Zona Franca da Madeira tenta recuperar tempo perdido

Regime IV da praça madeirense entrou em vigor, mas a concessionária lamenta as empresas que abandonaram a Madeira devido ao impasse negocial entre Lisboa e Bruxelas.

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Em 2000, havia quase cinco mil empresas licenciadas na zona franca da Madeira, agora são pouco mais de 2000 Rui Gaudêncio

O novo regime especial da Zona Franca da Madeira (ZFM) foi aprovado este mês pela Assembleia da República, com efeitos retroactivos a 1 de Janeiro deste ano, mas a Sociedade de Desenvolvimento da Madeira (SDM), concessionária daquela praça dá como perdidas as cerca de mil empresas que abandonaram a região durante o impasse negocial entre Lisboa e Bruxelas.

A entrada em vigor do Regime IV do Centro Internacional de Negócios da Madeira (CINM) – a actual designação da ZFM – permite que o licenciamento e a instalação de novas empresas passe novamente a ser possível, o que não acontecia desde 1 de Janeiro deste ano, altura em que expirou o anterior regime.

O modelo agora em vigor é mais vantajoso para as empresas. Traz uma taxa reduzida de IRC de 5% para as sociedades licenciadas no CINM, com garantia de aplicação de benefícios fiscais até 31 de Dezembro de 2027 e isenção de tributação dos dividendos dos accionistas. Mas não será suficiente para convencer as empresas que saíram a voltar.

O presidente da SDM, Francisco Costa, lamentou recentemente, que embora o CINM esteja a conseguir contrariar a tendência de saída de empresas, as que abandonaram dificilmente voltarão. “Saíram da Madeira muito magoadas”, justificou o CEO da empresa, cujo capital social é detido em 75% pelo Grupo Pestana e 25% pela região.

Essas empresas, explicou Francisco Costa, não esperavam que as negociações entre o Governo da República e a União Europeia fossem interrompidas em 2010 pelo executivo de José Sócrates, provocando uma fuga quase generalizada dos investidores. Também Passos Coelho não escapa às críticas, devido ao Orçamento de Estado para 2012 ter cortado os benefícios fiscais que estavam consagrados para os dividendos.

Em 2000, a zona franca madeirense tinha quase cinco mil empresas licenciadas. Quinze anos depois esse número ficou reduziu para menos de metade (2.193 empresas), que apresentaram um capital social agregado superior aos cinco mil milhões de euros.

As receitas fiscais perdidas, estima Francisco Costa, dariam para cobrir o acréscimo da carga fiscal a que os madeirenses estão sujeitos desde a assinatura do Programa de Ajustamento Económico e Financeiro (PAEF) assinado em Janeiro de 2012, já que as receitas fiscais arrecadadas pela Madeira rondam os 125 milhões de euros ao ano: cerca de 15% do total da região.

Mesmo com todos os entraves colocados por Bruxelas, para os quais contribuíram as pressões de praças concorrentes como a do Luxemburgo e a da Holanda, e o impasse nas negociações, o negócio da SDM é lucrativo, com exercícios positivos anuais na ordem dos três/quatro milhões de euros. Tanto que, o dono do Grupo Pestana, cujo core business é a hotelaria, terá mesmo dito que a ZFM é o hotel mais rentável que tem em carteira.

O relançamento do CINM é considerado estratégico por todos os quadrantes políticos na Madeira. Inicialmente, os partidos à esquerda do PS olhavam com desconfiança para praça financeira, mas nas últimas eleições regionais praticamente todos defenderem a existência da zona franca, não só pelo peso que representa no PIB madeirense, mas também pelo emprego ali gerado.

Estudos independentes falam em cerca de sete mil postos de trabalho, sendo mais de metade ocupados por madeirenses, com salários muito acima da média da região, e apontam receitas indirectas em sectores como o Turismo, o Imobiliário e até o Lazer.

Um relatório do Banco de Portugal relativo a 2013, diz que a região autónoma, apesar de apenas representar 2,5% da população portuguesa conseguiu, por via do CINM, captar 12% do investimento directo estrangeiro do país.

Mas estes foram os "anos dourados" que o Regime IV vai tentar agora recuperar. As novas regras, que já tinham sido acordadas com a Comissão Europeia em 2013, estabelecem os limites dos plafonds em função do número de postos de trabalho criados pelas empresas, aplicando um limite máximo de benefício fiscal de acordo com o volume de negócios (15,1%), valor acrescentado bruto (20,1%) ou custos anuais de mão-de-obra incorridos (30,1%).

A Comissão Europeia deixou também de considerar estes apoios como auxílios de Estado, libertando assim margem para os cofres nacionais.

Neste momento, 72% dos investimentos estrangeiros no CINM são oriundos de países comunitários, sendo que o grosso das empresas (1.590) são serviços internacionais.

Mas se a importância estratégica da zona franca madeirense é quase consensual na Madeira, já o modelo de concessão tem levantado muitas questões. O prazo de 30 anos termina em 2017, e caberá ao actual executivo madeirense, presidido por Miguel Albuquerque, decidir o que fazer. Em cima da mesa estão três cenários: a prorrogação do prazo até 2032, conforme prerrogativa prevista no contracto; a abertura de um novo concurso internacional; ou passar a ser a Madeira a gerir o negócio.

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