescentando que é a confiança entre os parceiros que faz a União funcionar.

Tsipras chegou a Bruxelas com um mandato reforçado para negociar nos termos que apresentou ao eleitorado grego e lhe garantiram a vitória na votação de Janeiro. Na véspera da cimeira, o seu Governo de coligação e o seu partido Syriza venceram um voto de confiança no parlamento de Atenas, sob o pressuposto de uma redução drástica do esforço grego no serviço da dívida, e da rejeição das medidas de austeridade orçamental exigidas pelos credores internacionais. Uma sondagem divulgada pela estação de televisão grega Skai mostrava que Tsipras conta com o apoio de 90% dos apoiantes do Syriza, mas também de 43% dos eleitores do partido de centro-direita Nova Democracia.

Ao mesmo tempo, o líder helénico vinha pressionado pelo prolongamento da maratona negocial do Eurogrupo, que não chegou a um consenso que permita resolver os problemas de financiamento da Grécia depois de uma reunião de horas na véspera da cimeira europeia – mas deixou no ar a esperança de um compromisso no encontro agendado para a próxima segunda-feira. O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, não escondeu a sua preocupação com o impasse negocial. “Esta é uma situação que nos deixa receosos. Desejávamos maior progresso depois do encontro [do Eurogrupo] de quarta-feira”, admitiu.

Tal como Tsipras, Juncker aproveitou a cimeira para defender mudanças no relacionamento dos vários Estados-membros – e principalmente aqueles que integram a Zona Euro –, sublinhando que a integração é a única fórmula para evitar a “armadilha” do baixo crescimento e os riscos do desemprego endémico.

Juncker entregou um documento de oito páginas que é uma espécie de rascunho para reanimar o debate sobre a integração europeia. “Devemos agir gradualmente para fixar mecanismos concretos de fortalecimento da coordenação das políticas económicas, da convergência e da solidariedade”, lia-se na apresentação.

Como previu a chanceler alemã à chegada de Minsk, a crise ucraniana acabou por dominar a discussão de quinta-feira entre os líderes europeus: como se lia nas agências, ninguém deixou de saudar a França e a Alemanha pelos esforços que promoveram o compromisso para o cessar-fogo no Leste da Ucrânia, aceite pelo Governo de Kiev e pelos líderes dos grupos separatistas pró-russos, com o apoio do Kremlin.

Conscientes das dúvidas e reticências nas entrelinhas dos elogios, Merkel e Hollande evitaram triunfalismos – em vez de classificar o acordo como uma vitória, foi apresentado como um “vislumbre de esperança” no sucesso de negociações diplomáticas futuras. Para tal, a EU concordou em manter o debate de novas sanções contra a Rússia no congelador, e em reabrir as conversações trilaterais com a Rússia e a Ucrânia relativas ao comércio de gás natural.

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