A “nova normalidade” em aviação comercial

Ao afirmar-se em aviação, “business as usual”, tem de se acrescentar a recomendação, “em estado de alerta permanente.”

A expressão “A nova normalidade” refere-se ao ambiente gerado e às transformações institucionais e legislativas criadas após o 9/11, de 2001, bem como das orientações seguidas no combate ao terrorismo.

A aviação comercial, para além de apresentar fragilidades inerentes às suas características estruturais, transformou-se num instrumento letal nas mãos dos terroristas, ao desferir um rude golpe à superpotência, os EUA, demonstrativo da vulnerabilidade dos Estados e da própria ordem mundial.

Adriano Moreira, (2004, 8-9), destaca entre os conflitos assimétricos, o terrorismo, “adotado por atores que não são os Estados, mas que estão habilitados a desafiar os Estados.”

A responsabilidade destes atentados subjacentes ao “terrorismo islamita”, construído com base num sentimento de frustração e revolta, e “desferido por um poder errático, organizado em rede”. (Moreira, 2014, 25).

Atentados individuais ou coletivos não vieram a constituir uma novidade em aviação comercial, mas sim pela sua preparação dimensão, organização e financiamento.

As “manifestações de alegria” em “países muçulmanos, mas também nos médios ocidentais”, (…) “não contra os terroristas, mas contra os americanos, cuja arrogância provoca, senão justifica, os atentados.” (Torres, 2014, 25).

Os atos de terrorismo passaram a contar com o poder mediático da comunicação social, transmitidos por meios, formais e informais, ao transformarem-se numa caixa-de-ressonância destinada à formatação da opinião pública, na produção de um clima de medo e desalento, provocados por “uma verdadeira catástrofe ética” (Matteí, 2002, 2).

As reações foram expressas entre os EUA e a União Europeia, foram traduzidos de forma divergente, conforme analisaremos. A superpotência na convicção de que “a universalidade de valores era por si mais do que evidente e que a sua aplicação era salutar em qualquer circunstância. (Kissinger, 2014, 273), não hesitou em cria novas instituições de segurança. Um reforço foi dado há antigas peças de legislação, como o Foreign Inteligence Services Act, (FISA), e Electric Communication Privacy Act, (ECPA).

As “liberdades e garantias” dos cidadãos Norte-americanos, consagrados na Constituição, passaram a ser postos em causa, bem como os direitos dos cidadãos estrangeiros, incluindo ações de busca, prática não aplicada aos cidadãos dos Norte-americanos.

A legislação Norte-americana, baseada na chamada doutrina de “jurisdição extraterritorial”, também foi aplicada aos cidadãos e firmas comerciais ou industriais Europeias que mantinham negócios com os EUA.

Não será pois de estranhar as virulentas críticas dos Europeus face à “insensibilidade” demonstrada na defesa dos valores enraizados na cultura Ocidental, quando os EUA se propunham, “exercer uma ação decisiva em acontecimentos importantes enquanto negava qualquer motivação de interesse nacional”. (Kissinger, 2014, 273).

Assim, a nível “doméstico”, criaram a NSA, (Nacional Security Agency), e ao transporte, a TSA, (Transport Security Agency). Notaremos, que após os atos do 9/11, a TSA contratou mais de 18.000 funcionários, o que dificilmente poderia ocorrer na Europa, por razões políticas e sobretudo económicas.

Esta “a onda preventiva” foi extensiva à Europa, mas rejeitando os princípios contidos no “Patriot Act”, como as detenções sem julgamento prévio, por simples suspeita de terrorismo.

A jurisdição Norte-americana encontrava-se em flagrante contradição com os princípios aceites no Tratado de Vestefália, (1648), o denominado “Direito das Nações”, a raiz do direito anárquico internacional. A Administração Norte-americana não dispunha de qualquer poder de soberania para exercer a jurisdição extraterritorial em qualquer outro Estado, ao contrário do determinado no Patriot Act” e mais tarde, no FAA, “Foreign Surveillance Amendements Act”, (2008)

De acordo com o estudo realizado por Alex Arbak e Von Eijik, denominado, “Cloud Computing Educacional and Research Institution and the USA Patriot Act”, da Universidade de Amsterdão, as agências de segurança Norte-americanas a ação das agências de segurança atuavam mesmo “fora dos EUA”.

