Investigadores portugueses provam relação entre parasita e o cancro da bexiga

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É a primeira vez que a associação entre o parasita e este tipo de cancro fica demonstrada. Estudo pode também ser útil para outro tipo de infecções DR

Quando um ladrão como este parasita entra no nosso organismo, as moléculas que funcionam como polícias e evitam o desenvolvimento de um tumor diminuem e o cancro consegue um ambiente propício para se instalar.

A relação entre o parasita Schistosoma haematobium (S. haematobium) e um tipo específico de cancro da bexiga ficou provada nos artigos recém-publicados por investigadores portugueses em duas revistas, o The Journal of Experimental Pathology e o International Journal of Parasitology.

Sabendo como o parasita se comporta, é mais fácil arranjar formas de o bloquear e impedir que se instale. O estudo dos cientistas pode ainda ser útil como modelo para outro tipo de infecções, como o papiloma vírus ou a hepatite C.

A associação entre a infecção por um parasita e doenças graves não é nova. Veja-se o célebre exemplo da perigosa relação entre a bactéria helycobacter pylori e o aparecimento da gastrite - que, em alguns casos, pode levar ao cancro de estômago. Mónica Botelho, do Centro de Imunologia e Biologia Parasitária do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e autora principal dos artigos publicados sobre o S. haematobium, quis explorar e perceber melhor o possível potencial pró-tumoral deste parasita. É que esta associação entre a infecção e o cancro da bexiga estava apenas epidemiologicamente demonstrada.

"Não havia provas formais. Nunca ninguém tinha pegado em células normais, colocado lá o parasita e registado o resultado", diz. Recorrendo a extractos do "bicho", a investigadora começou por estudar o seu comportamento em culturas de células e concluiu que as células infectadas com o parasita multiplicam-se mais rapidamente e cedem menos ao fenómeno de morte programada (apoptose).

Novos alvos terapêuticos

"São características das células cancerígenas", explica a investigadora, que sublinha que, entre outras alterações, foi notada uma diminuição de uma molécula supressora tumoral (P27). Numa segunda etapa do estudo, as células infectadas foram injectadas em modelos animais, tendo sido escolhido um grupo de ratos sem sistema imunitário para que se observasse melhor o impacto. O resultado foi o aparecimento de tumores idênticos ao cancro da bexiga.

O parasita estudado não existe em Portugal e, por isso, este tipo de cancro de bexiga também não é registado na população portuguesa. Trata-se de um problema relacionado sobretudo com a população africana e sul-americana. No entanto, segundo Mónica Botelho, o trabalho pode ser útil não só para a procura de novos métodos de tratamento e prevenção desta doença oncológica mas também como modelo para outras investigações ligadas a mecanismos moleculares semelhantes e/ou processos inflamatórios.

"Neste caso específico, era interessante conseguir identificar novos alvos terapêuticos capazes de evitar a reacção inflamatória provocada pelos ovos do parasita que ficam na mucosa da bexiga. O importante para evitar este tipo de cancro é impedir que o parasita se multiplique", diz a investigadora, que contou com a colaboração de investigadores da mesma instituição (José Manuel Correria da Costa) e do Instituto de Patologia Molecular e Imunologia da Universidade do Porto (José Carlos Machado).



Que parasita?





TS. haematobium não existe em Portugal


O S. haematobium vive em águas paradas, em África, e aloja-se nos vasos sanguíneos. Uma vez instalado, liberta ovos que se vão alojar na mucosa da bexiga, criando o ambiente adequado para a proliferação das células cancerígenas. A infecção é facilmente tratada com um fármaco que mata o parasita. Porém, na maioria das vezes, já não conseguirá evitar a libertação de ovos, que acontece passado um mês da entrada do parasita no organismo.







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