Museus só passam para a gestão local se as autarquias quiserem

Secretário de Estado da Cultura fez esta terça-feira, na Assembleia da República, um balanço positivo de 2014,mas admitiu existir um problema no Opart que tem de ser resolvido rapidamente

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O secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, fez um balanço positivo de 2014 Miguel Manso
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Miguel Manso

O secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, garantiu esta terça-feira no Parlamento que só as câmaras municipais que estiverem interessadas receberão a gestão dos museus que ficam nas suas áreas. Na Comissão de Educação, Ciência e Cultura de balanço da política cultural dos últimos meses, Barreto Xavier falou de um 2014 de “estabilização e crescimento” no meio, mas admitiu problemas, referindo-se especificamente ao Opart, o organismo que gere o Teatro Nacional de São Carlos e que tinha como consultor artístico o musicólogo italiano Paolo Pinamonti, que se demitiu em Dezembro.

Foram três horas de uma audição que percorreu praticamente todas as áreas do sector cultural. Ainda assim, houve temas que se repetiram nas perguntas dos deputados ao secretário de Estado da Cultura, como foi o caso da transferência de poderes que Barreto Xavier quer levar a cabo nos museus.

Inês de Medeiros, deputada do PS, exigiu a clarificação da intenção anunciada pelo secretário de Estado no final do ano passado de entregar a gestão de alguns dos museus que respondem directamente à Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) às câmaras municipais locais.

Barreto Xavier começou por explicar que os museus só mudarão de gestão se as autarquias assim o quiserem. “A adesão dos municípios é voluntária”, garantiu, escusando-se a revelar que museus estão já a ser transferidos, por estar a decorrer a fase de negociações.

Inês de Medeiros considerou que há uma “obscuridade com que as negociações estão a ser feitas”, que não deixa o seu partido descansado, questionando “até que ponto o princípio constitucional vai ser respeitado”. Mas Barreto Xavier assegurou que esta descentralização dos museus está a ser feita com o “cuidado exigível”, acrescentando que nada se alterará no funcionamento destas instituições, assim como a passagem para o poder local não acarretará mais despesa para as autarquias.

A fatia do orçamento destinada a esse museu passa para a câmara em questão. “Não pode haver nenhum desvio sobre aquilo que é a lógica dos museus”, defendeu o secretário de Estado, afirmando que ficará contratualizada a “obrigatoriedade de cumprimento dessas responsabilidades”. Os museus que passarem para as autarquias não deixarão também de contar com o apoio das direcções regionais de Cultura, bem como da DGPC.

“Não estamos a empurrar para a administração local coisas que devíamos ser nós a fazer”, respondeu às críticas da oposição Barreto Xavier, quando confrontado pela deputada socialista sobre o critério de escolha dos museus. “A perspectiva não é de que os museus nacionais tenham essa circunstância, mas pode haver, caso a caso, discussões sobre isso”, admitiu.

Belém-Ajuda em breve
Ainda na área do património, Barreto Xavier foi questionado sobre o eixo museológico Belém-Ajuda, para o qual pediu a António Lamas, o novo presidente do Centro Cultural de Belém (CCB), um plano de acção. O secretário de Estado revelou que deverá conhecer brevemente a primeira proposta de Lamas — “um homem muito experiente e com capacidade de iniciativa”.

“Não vamos transferir o modelo da Parques Sintra-Monte da Lua, estamos a falar de coisas diferentes”, disse. “Há um cuidado necessário que envolve diversas tutelas, inclusivamente órgãos de soberania diferentes, poder local e administração central, essa articulação é um trabalho que está a ser feito”, acrescentou.

Numa audição em que aproveitou para fazer o balanço ao ano que terminou, Barreto Xavier não saiu sem falar da venda em leilão das 85 obras de Joan Miró, na posse do Estado desde a nacionalização do BPN. Foi um dos temas mais controversos da tutela em 2014, ainda com desfecho incerto. Correm em tribunal acções que querem impedir a venda das obras, mas Barreto Xavier voltou a deixar claro que as empresas que detêm as obras, Parvalorem e Parups, não têm outra opção em cima da mesa.

Miguel Tiago, do PCP, questionou porque não era esta colecção exposta ao público antes de ser vendida, mas o secretário de Estado fez questão de primeiro corrigir o deputado: “Não estamos a falar de colecção, mas de um conjunto de obras de valor artístico e financeiro muito diferente”.“Bem sabemos que há uma série de processos judiciais que limita a exposição das obras”, concluiu depois, defendendo que o Governo não se deve intrometer nas decisões das empresas.

O deputado comunista perguntou ainda a Barreto Xavier qual o destino da colecção BES — Arte e Finança, “uma das maiores colecções privadas que entretanto deixou de ser privada”. O governante limitou-se a responder que está a acompanhar a situação com o Banco de Portugal e o Novo Banco, reconhecendo “a importância deste acervo”.

Situação da Opart
Por esclarecer ficou a situação actual do Opart, o Organismo de Produção Artística que gere o Teatro Nacional de São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado. Em questão está a demissão de Paolo Pinamonti do cargo de consultor artístico do São Carlos. Em Dezembro, o musicólogo italiano demitiu-se alegando incompatibilidade entre o cargo de Lisboa e aquele que ocupa em Madrid como director do Teatro de La Zarzuela.

A deputada socialista Gabriela Canavilhas acusou Barreto Xavier de não saber gerir a situação e de passar as responsabilidades do caso para o Opart. “Como é que responsabiliza o Opart quando foi a SEC que anunciou a escolha de Pinamonti, anunciou o modelo de contratação, anunciou que se tratava de colaboração entre dois países”, questionou Canavilhas, lembrando ainda que o maestro italiano apresentou a demissão a Barreto Xavier e não à administração do Opart.

O secretário de Estado não respondeu, mas deixou críticas ao organismo: “A situação do Opart não é a melhor. As coisas não têm corrido bem, temos garantido bom serviço de cultura, mas nem tudo corre pelo melhor. É assim na vida das pessoas, é assim na vida do Estado. As coisas podiam estar bem melhor”, acrescentou, destacando a necessidade de se “encontrar rapidamente solução para essa matéria, salvaguardando que o serviço público de ópera se mantenha”.

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