“O espaço dedicado ao Papa mostra que ele e a Igreja continuam a ter grande importância”
O arcebispo de Brasília, D. Sérgio da Rocha, nomeado em 2011 por Bento XVI, fala do perfil do novo Papa.
No Brasil, os católicos surpreenderam-se com a renúnica, mas têm mostrado a sua gratidão para com o Papa Bento XVI, diz o arcebispo de Brasília, D. Sérgio da Rocha.
Foi nomeado em 2011 por Bento XVI, fala do perfil do novo Papa e diz, por email: “Independentemente de quem for eleito, penso que a importância do Papa na Igreja e no mundo vai muito além da pessoa que ocupa o posto de sucessor de Pedro”. Apesar de viver no país onde há mais católicos no mundo (mais de 133 milhões, ou seja, 12,2% dos católicos de todo o mundo, segundo o think tank Pew Research Center), D. Sérgio da Rocha acha que “o país ou continente de origem do Papa” não é “o factor mais importante na sua escolha”.
O Brasil é o país com mais católicos no mundo. No entanto, geograficamente está distante de Roma. Como é que os católicos brasileiros estão a viver esse momento de renúncia do Papa Bento XVI?
O povo brasileiro teve a alegria de receber a visita de Bento XVI, em 2007. Além disso, o Brasil foi escolhido por ele para sediar a próxima Jornada Mundial da Juventude. Por isso, devemos-lhe muito.
Num primeiro momento, o sentimento das pessoas foi de perda, com muitas perguntas. Contudo, o que mais se tem destacado na reacção das pessoas é uma imensa gratidão ao Papa Bento XVI pela sua dedicação à Igreja, bem como a admiração pela sua humildade, coragem e amor à Igreja. As nossas comunidades têm rezado muito pelo Papa. Em Brasília, por exemplo, em todas as paróquias tem havido orações e missas pelo Papa, especialmente nestes últimos dias do seu pontificado.
A posição de Bento XVI foi inédita. Qual foi a sua reacção quando soube?
A minha primeira reação foi de surpresa. Cheguei a publicar um artigo num jornal de Brasília (Correio Braziliense) intitulado O Papa que surpreendeu o mundo. Surpreendeu desde o início do seu pontificado, quando recém-eleito se apresentou como "humilde trabalhador na vinha do Senhor" e com sua primeira carta encíclica dedicada ao tema do "amor" – Deus caritas est. Surpreendeu em muitos gestos de proximidade e diálogo com as diversas religiões e com as diversas igrejas cristãs. Surpreendeu ao renunciar, embora a renúncia fosse prevista pelo Direito Canónico e ele mesmo já tinha admitido tal possibilidade.
A minha surpresa inicial tem sido acompanhada de admiração pelo gesto humilde e corajoso. Embora fisicamente frágil, Bento XVI mostrou-se espiritualmente forte, pois somente um homem forte, de convicções profundas e generoso, seria capaz de assumir tamanho sacrifício pelo bem da Igreja. Mais do que uma renúncia, ele mostra-se um homem habituado a renúncias ao longo de sua vida e por isso, capaz de fazer sacrifícios pela Igreja.
Estamos próximos da escolha de um novo Papa. Quais são os grandes desafios que o novo Papa enfrenta? E quais devem ser as suas prioridades?
De entre os desafios a serem enfrentados, estão a descristianização da Europa e o enfraquecimento do vínculo das pessoas com as instituições religiosas, exigindo diálogo com as outras igrejas cristãs sobre o futuro do cristianismo no continente europeu, pois o problema não se restringe à Igreja Católica. Está o diálogo amplo no interior da Igreja e na sociedade globalizada, na perspectiva proposta pelo Concílio Vaticano II. Está o serviço à justiça e à paz num mundo marcado por tantos conflitos e problemas sociais como a miséria que perdura em muitas regiões. Está a tarefa de uma nova evangelização, com criatividade pastoral, mostrando a beleza e a actualidade da fé cristã, dando continuidade à temática do último Sínodo dos Bispos sobre a Nova evangelização para a transmissão da fé cristã.
A administração da Cúria Romana e o enfrentar de problemas internos da Igreja não podem implicar um fechamento intra-eclesial, mas devem ser acompanhados de atitude de abertura, diálogo e serviço num mundo globalizado.
Qual é sua opinião sobre o facto de se poder vir a escolher um Papa não-europeu?
Embora eu seja latino-americano, não considero o país ou continente de origem do Papa o factor mais importante na sua escolha. Penso ser mais importante, no perfil daquele que será eleito, a sua formação teológica, visão de Igreja e de mundo, a sua experiência pastoral, a capacidade de diálogo e de comunicação no mundo contemporâneo.
Independentemente de quem for eleito, penso que a importância do Papa na Igreja e no mundo vai muito além da pessoa que ocupa o posto de sucessor de Pedro.O espaço dedicado ao Papa pelos media mostra que, apesar das mudanças ocorridas no mundo, ele e a Igreja Católica continuam a ter grande importância, o que aumenta ainda mais a responsabilidade do novo Papa.
Deverá o novo Papa iniciar mudanças ou reformas na Igreja Católica? Quais?
"A Igreja se faz diálogo", afirmou o Papa Paulo VI na sua primeira carta encíclica, durante o Concílio Vaticano II. A atitude do diálogo é fundamental para estabelecer quais as mudanças necessárias neste momento da vida da Igreja e da humanidade. Na escuta do Espírito Santo e no diálogo o novo Papa irá discernindo os passos a serem dados. Porém, é importante lembrar que o critério para estabelecer mudanças continua a ser a fidelidade à palavra de Deus e não a busca de sucesso espectacular no mundo actual.