Qualquer cidadão poderá em 2013 saber tanto como o ministro das Finanças

Foto
Finanças ainda não conseguiram aplicar o plano de contabilidade a todo o Estado Pedro Cunha/ arquivo

Qualquer cidadão com acesso à Internet poderá, em 2013, ter tanta informação sobre as contas orçamentais como o terá o ministro das Finanças.

Basta o Governo querer partilhar esse poder. Quem o garante ao PÚBLICO são responsáveis de empresas que prestam serviços informáticos ao Estado.

Esse será um dos efeitos caso se cumpra a meta de aplicação do Plano Oficial de Contabilidade Pública (POCP) aos mais de 500 organismos do Estado, prometida para 2013. Um aspecto pouco referido pelos responsáveis governamentais, que frisam só as vantagens para a organização do Estado.

É verdade que a normalização contabilística permitirá não só um fecho mais fácil da Conta Geral do Estado, como será um instrumento de controlo da forma como se gasta, dos custos plurianuais das medidas e da contabilização do património do Estado.

Mas é igualmente verdade que a aplicação do POCP permitirá esse acompanhamento, não só pelo Governo, mas por quem o quiser fazer. Tanto ao nível de um organismo, como de todo o Estado. E em tempo real. Basta que haja vontade política de abrir totalmente os "livros das contas" à população que paga os impostos.

"Não há qualquer problema em criar essa "camada" aplicacional sobre a aplicação por onde corre o POCP" para permitir o acesso total do cidadão comum às contas públicas, garante um dos responsáveis de uma das empresas habitualmente contratadas pelo Estado para criar aplicações informáticas, mas que preferiu o anonimato.

"Não existe nenhuma limitação técnica para disponibilizar com segurança toda a informação ao cidadão, hoje através da Internet", assegura um responsável de outra firma semelhante. "Estes aspectos hoje estão bem facilitados em termos técnicos", continua. "Poderá ser desenvolvido um portal na Internet ou integrar em algum portal de algum organismo público existente para disponibilizar essa informação."

O próprio PSD - um dos partidos que mais tempo têm estado no Governo desde 1976 - já antevê essa possibilidade no projecto de lei n.º 513/XI/2.ª recentemente entregue. A ideia é "divulgar publicamente todas as informações através de um sítio na Internet, a criar pela Direcção-Geral do Orçamento". Mas a informação a disponibilizar parece escassa: informação histórica de três anos, missão dos serviços e elementos curriculares dos seus dirigentes.

Imagine-se as implicações de uma abertura completa das contas do Estado. Os deputados e a Unidade Técnica de Apoio Orçamental do Parlamento exerceriam efectiva e preventivamente a sua função. As organizações de cidadãos teriam um papel activo de controlo. O próprio Governo teria de ser bem mais responsável a exercer o seu poder. Seriam inúteis as divulgações aos jornais de informação parcial em vésperas de eventos importantes. Até a manipulação política da informação numérica teria de ser bem mais sofisticada.

"O problema está mais em termos funcionais, ou seja, a informação tem que existir", sublinha o último dos téc- nicos de empresas contactos pelo PÚBLICO. E esse tem sido o problema. Porque só acontecerá quando todo o Estado usar o POCP. Apesar das várias dezenas de milhões de euros, apenas 15 por cento das entidades públicas o utilizam neste momento.

Das 1550 às 16 mil licenças

O processo do POCP tem sido polémico. Desde a sua aprovação em 1997 até 2003, cada serviço adquiria a sua aplicação. Os elevados gastos foram a razão para, em 2003, se lançar um concurso público. O seu programa visava a disseminação pelo Estado de uma aplicação informática, propriedade do Instituto de Informática do Ministério das Finanças (IIMF). Mas, a meio do concurso, o júri e o próprio IIMF permitiram que a multinacional alemã SAP concorresse com uma aplicação que corria sobre uma outra comercializada internacionalmente. Ou seja, o IIMF iria precisar de comprar licenças do "motor internacional".

Mesmo contra propostas de licenças ilimitadas de outras firmas, a SAP venceu na base de que o Estado só necessitaria de 1550 licenças para os 502 organismos previstos. Iriam gastar-se 16 milhões de euros em 12 anos.

Mas a introdução da aplicação tardou e as metas foram derrapando. Por razões várias, a adjudicação à SAP foi anulada em 2006 pelo Supremo Tribunal Administrativo, o que inviabilizaria os contratos seguintes. Apesar disso, o IIMF assinou em 2007 um contrato por ajuste directo com a SAP de compra, não de 1550, mas de 4880 licenças num plano faseado até às 16 mil licenças. E por ajuste directo. Actualmente, o IIMF garante que, afinal, não necessitará das 16 mil licenças. Bastam-lhe as 4880 licenças já compradas e que em 2013 a aplicação estará disseminada. Resta saber em quanto ficará o seu custo total.

Sugerir correcção
Comentar