Companhia de dança pede apoio para poder nascer

Em fase embrionária, a companhia de dança que nasce no seio da Academia de Dança de Matosinhos, lançou uma campanha de crowdfunding para apresentar o protótipo de um espectáculo a programadores.

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Vâo apresentar-se no Teatro do Bairro (Lisboa) e no Teatro Constantino Nery (Matosinhos) Adriano Miranda
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Adriano Miranda

São 2750 euros. Este é o valor que a Companhia de Dança de Matosinhos (CDM) precisa para dar o próximo passo. Em fase de arranque lançou uma campanha de angariação de fundos colaborativa (crowdfunding), que serão aplicados na apresentação de dois espectáculos para programadores, em Matosinhos e em Lisboa. TRIPALIUM redux é uma versão reduzida da peça final, que será produzida a partir de Setembro de 2017, e é o ponto de partida para que a companhia, em fase embrionária, consiga chegar às entidades responsáveis pela programação das salas de espectáculo nacionais.  

Há uma missão por trás da criação da companhia. Contribuir para que a fuga de bailarinos portugueses para o estrangeiro diminua. Fuga essa, que as mentoras da companhia, Diana Amaral, directora pedagógica, e Sara Silva, directora artística, explicam pela falta de condições de trabalho dos bailarinos, em território nacional, nomeadamente ao nível das remunerações. Outro factor que sublinham é a quase inexistência de estruturas que permitam dar resposta aos bailarinos formados em Portugal. Em número, não há escassez de escolas. “Só no Porto há mais de oitenta privadas”, refere Sara Silva. O problema é que feita a formação “não há forma de dar resposta a grande parte dos bailarinos que querem seguir a via profissional”, diz Diana Amaral, que considera não existir uma estrutura montada a nível governamental que reme em sentido contrário.

Por uma experiência fora do país passaram as duas, que sem se cruzarem, estiveram em Londres à procura de outras oportunidades. Aos 3 anos, Sara Silva tem o primeiro contacto com o ballet. Foi assistir a uma aula da irmã e instintivamente “não parava de dançar”, diz. Desde essa altura foi apostando na formação. Antes do secundário já sabia que queria ser bailarina. Na altura de entrar para a universidade, ainda passou por uma experiência na área do design, que diz ter sido “o mês mais infeliz” da sua vida. Seguiu a sua vontade e foi para Londres estudar na Central School of Ballet. Por lá foi ficando, onde trabalhou com algumas companhias inglesas, embora o objectivo fosse sempre voltar a Portugal.

Diana Amaral, despertou para a dança com a mesma idade. Aos 3 anos foi ver o Lago dos Cisnes com um tio. O tio adormeceu e Diana, quando chegou a casa, não parou de “imitar os movimentos que tinha visto no espectáculo”, conta. Cresceu com a dança e foi apostando na formação. A via académica foi seguida pelos caminhos da antropologia, um “dos muitos interesses” que tem. Continuou a dançar e trabalhou na sua área de formação académica. Mesmo no desempenho dessas funções nunca deixou de chamar a dança para alguns dos museus onde trabalhou. Sempre que havia oportunidade incluía a dança nas actividades dentro dos espaços museológicos por onde passou. Sempre à procura de novas experiências, não esqueceu os 14 anos de formação em ballet clássico e foi para Londres tirar um mestrado em Ciências da Dança, curso que diz não existir em Portugal.

Ainda em Inglaterra, começa a dar os primeiros passos para a Academia de Dança de Matosinhos, da qual também é directora e de onde nasce a companhia. A pensar numa tese de doutoramento começa a esboçar a estrutura de um “museu da dança”. Um museu que “não queria que fosse estático”, diz. Começa então a pensar na escola de dança como serviço educativo do unidade museológica em projecto. Há cerca de 7 anos, quando volta a Matosinhos compra a Academia de Dança de Matosinhos. “Uns anos antes não sonhava sequer ter uma escola”, conta. É na academia que conhece Sara, que enviou uma proposta de trabalho, aceite por Diana. “Chamou-me à atenção a abordagem divertida do mail”, recorda.    

Sara, que voltou a Portugal um ano mais tarde do que Diana, começou por apresentar alguns workshops na academia, até se tornar formadora. Com a cumplicidade que foi desenvolvendo com Diana surgiu também a ideia de criar a Companhia de Dança de Matosinhos, numa lógica natural de resposta pós formação que a escola garante.

As duas, com a consciência de toda a complexidade associada a esse processo, foram dando “um passo de cada vez” para garantir que “não se saltam etapas”, como explica Diana. A campanha de crowdfunding é apenas mais um passo a outros que já foram dados, nomeadamente o de garantir as salas para as apresentações aos programadores,  no Teatro do Bairro, em Lisboa, e no Teatro Municipal Constantino Nery, em Matosinhos, cedido pela autarquia local, que também contribuiu com uma ajuda financeira que permitirá à companhia pagar a equipa de seis bailarinos, maioritariamente estrangeiros, seleccionados para o projecto de apresentação, coreografado por Gustavo Oliveira. “Connosco, ninguém trabalha de graça”, garante Diana, que recorda ser essa uma das bandeiras da companhia. 

Para a versão final, esperam, as mentoras da CDM, contar com 15 bailarinos. Se possível com mais portugueses, que foram, ainda, a fatia mais reduzida dos 90 candidatos que se inscreveram para prestar provas. O que não deixa de parecer “um contra-senso”, tendo em conta a alegada escassez de oferta no mercado de trabalho. As mentoras acreditam que isso é explicado por, assim como acontece noutras áreas, alguns profissionais acreditarem que fora de portas a qualidade é superior, mas também por ser ainda um projecto que está a dar os primeiros passos. Por isso mesmo, sentiram a necessidade de apresentar primeiro uma primeira versão do espectáculo a programadores, no sentido de validar o projecto e de vender “não apenas uma ideia, mas sim algo mais concreto”.

Para que essas apresentações se tornem possíveis estão “a apostar tudo” na campanha de crowdfunding”, que garantirá o pagamento das viagens dos bailarinos. Na altura da conversa que o PÚBLICO teve com as responsáveis pela  CDM, apenas 17% do valor pedido tinha sido atingido. A faltar pouco mais de 3 semanas para terminar a campanha, acreditam que a grosso das contribuições será feita na recta final. Ainda que atingir este objectivo seja uma prioridade e fundamental para as directoras, caso isso não aconteça, dizem não ditar o futuro da companhia. “Trabalharemos noutra solução”, garantem.

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