Robô submarino português visita fontes hidrotermais ao largo dos Açores

Que história pode contar um calhau apanhado no fundo do mar, ao largo dos Açores? Pode contar uma história que ajude Portugal a fundamentar a sua proposta de extensão da plataforma continental, e é esse o objectivo principal de uma missão em curso ao largo dos Açores com o robô submarino português, o "Luso".

Portugal já entregou, em Maio, a sua proposta de extensão da plataforma no âmbito da Lei do Mar das Nações Unidas - um projecto destinado a alargar a jurisdição do país para lá das 200 milhas náuticas da Zona Económica Exclusiva (ZEE), mas apenas sobre o solo marinho e tudo o que lá se encontrar, desde minérios até petróleo.

Para tal, é preciso provar-se cientificamente que a crosta dos continentes, que entra mar adentro, se prolonga para lá da ZEE, pelo que é necessário saber onde o fundo do mar deixa de ter características continentais e passa a ter características de crosta oceânica. Ou, caso esteja a falar-se do fundo do mar em redor de um arquipélago, quando é que, para lá das 200 milhas, deixa de haver uma continuidade dos materiais geológicos entre a parte emersa e a parte submersa.

Na proposta apresentada na ONU seguiram os elementos para provar as pretensões de alargamento da plataforma de uma área que ultrapassa os dois milhões de quilómetros quadrados, o que equivale a mais de 23 vezes a área do continente. Mas, enquanto a proposta não for apreciada, é possível continuar a recolher-se e a entregar dados científicos.

Por isso, a Estrutura de Missão para a Extensão da Plataforma Continental (EMEPC), um grupo científico incumbido deste projecto, está a levar a cabo uma campanha a bordo do navio Almirante Gago Coutinho. Iniciada a 7 de Setembro, terminará a 26 de Outubro, e o PÚBLICO acompanhará parte da missão a partir desta semana.

A estrela é o Luso, um veículo operado remotamente (ROV) comprado por Portugal no ano passado. Ligado por um cabo ao navio, em cada mergulho oLuso descerá até ao fundo, onde recolherá rochas com o seus braços manipuladores. "Vamos consolidar o bordo sul e o sudoeste da proposta de extensão da plataforma", explica o geólogo Nuno Lourenço, um dos coordenadores da EMEPC.

Alargar o "território" do país

Neste caso, os cientistas estão interessados em que o ROV apanhe basaltos. Ora, estes basaltos podem ser crosta oceânica normal ou, por outro lado, ter a influência do arquipélago dos Açores. À vista desarmada, podem parecer todos iguais, mas a química e os minerais dos basaltos dos fundos marinhos não são iguais aos dos Açores, explica Raquel Costa, geóloga da EMEPC.

Se os basaltos que o ROV apanhar forem idênticos aos dos Açores, o país poderá reclamar essa zona como "território" português. Portanto, a tarefa doLuso nesta missão é ajudar a descobrir até onde, para lá da ZEE, em torno dos Açores, existe a influência do magma das ilhas nas rochas da crosta oceânica. A ideia é, no final, fazer-se um mapa com a posição exacta das rochas recolhidas.

A EMEPC quer também aproveitar os mergulhos do Luso para outros estudos, como a biologia, química e avaliação de recursos minerais e genéticos, tanto para investigação interna como em colaboração com universidades, diz Nuno Lourenço. Aqui, na mira dos cientistas estão as fontes hidrotermais em profundidade, emanações de água quente da crosta terrestre, com metano, enxofre ou metais como cobre ou ouro.

Para lá disto, o "Luso" permitirá ter um novo vislumbre do fundo marinho português e das formas de vida que lá andam, através de uma câmara digital de alta definição.

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