Centros educativos "falham" na integração de jovens delinquentes

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Maior parte dos jovens do centro educativo do Porto é de Lisboa Foto: Paulo Ricca

A Comissão de Fiscalização dos Centros Educativos não é branda no relatório que remeteu ao Parlamento. Encontrou rigidez no modelo educativo e ausência de trabalho de preparação no regresso do jovem delinquente à família e à comunidade. Nem sabe se a justiça de menores funciona - desconfia ou não. O ano terminou com 226 jovens internados por terem cometido algum crime.

"O quadro legal definido, os pressupostos que lhe estão subjacentes e a (pequena) dimensão da população abrangida impunham que o sistema fosse de excelência, e não é", avalia a comissão, que visitou os oito centros educativos, se reuniu com responsáveis, e conversou com internos.

A oferta educativa não convence a comissão coordenada pelo procurador Norberto Martins. Não se liga à fase do ano lectivo ou ao nível de conhecimento: "Um educando que entre, por exemplo, em Fevereiro, no módulo de Matemática, aprende a raiz quadrada sem que haja qualquer verificação dos seus conhecimentos prévios, como seja a capacidade básica de somar ou subtrair."

A oferta de formação também não agrada: "Os educandos são confrontados com um estranho desígnio. Só saem jardineiros, electricistas, pintores de paredes, serralheiros e marceneiros, na melhor das hipóteses, técnicos de informática (Caxias) ou de imagem e fotografia (Madeira) ou culinária (Porto e Madeira), em função das vagas existentes e da conclusão da formação."

A comissão chama ainda a atenção para a escassez de acompanhamento psicológico e psiquiátrico: "Os centros educativos não têm profissionais de saúde mental a eles afectos" - relegam tal tarefa para o Sistema Nacional de Saúde. A única psicóloga que havia passou do Centro Educativo da Bela Vista para o Navarro Paiva, ambos em Lisboa.

E a articulação com a família? "Não existe. Existe uma presunção generalizada que as famílias ou são ausentes ou disfuncionais ou incapazes, decorrendo daí uma atitude de alguma passividade e conformação impeditiva do necessário trabalho", lê-se. A localização dos centros não ajuda. Nem o facto de os miúdos serem colocados longe de casa. A maior parte dos que estavam no Porto eram de Loures e da Amadora, exemplifica Norberto Martins.

O regresso à comunidade fica por conta de equipas da reinserção e da Segurança Social da área de residência. A articulação com elas é "distante e irregular". Ninguém, nos centros educativos, é obrigado a seguir os miúdos. Os directores, "consoante a sua boa vontade", é que se vão interessando pelos destinos de alguns.

Norberto Martins insiste na necessidade de acompanhamento dos casos: "O que aconteceu aos miúdos que passaram pelos centros educativos nos últimos dez anos? Só conseguimos saber se o sistema tem alguma validade, se soubermos o que aconteceu. Muitos saem dos centros educativos e não demoram a estar nas prisões." Falaram com alguns jovens e viram como eles "não interiorizaram que o confinamento é um passo necessário à sua integração social". E confirmaram que não podem contar com um modelo de reintegração. Só na Madeira - que, tal como Vila do Conde, é de gestão partilhada com uma ONG espanhola - se pensou essa fase e, por isso, se criaram unidades residenciais com capacidade para 10 rapazes.

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