Uma rede cheia de buracos em Istambul

Arranca hoje a primeira Cimeira Humanitária das Nações Unidas. O que leva Portugal na bagagem?

É uma grande cimeira hoje e amanhã na qual se esperam mais de seis mil participantes, representantes de 125 países, 50 líderes mundiais, empresas, filantropos, ONG, etc… A ideia desta Cimeira Humanitária foi de Ban Ki-moon, em Janeiro de 2012, com o objectivo de encontrar respostas para as várias crises humanitárias que acontecem em várias partes do mundo. Portugal leva para Istambul um primeiro-ministro e um candidato ao lugar de Ban Ki-moon. Além de Costa e de Guterres, levamos muita boa vontade e uma experiência encetada por Sampaio que pode servir exemplo.

As crianças e a educação vão estar no centro desta cimeira e um dos grandes objectivos é tentar encontrar financiamento para um fundo – o Education Cannot Wait – com pelo menos 3,85 mil milhões de dólares nos próximos cinco anos, numa altura em que existem no mundo mais de 30 milhões de crianças deslocadas por causa da guerra ou de catástrofes naturais. Destas, 20 milhões não têm acesso à educação. São da Síria, do Nepal após o terramoto, do Sudão do Sul ou da Nigéria, onde o Boko Haram já encerrou cinco mil escolas.

Esta frase de Bono dos U2, a propósito do encontro de Istambul, resume bem a importância desta cimeira: “Mais conflitos e mais desastres significam mais pessoas vulneráveis no mundo, mas a nossa rede para os apanhar está cheia de buracos. Apesar do nosso esforço (…), milhões de refugiados têm falta de abrigos e comida e apenas metade dos filhos dos refugiados frequentam a escola primária.”

O que pode fazer Portugal para que esta cimeira não corra o risco de ser apenas um amontoado de palavras ocas, como alertou a prémio Nobel Malala. Portugal leva a Istambul o ex-alto-comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e uma das pessoas hoje em dia mais capacitadas para prosseguir o trabalho de Ban Ki-moon nesta área. Ainda esta semana, em Lisboa, António Guterres recordava a frieza dos números: “Apenas dois terços da população refugiada no mundo têm acesso à educação básica, e em muitas circunstâncias em condições de muito má qualidade. Depois, só um terço tem acesso a educação secundária e apenas um por cento tem acesso ao ensino superior.”

Além de um candidato a secretário-geral da ONU com uma sensibilidade ímpar para o tema, Portugal leva para Istambul a experiência da Plataforma Global para os Estudantes Sírios, um organismo impulsionado por Jorge Sampaio (vencedor do prémio Nelson Mandela, atribuído pelas Nações Unidas) desde 2013 e que tem permitido integrar muitos estudantes sírios em instituições nacionais. Além destas experiências, e apesar de não estarmos geograficamente na rota dos que fogem das guerras, Portugal já se disponibilizou para receber cerca de 10 mil pessoas e com esta preocupação de as integrar no sistema de ensino. É um buraco a menos na rede. Veremos o que nos traz a cimeira.

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