Bacalhoeiros recuam no tempo com a ajuda da memória e de uma chora

Mais de uma centena de antigos pescadores, oriundos de vários pontos do país, juntaram-se neste sábado, em Ílhavo. Um dia marcado por reencontros e partilha de memórias.

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O encontro decorreu no Jardim Oudinot, na Gafanha da Nazaré Adriano Miranda
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Festa dos Bacalhoeiros foi organizada pelo Museu Marítimo de Ílhavo Adriano Miranda
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Festa permitiu o reencontro de cerca de cerca de 160 antigos bacalhoeiros, oriundos de Vila Praia de Âncora, Caxinas, Nazaré, Ílhavo, Mira e Caminha Adriano Miranda
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Festa permitiu o reencontro de cerca de cerca de 160 antigos bacalhoeiros, oriundos de Vila Praia de Âncora, Caxinas, Nazaré, Ílhavo, Mira e Caminha Adriano Miranda
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O prato de resistência do almoço foi chora de bacalhau, como a que os pescadores comiam a bordo Adriano Miranda
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Festa permitiu o reencontro de cerca de cerca de 160 antigos bacalhoeiros, oriundos de Vila Praia de Âncora, Caxinas, Nazaré, Ílhavo, Mira e Caminha Adriano Miranda
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O bacalhoeiro Santo André foi convertido em navio-museu Adriano Miranda
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O bacalhoeiro Santo André foi convertido em navio-museu Adriano Miranda
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O bacalhoeiro Santo André foi convertido em navio-museu Adriano Miranda

Podia ter sido um piquenique igual a tantos outros, com direito a petiscos e bebidas refrescantes, mas a verdade é que os convivas conseguiram transformá-lo numa verdadeira viagem ao passado, em especial às décadas de 50, 60 e 70 do século passado. Durante horas, no Jardim Oudinot, na Gafanha da Nazaré, ouviram-se relatos de histórias reais sobre as venturas e desventuras da vida de mar, mais concretamente da pesca do bacalhau. Aquela que foi a primeira Festa dos Bacalhoeiros promovida pelo Museu Marítimo de Ílhavo (MMI) conseguiu juntar, neste sábado, cerca de 160 homens, oriundos de Vila Praia de Âncora, Caxinas, Nazaré, Ílhavo, Mira e Caminha, todos eles com esse denominador comum: parte (ou quase toda) da sua vida profissional foi passada nos mares frios da Terra Nova e da Gronelândia. Uma festa que ficou marcada por reencontros de antigos companheiros de pesca e com direito a voltar a subir a bordo de um antigo bacalhoeiro (navio-museu Santo André) e a degustar a sopa que, nesses tempos, “forrava” o estômago e aquecia o corpo – a chora de bacalhau.

“Aqui sabe melhor. Estamos em terra firme e a sopa não anda a dançar no prato”, assegura Manuel Simões, de Vila Praia de Âncora, antigo pescador a quem o mar não deixou saudades. “Não pude ver a minha filha crescer”, lamenta, evocando, logo de seguida, “o susto” que apanhou “no dia 16 de Maio de 1959”. “Ficámos sozinhos no dóri, debaixo de um temporal, e só com muito esforço conseguimos chegar ao navio [o Vila do Conde] sãos e salvos”, lembra. Uma má memória que vai guardando num baú onde, também, conserva lembranças mais positivas. “Depois, na pesca do arrasto, já começámos a ir mais tempo a terra e era bom ir a St. John´s  ilha da Terra Nova]”, conta.

Quem também se sentiu inspirado para desfiaras memórias foi Joaquim Piló, que além antigo dirigente sindical [Sindicato Livre dos Pescadores e Profissões Afins] foi também pescador. Veio da Nazaré, juntamente com outros 17 antigos pescadores da pesca do bacalhau, para participar na festa que compreendeu a realização de visitas guiadas ao MMI e ao navio-museu e a apresentação das novas funcionalidades do Portal Homens e Navios do Bacalhau - uma plataforma digital de recolha e de partilha da memória colectiva da grande pesca.

Assim que os seus olhos se depararam com o arrastão agora transformado em pólo museológico, Joaquim Piló lembrou-se dessa viagem à Terra Nova, “em 1972 ou 1973, em que o navio Álvaro Martins Homem foi contra um icebergue. Ficou toda a gente aflita, a pensar que o navio ia ao fundo mas, felizmente, o icebergue não conseguiu fazer mossa no barco”, recorda. Por entre recordações e reencontro de velhos companheiros de pesca, deixou o testemunho: “Está a ser um dia muito agradável; espero que promovam este encontro mais vezes”.

Da parte da organização, a aposta passa, precisamente, por realizar esta Festa dos Bacalhoeiros uma vez por ano. “É um convívio e partilha memorial que queremos que faça parte da programação anual do museu”, perspectiva Álvaro Garrido, consultor do MMI, ao mesmo tempo que se mostrava agradado por ter tido a oportunidade de realizar “visita co-guiadas”. “Foi muito enriquecedor termos estas visitas orientadas por mim e por  outras pessoas do museu e que iam sendo alimentadas com histórias reais, contadas pelos protagonistas da pesca do bacalhau”, avalia.

Nesta primeira edição do evento, o MMI chamou, também, para o almoço a Confraria Gastronómica do Bacalhau, que assumiu a responsabilidade de confeccionar a “chora de bacalhau” - a restante ementa do almoço foi composta pelos petiscos trazidos por cada um e partilhados entre todos. “Vamos servir cerca de 100 litros de chora, muito parecida com a que eles comiam a bordo”, destacou Anabela Pequeno, a cozinheira de serviço, especialista neste prato típico feito com “cabeças de bacalhau, arroz, cebola, alho, louro, tomate, água, vinho branco e muito amor e carinho”. 

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