Mobiliário: Entre a necessidade de «design» e a dificuldade de vender

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Ninguém quer falar em crise. Todos reconhecem a importância do «design», mas há quem diga que esse esforço já vem atrasado Fernando Veludo/PÚBLICO

A crise na habitação, a falta de confiança dos consumidores e a concorrência de espanhóis e italianos estão a mexer com o mobiliário português. Mas ninguém fala em crise. Os empresários querem apostar no “design”.

São tempos diferentes os que se vivem hoje no sector de mobiliário português. Os negócios já não são o que eram. Como também não deixa de ser verdade que o “design” está a ganhar terreno aos ditos móveis clássicos. Ao que se junta, ainda, a entrada em força do mobiliário italiano e espanhol. Daí que se coloque a questão de saber se os empresários portugueses terão capacidade de assegurar o futuro do mobiliário nacional. Da ronda feita junto do sector, o PÚBLICO pôde constatar um clima de alguma confi ança e esperança quanto ao futuro, salvaguardando sempre que a indústria terá de continuar a investir em conceitos como o do “design”, bem como na inovação do produto e modernização das unidades fabris. Mais importante do que tudo consideraram ser a aposta efectiva na rede de comercialização e em políticas de “marketing” agressivas e modernas.

A administradora da Cerne, Olívia Rocha, fez questão de salientar que, “regra geral, se produz bom mobiliário no nosso país e, por vezes, é só por provincianismo que vamos a reboque do ‘design’ estrangeiro e não damos valor às nossas potencialidades nesta matéria”. Posição corroborada por alguns empresários de Paços de Ferreira (ver texto na página e a difi ao lado), que denunciaram o facto de algumas empresas nacionais estarem a vender, nos seus expositores, mobiliário italiano, denegrindo assim a imagem dos móveis portugueses.

O secretário-geral da Associação Portuguesa das Indústrias de Mobiliário e Afi ns (APIMA), Sérgio Gomes, destacou, por sua vez, o facto de os empresários “estarem a despertar para a internacionalização” como forma de “compensar a falta de mercado interno”, que, acrescenta, está de tal maneira em baixo que “até as importações estão a cair”. Mesmo assim, do mobiliário comercializado em Portugal cerca de 20 por cento é importado. Para Olívia Rocha, para “além do abrandamento económico sentido em Portugal nos últimos tempos, é um facto que a presença do mobiliário estrangeiro no nosso país não tem ajudado o sector”. Isto devido, acrescenta, “por um lado, à sua falta genérica de competitividade e, por outro, à muita concorrência ‘quase’ desleal que por vezes é feita: não raras vezes, o produto estrangeiro é vendido com uma relação preço/qualidade muito elevada, sem a percepção por parte do consumidor desse facto devido à falta de informação ou mesmo à sua desinformação”.

Falta investir em “marketing”

Sérgio Gomes, por sua vez, frisa que “as empresas portuguesas evoluíram muito ao nível do ‘design’ e das tendências de mobiliário”. O problema, segundo o secretário-geral da APIMA, está na ausência de “investimento em ‘marketing’ e comercialização”, posição esta subscrita pela AIMMP, associação que representa também o sector. Quem não concorda com esta posição é o administrador da Fago. Para Ivo de Brito, as “empresas apostaram tardiamente” no “design”, como forma de “reagir às alterações que houve no mercado com o crescimento das importações deste tipo de produtos [modernos] e com a perda de quota nacional”. Por outro lado, o “‘design’ é inspirado no que vêem e a Fago é vítima disso”. Daí que veja o futuro do sector com alguma prudência.


No entanto, ninguém fala em crise. Todos preferem usar a palavra estagnação, consequência, essencialmente, de dois factores, para além dos já mencionados no texto. Primeiro, por causa da forte crise que abala o segmento da construção residencial — segundo a Associação de Empresas de Construção e Obras Públicas (AECOPS), em 2001 “o número de contratos de crédito à habitação celebrados pelas instituições bancárias caiu 10,9 por cento face a 2000”, prevendo a associação um ano de 2002 ainda mais complicado que o de 2000, ao que se junta a extinção do regime de crédito bonifi cado. Segundo, devido à quebra da confiança dos consumidores, que, em Maio passado, caiu para o nível mais baixo desde Setembro de 1996. O futuro do sector está em aberto, entregue nas mãos dos empresários de mobiliário.

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