Quinta da Pacheca cinco estrelas. O luxo das coisas simples e o complexo mundo do vinho do Porto

O The Wine House Hotel é um cinco estrelas há cerca de um ano, mas a Pacheca queria aprimorar o serviço antes de se apresentar como tal. Fá-lo agora, com programa exclusivo, em cinco momentos de luxo.

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A nova experiência da Quinta da Pacheca inclui almoço no meio das vinhas dr
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Na cabeça de muitos, o Wine House Hotel já era uma unidade cinco estrelas, mas a Quinta da Pacheca só recebeu essa classificação, por parte do Turismo de Portugal, no final de 2022, tendo passado o último ano e meio a aprimorar o serviço, para agora se apresentar como tal. Com um programa à altura do luxo que os seus hóspedes procuram. E com novidades como o room service 24 horas por dia, o porteiro à entrada da propriedade ou o bagageiro.

O grupo Terras & Terroir, dono da quinta situada em Lamego, no Cima Corgo, chamou Pacheca Flamour Experience a uma proposta que nós descreveríamos antes como o luxo das coisas simples — e pelo menos de uma bem complexa, chamada vinho do Porto, mas já lá vamos. O programa custa 600 euros por pessoa e está pensado para ser feito num ou em dois dias. Não inclui alojamento, cujos valores (época baixa) começam nos 289 euros para um quarto standard e nos 442 euros para um Wine Barrel — literalmente uma pipa gigante, deitada de olhos postos nas vinhas velhas.​.

Um almoço regional ao ar livre, com cozinha de fogo e comida de pote, feita nas brasas de uma enorme raiz no meio das vinhas, é uma novidade absoluta. E levanta um bocadinho o véu sobre o projecto Pacheca Nature, que já está a mudar a face da propriedade na sua zona ribeirinha e que agregará várias ofertas já existentes e mais algumas.

"Vamos levar essas experiências assim mais do campo todas para beira-rio. Já plantámos e vamos plantar mais árvores de fruto ali e vamos pôr também mesas de piquenique. É [uma proposta] da horta para o prato. E é o tipo de experiência que faz com que as pessoas nos levem no coração. Queremos que os nossos clientes saiam daqui apaixonados", explica Maria do Céu Gonçalves, a administradora do grupo que nasceu do investimento na Pacheca já lá vão mais de dez anos e que hoje está em várias regiões vitivinícolas, sempre com a componente do enoturismo.

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Maria do Céu é natural de Ribeira de Pena, em Trás-os-Montes, e rumou a França com os pais quando tinha apenas dois anos. Como a maioria dos emigrantes, voltava à terra nas férias. Todos os anos. "Quando eu vinha a casa da minha avó, comer uma sopa do pote para mim era um luxo." Também o é para quem vive na cidade e nunca vê um pote de ferro a fumegar, mesmo que tenha raízes no meio rural.

Uma proposta para quem procura algo mais nas quintas que produzem vinho, para quem quer ligar-se à terra e aos produtos que ela dá. Nós deliciámo-nos com a bola de bacalhau, feita ali perto, o pão torrado na brasa com azeite da Pacheca, os enchidos, o caldo de cebola com moira, os milhos cremosos com carne em vinho e alhos e o leite-creme queimado com ferro saído do braseiro. No copo, dois reserva da casa: um branco de 2022 e um tinto de vinhas velhas, um ano mais novo. Tentávamos decifrar o fumo que emergia de diferentes pontos na paisagem. "Não estão todos a fazer comida de pote, estão a queimar a lenha da poda." Ah, OK.

O passeio de jipe pelas vinhas (ao todo, 51 hectares) está incluído no novo programa e foi de jipe que nos juntámos ao chef Carlos Pires, estava o bragançano, de uma aldeia chamada Samil, a mexer os milhos. Antes passámos pela tal zona ribeirinha, onde em 2023 já foram plantadas 200 árvores, e por uma antiga ruína que está a ser reabilitada para dar receber os workshops de cozinha e que estará equipada com forno a lenha. Nas proximidades, nascerá em breve uma horta biológica, cujos produtos também servirão as outras 'cozinhas' da quinta.

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A Pacheca tem dois restaurantes, o The Wine House e desde o Verão de 2022 também o Alambique, onde a comida é para partilhar, e conta abrir um terceiro até ao final de 2024, assim seja possível terminar ainda este ano a obra que arrancará "em Fevereiro/ Março", partilhou com o PÚBLICO Álvaro Lopes, um dos sócios da Terras & Terroir, enquanto experimentávamos os pratos de assinatura do chef Carlos Pires. Almoço na vinha, jantar na Garrafeira Particular (também incluído na Flamour Experience).

