Modelo alternativo de testamento vital

Formulário de testamento vital: era possível fazer melhor

No livro Testamento Vital. O Que É? Como Elaborá-lo? publicado nos inícios de 2011, portanto antes de a lei sobre as directivas antecipadas de vontade (DAV) ser publicada, um de nós apresentou um possível modelo de as elaborar. Para o efeito, consultou diversos modelos europeus existentes, embora tendo sido maioritariamente influenciado pelo modelo andaluz.

Como o modelo do livro pode ser consultado gratuitamente na Net, vamos aqui apenas dar conta desse modelo espanhol, entretanto revisto, por o considerarmos bastante bem feito (a versão que usamos é a de 2012 e pode ser consultada no site da Junta de Andalucia, Consejería de Salud).

Esse modelo tem quatro anexos: um para a inscrição da DAV no Registo existente na Andaluzia (embora os andaluzes utilizem o termo “Declaração de Vontade Vital Antecipada”, para simplificar vamos usar o equivalente português, DAV); outro para que a pessoa dê conta dos seus desejos e preferências, caso não tenha capacidade suficiente para se expressar; um terceiro para que o procurador de Cuidados de Saúde declare aceitar tal (en)cargo; um último para que a pessoa que substitui o outro procurador – caso este não possa estar presente –declare que também aceita a função.

O anexo II, considerado o mais importante, tem seis secções: a) “recolhe os valores que você deseja que se tenham em conta ao tomar decisões sobre a sua saúde”; b) "estabelece as situações clínicas em que você quer que se aplique este documento”; c) “especifica as actuações respeitante à saúde que você quer que se façam ou não”; d) “especifica as suas preferências quanto à doação de órgãos e tecidos” (Portugal tem já um registo quanto a este apartado); d) “recolhe outras considerações e preferências”; e) “permite a designação de um/a representante”.

No anexo II, após um espaço que recolhe elementos concretos quanto à identificação da pessoa, abre-se um campo em branco em que ela poderá expressar os “valores vitais que se hão-de ter em conta e que justificam as [suas] decisões e preferências”. Exemplos: “poder ainda comunicar de algum modo com a família ou amigos/as”; “ter um grau suficiente de consciência para dar-me conta do que se passa à minha volta”; “poder fazer a minha própria higiene”; “alimentar-me sem necessitar de medidas artificiais”; “movimentar-me com a menor ajuda possível”; "viver sem necessidade de estar ligado permanentemente a máquinas de suporte vital”; “viver com a menor dor física possível”; “ser cuidado em minha casa pelas pessoas que me amem”; “permanecer no meu domicílio nos últimos dias da minha vida”.

Como exemplos de situações clínicas em que a pessoa quer que se aplique a sua DAV são-nos dados os seguintes: a) “deterioração grave ou irreversível (coma irreversível, estado vegetativo persistente, estado de consciência mínima)”; b) “doença em estado terminal”; c) “doença em situação de agonia”; d) “doença degenerativa do sistema nervoso em fase avançada”; e) “doença degenerativa do sistema neuromuscular em fase avançada”; f) “demência de causa degenerativa em fase avançada”; h) “imunodeficiência em fase avançada”. Por baixo de cada situação, aparecem as opções "Sim", "Não" e"Não me pronuncio". A seguir, a pessoa encontra um amplo espaço em branco em que poderá enumerar outras “situações clínicas em que não haja expectativa de recuperação, que [lhe] provoquem uma grande deterioração física ou mental ou que sejam incompatíveis com as instruções e valores expressados nesta Declaração”.

Segue-se o apartado em que se encontram as indicações do sujeito sobre como proceder nas situações clínicas já por ele assinaladas. Por baixo de cada uma delas, três possibilidades, antecedidas de novo por pequenos quadrados, de modo a permitir indicar o que se pretende: a) “Transfusão de sangue”; b) “alimentação mediante nutrição parentérica (soros nutritivos por via venosa)”; c) “alimentação através de tubo de gastrostomia”; d) alimentação através de sonda naso-gástrica”; e) “hidratação com soros por via venosa”; f) “técnicas de hemodiálise/diálise peritoneal”; g) “respirador artificial” (ventilação mecânica); h) "reanimação cardiopulmonar”; i) “sedação paliativa”. A pessoa pode, em campo aberto, deixar ainda mais directrizes.

Todas estas indicações encontram-se num guia que, em linguagem muito acessível, vai esclarecendo o leitor. Pegue-se neste guia e neste formulário, compare-se com o formulário sem guia que nós possuímos, e perguntemo-nos se, pelo menos neste campo, não gostaríamos de ser antes andaluzes.

Docente aposentada da UMinho, autora de Testamento Vital (laura.laura@mail.telepac.pt); prof. adjunto da ESEnf da UMinho, autor de Educar para a Morte 

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