O futuro da música: plataformas digitais optimistas, músicos nem por isso

Na Web Summit, as plataformas digitais olham para o futuro da indústria da música com optimismo. Músicos e editores são mais comedidos.

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A indústria da música esteve em destaque no último dia da Web Summit com vários painéis e conferências. Miguel manso

A indústria da música esteve em destaque nesta quinta-feira, no último dia da Web Summit, com vários painéis e conferências. Não surpreende porque foi uma das primeiras indústrias a sofrer o embate provocado pela tecnologia, pela Internet e pelas renovadas formas de criação, distribuição e consumo, encontrando-se nos últimos anos em grande reformulação ou transição.

Nesta fase, e a acreditar no que se ouviu na Web Summit, o optimismo é moderado e não partilhado por todos. Pelo menos é o que se retira das afirmações dos responsáveis por plataformas digitais e dos músicos e editores, no âmbito de algumas reflexões sobre os desafios da indústria.

O co-fundador da plataforma Soundcloud, Eric Wahlforss, e o responsável pela Deezer, Hans-Holger Albrecht, tiveram um discurso entusiasta, apesar de reconhecerem que se passou por uma fase “dolorosa” nos últimos anos. “Mas agora a indústria está outra vez a crescer e temos um futuro brilhante pela frente”, assegurou Eric Wahlforss, acreditando no streaming como o motor dos próximos anos, enaltecendo a tecnologia que permite escutar e comprar música em diferentes plataformas e a possibilidade de se compreender o que é que o consumidor prefere.

Desde a criação do Soundcloud, que a empresa faz parcerias com a maioria das editoras, tendo lançado um serviço de subscrição. Hoje é um portal onde os artistas disponibilizam música gratuitamente, contabilizando mensalmente mais de 175 milhões de ouvintes. “O Soundcloud tem a ver com uma cultura musical e com a forma como esta está a ser moldada pelos artistas e utilizadores”, haveria de sublinhar durante a tarde, numa conferência a sós, acreditando que as receitas nos próximos anos serão maiores e distribuídas de forma justa para todos.

Músicos como o rapper americano Ne-Yo ou o inglês Tinie Tempah foram mais comedidos, falando de uma conjuntura “financeiramente instável” para os criadores. O primeiro alertou para a forma como consumimos música se ter alterado, mas a legislação continuar ancorada nos princípios da revolução industrial. “As leis dedicadas à arte musical estão completamente caducas. Não estão preparadas para lidar com o advento tecnológico.” Na sua visão, os artistas e compositores não estão a ser devidamente renumerados pelas suas obras. E deu um exemplo: na plataforma de streaming Pandora um milhão de audições de uma música representa um retorno de apenas 90 dólares para o compositor.

O inglês Tinieh Tempah reconheceu que as plataformas digitais são importantes essencialmente na fase primeira das carreiras, declarando que inicialmente as editoras não se interessavam pelo seu trabalho. “Foi aí que comecei a usar plataformas digitais, criei o meu próprio grupo de fãs e envolvi-os na minha música, partilhando fotos e canções gratuitamente.”

Mas passada a fase de afirmação, alinhou com Ne-Yo, considerando que as plataformas de streaming ainda não conseguem pagar um preço justo pelas suas criações, algo que poderá mudar, na sua visão, quando os artistas começarem a fazer negócios directos com as plataformas e todos puderem usar a informação de forma mais transparente e colaborativa.

No seu caso, foi apenas depois de ter uma base consumidora interessada no seu trabalho que as editoras olharam para ele. Um pouco mais tarde, o fundador da histórica editora independente Sub Pop, o americano Bruce Pavitt, haveria de dizer que essa será cada vez mais a forma de operar. Ele que nos anos 1990 foi um dos responsáveis pela popularização do grunge, através de nomes como os Nirvana ou Soundgarden, assumiu que a forma tradicional de actuar das editoras será cada vez mais posta em causa.

E deu o exemplo do cantor americano Frank Ocean que se tornou conhecido com um primeiro álbum na editora Def Jam, acabando este ano pela edição própria com grande sucesso. “Financeiramente é melhor para os artistas tomarem conta do seu próprio negócio”, afirmou. “Numa fase inicial muitos precisam de uma editora para criar a sua identidade e continuará a haver quem os ajude como nós – descobrindo e lançando artistas – mas os tempos mudaram.” Antes os artistas em início de carreira começavam numa pequena editora tendo como ambição chegar a uma grande multinacional. “Agora”, disse, “a sua ambição é que as pequenas editoras constituam a transição directa para a sua independência.”

 

 

 

 

 

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