A juventude vota e quer saber

Este é o momento de o PS reivindicar, de novo, a instituição da propina zero, um teto máximo de propina nos mestrados, benefícios fiscais para os jovens e apoio na compra da primeira casa.

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As eleições de 10 de março consagram duas vitórias: das menores taxas de abstenção registadas no passado recente, um ganho evidente para a democracia, e um maior número de jovens a votar, uma vitória de uma geração que vota e que cada vez mais se interessa.

Estima-se que a faixa etária entre os 18 e os 34 anos tenha representado um quarto do total de votantes (cerca de 1,6 milhões), números próximos do total de jovens votantes entre as mesmas idades, o que, claramente, a longo prazo, é positivo.

A 14 de março, quatro dias após as eleições, ainda sem o apuramento total dos votos, uma vez que faltava a contabilização dos círculos da Europa e de Fora da Europa, foi conhecida uma estimativa do voto jovem entre os 18 e os 34 anos. Calcula-se que 28% do eleitorado deste segmento etário tenha votado na Aliança Democrática (PSD/CDS/PPM), 13% no Partido Socialista, 25% no Chega, 11% na IL, 6% no BE, 2% na CDU, 6% no Livre 6% e 3% no PAN.

Se do relatório elaborado pelo ICS/ISCTE Exit Polls passarmos a número concretos (sem contabilizar os votos da Europa e de Fora da Europa), estima-se que, entre os jovens dos 18 aos 34 anos, cerca de 387 mil votaram na AD, 176 mil no PS, 355 mil no Chega, 153 mil na IL, 90 mil no BE, 88 mil no Livre, 32 mil na CDU e 46 mil no PAN. O que significa que cerca de 22% do eleitorado da AD foi jovem, do PS somente 10%, do Chega 32%, da IL 49%, do BE 33%, da CDU 16%, do Livre 49% e do PAN 39%.

Com base nestes números é legítimo concluir que, na verdade, foram os jovens que decidiram esta eleição. A Aliança Democrática nunca teria vencido este ato eleitoral sem o voto jovem, visto que estes representaram uma grande fatia dos endossos à AD.

Perante isto, permitam-me que lance a seguinte questão: será que foi a aliança entre PSD/CDS/PPM que cativou os jovens dos 18-34 anos a votar?

A minha opinião é que não, não foi.

Após oito anos de governação socialista (anos que representam cerca de metade da vida desta faixa etária), quem governou foi sempre o PS. Em termos práticos isto traduz-se da seguinte forma: um jovem que votou pela primeira vez em 2015 (com 18 anos) e que tem hoje 26 anos, ou um jovem que tenha começado o secundário em 2015 e acabado o ensino superior enquanto o PS estava no poder, não conheceu outro partido no governo. Isto significa que uma grande parte dos jovens entre os 18 e os 34 sempre viveram com a governação socialista.

Ou seja, a maioria dos jovens que votou pela primeira vez em 2024 já vinha “cansada” dos “velhos hábitos” e sem um discurso ou uma mensagem que motivasse a aposta no PS. Daí o voto na AD ter-se expressado. Se invertêssemos o cenário e tivesse sido a AD a governar nos últimos oito anos, o voto no PS teria sido muito mais expressivo.

E isto leva a um problema, o PSD. O PSD tem hoje o mesmo número de deputados que teve em 2022, ano em que o PS venceu com maioria absoluta. Se, após oito anos em que os órgãos de comunicação social, de uma maneira geral, foram críticos da governação socialista, o PSD foi sempre a suposta “oposição” e “alternativa” desejada, e, ainda assim, chega a 2024 coligado e não consegue melhor do que um resultado igual ao de 2022.

Isto significa que o futuro do PSD está condenado a decréscimos históricos, isto é, não só estes jovens que fizeram a diferença saberão que, afinal, o PS não é o “diabo” que quiseram vender-lhes nos últimos oito anos, como o interesse por partidos mais “modernos” se vai intensificar. Esta realidade que há-de verificar-se leva-me a concluir que ou o PSD nos próximos anos se reorganiza, consegue uma boa legislatura e cativa o eleitorado jovem, ou o seu futuro poderá ser trágico.

Por parte do PS é apenas um chavão afirmar que não tem jovens, porque a realidade é que, mesmo com oito anos de governação, estima-se que quase 180 mil jovens continuam a acreditar no programa do partido e, assumindo-se agora como líder da oposição, a tendência é para que cresça em número a adesão de jovens às suas ideias.

Ora, a tendência pode ser crescente, mas o PS tem de mudar o “chip”. Os próximos anos são de extrema importância. É essencial a aproximação do partido aos mais jovens, uma vez que, na oposição, é mais fácil ser escutado do que quando se é governo. Este é o momento de o PS reivindicar, novamente, a instituição da propina zero, a fixação de um teto máximo de propina nos mestrados, benefícios fiscais para os jovens e apoio na compra da primeira casa. O PS foi sempre o obreiro das conquistas sociais, e tem agora, finalmente, a oportunidade de mostrar isso aos jovens.

Quanto ao Chega, sendo a atual terceira força política portuguesa, estima-se que tenha sido o segundo partido escolhido pelos jovens. Enquanto democrata, acredito que muitos jovens são recuperáveis, não só porque o partido de André Ventura foi visto como uma solução para problemas que nem são sentidos por muitos jovens, como pela falta de aprofundamento “sério” de temáticas imprescindíveis à democracia. Acredito que, com o desenrolar desta legislatura e com um maior investimento por parte dos outros partidos na comunicação, o fenómeno se altere.

Temos uma legislatura incerta, menos jovens na Assembleia da República, mas mais jovens a participar na “coisa pública”. Todos os partidos foram avisados. Os jovens estão cá e querem participar.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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