Na sala privada que nasceu na antiga garagem dos tractores da quinta, os pratos do cozinheiro que passou pela Casa da Calçada antes de rumar ao Douro são harmonizados com os melhores vinhos da casa, DOC Douro a que a nova sala de barricas (de 2020, assim como a ala mais moderna do hotel, o spa e a piscina), mesmo ao lado da sala privada onde jantámos, veio dar outro elã, e vinhos do Porto. Como o Vale Abraão tinto ou o Pacheca Porto Tawny 50 Anos. Nos cuscos e na perdiz transmontanos estão as raízes de Carlos Pires, mas o chef também trabalha sabores do mar, como o rodovalho ou os bivalves.

A nova experiência da Pacheca está disponível para um mínimo de duas pessoas e um máximo de oito e, nos momentos de refeição, pode acontecer que a quinta tenha de juntar diferentes grupos, mas mediante uma taxa de exclusividade (250 euros por pessoa) será sempre possível um casal estar sozinho.

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Dela também faz parte o Chá das Cinco — com uma infusão da Pacheca, que mistura alecrim, alfazema, lúcia-lima, salva, erva-príncipe e carqueja que crescem na quinta e pastelaria variedade —, o wine blending com a equipa de enologia​, um ateliê de winearella com Óscar Rodrigues, o artista residente da Pacheca e autor da já célebre escultura do rosto de Miguel Torga em São Martinho da Anta, e um retemperador e completíssimo tratamento no Vineyard Spa.

A arte de lotar vinho do Porto

"Vamos tentar fazer um blend de vinho do Porto." Vamos lá. Brincar aos enólogos por umas horas é uma das actividades mais fixes que já fizemos em enoturismo. Mas fazer de blender é mergulhar no maravilhoso universo do vinho do Porto e reconhecer que este generoso andou muito para aqui chegar e que nasce da mestria de muitas pessoas, entre elas aqueles que em cada casa de vinho do Porto decidem que vinhos entram em determinado lote.

Foi por aí que começámos, com a enóloga Maria Serpa Pimentel (a Quinta da Pacheca era dos Serpa Pimentel e, quando foi comprada pelos actuais proprietários, Maria manteve-se no projecto, que já a tinha na enologia desde 2003) a explicar que há "duas famílias de vinho de Porto, os que envelhecem dentro da garrafa, os Ruby, e a família dos Tawny, que envelhecem em cascos". Em ambas, a fermentação é interrompida com aguardente vínica com 77% de álcool; as leveduras só transformam em álcool uma parte do açúcar e o resultado final é um vinho doce e com um teor de álcool elevado. "Entre os 18,5%, no caso dos Portos brancos, e os 21,5%, nos tintos."

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E a enóloga, que deu aulas durante vários anos na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e gosta "de explicar tudo, tudo, tudo", prossegue, enunciando as categorias que existem dentro dos Ruby e dos Tawny, até que chegamos à melhor parte. Temos uma pipeta à frente e vários tawnies colheita (de um só ano; no caso, 2015, 2010, 2005, 1985 e 1950) e o desafio é prová-los e com eles fazer um 30 anos. E, atenção, os tawnies com indicação de idade não são médias aritméticas; têm antes determinadas características que se convencionou corresponderem a uma dada categoria.

Que quantidades juntar de uns e de outros? Primeira lição: aos vinhos mais jovens vamos buscar a fruta e como há maior disponibilidade podemos usá-los como fillers; com os vinhos mais antigos, usando pouca quantidade ("custam uma fortuna"), conseguimos logo envelhecer o lote final. Fizemos dois ensaios. O primeiro ficou "um pouco liso", faltava-lhe acidez. "É um bom 20 anos." "O segundo cheira muito bem e tem tudo o que é preciso."

Estava feito. Mas não tinha rótulo. Tratámos disso no Atelier d'OR, onde Óscar nos esperava para desenharmos e pintarmos com vinho o rótulo para o nosso 30 anos. O papel de aguarela tem algodão adicionado e gramagem de 300g, podemos molhá-lo à vontade que não encarquilha. Aqui a proposta é desenharmos, e depois pintarmos, aquilo que sentimos e as memórias que criámos durante o wine blending. "A nossa paleta de cores [cinco vinhos diferentes] é mais restrita, mas também é isso que torna especial o resultado final", encoraja o artista, que também faz outros trabalhos, desde pequenas esculturas com as varas que resultam da poda a obras em que aproveita "copos de plástico dos eventos".

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Quase tão relaxante como o ritual Five States of Tranquility, que se desenrola em cinco momentos. Um relaxante escalda-pés que junta rosas, alecrim, lavanda, limão, água salgada quente e vinho tinto. Uma esfoliação corporal rejuvenescedora com grainha de uva e os produtos da Vinoble Cosmetics, uma das duas marcas com que trabalha o spa da Pacheca — a outra é a britânica Elemis. Um minitratamento facial que revitaliza e ilumina a pele do rosto — curvamo-nos perante a magia do Cooling eye gel da Vinoble. Um banho de hidromassagem com flores e ervas aromáticas Pacheca Nature e o Red grape bath da marca austríaca. E, por último, uma massagem que deita mãos a técnicas de diferentes cantos do mundo. Revigorante. Toda a experiência.

A Fugas foi convidada para experimentar a Pacheca Flamour Experience

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