A teoria serviu para facilitar o acesso, ilegal, às medidas Europeias de proteção de dados, podendo deste modo intercetar, na “nuvem” de comunicações, a troca de mensagens entre figuras públicas, com responsabilidades políticas entre Estados.

O pivô da “CBS News”, Axel Ambas, com verdade diria, “os residentes europeus podem facilmente ter problemas, não obstante os esforços para limitar estas interferências”.

Esta interferência revoltaria o Parlamento Britânico, ao pôr em questão valores essenciais do Reino Unido, a Nação Europeia que sempre zelou pelos direitos e garantias dos seus cidadãos, contra qualquer força externa.

Um longo percurso de negociações transitou antes dum entendimento entre Norte-americanos e no eficiente balanço entre segurança e liberdade, base do pensamento estratégico no combate ao terrorismo.

A declaração PRN, (Passageiros, Registo e Nome), exigida pelas autoridades dos EUA aos passageiros da U.E. no momento da reserva dos voos para território Norte-americano, sobre informações de dados detalhados da viagem, bagagem, lugar no avião e forma de pagamento, horas antes da chegada dos voos ao espaço Norte-americano.

As conversações para aceitação do PNR, entre “U.S. Department of Homeland Security” e a U.E., foram assinadas com o fim de “prevenir, detetar, investigar e acusar dos crimes e ofensas do terrorismo e outros crimes de natureza transnacionais”, só em 2013, se bem que a questão do PNR já tinha sido proposta à União Europeia, em 2007, no Tratado de Lisboa.

Normas preventivas já tinham sido aplicadas, como os valores indemnizatórios para os passageiros, o reforço das portas do cockpit, (com trágicos resultados no caso da Germanwings), e cuidados especiais requeridos com a bagagem e durante as inspeções aos passageiros nos aeroportos, antes dos embarques.

Os acontecimentos de Paris vieram precipitar a discussão sobre a reavaliação dos métodos de combate ao terrorismo, sendo a França que liderou um certo repensar a validade do espírito do “Patriot Act”, como uma apropriada “moldura legal”.

A 4 Dezembro de 2015, o Conselho da UE tinha aprovado uma proposta diretiva sobre o sistema PNR, ao considerar a possibilidade de o aplicar a voos no Espaço Único Europeu, “tendo como propósito oficial auxiliar o combate ao terrorismo e a criminalidade grave”, e em 2016, pronunciou-se Parlamento Europeu, aprovando a diretiva.

A legislação Norte-americano serviu de base inspiradora à diretriz Europeia, na recolha dos 19 dados por passageiros e viagem, se bem que haja divergências, como o serem armazenados os dados recolhidos, por um período menor de cinco anos.

Apesar da votação no Parlamento ter sido por unanimidade, a contestação, sobretudo da Esquerda Europeia fez-se sentir, dada a inexistência de regras em relação aos objetivos na recolha de dados, não havendo limites aos níveis de controlo e vigilância, exercidos sobre qualquer cidadão.

O apelo de J.C. Junker à união, “face ao terror”, não é muitas vezes eficaz, por não haver uma troca expedita de informações entre serviços de “Inteligência”, quando seria bem mais útil a existência de um centro Europeu centralizador da recolha e processamento de dados.

Uma das grandes lacunas na Europa deve-se à compartimentação de serviços por países e na ausência de uma força especializada interventiva, apesar da Segurança Comum Europeia, (Pesc.), o que não tem evitado trágicos acontecimentos.

Ao afirmar-se em aviação, “business as usual”, tem de se acrescentar a recomendação, “em estado de alerta permanente.”

Professor e Investigador do DAT (Departamento de Aeronáutica e Transportes) da Universidade Lusófona

Sugerir correcção
Comentar