Limitar poluição de pellets de plástico? UE discute proposta esta quinta-feira

Eurodeputado português é relator da proposta de directiva para regular aquela que é a terceira maior fonte de libertação de microplásticos no ambiente, com milhares de toneladas derramadas por ano.

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Um homem mostra alguns pellets que apanhou na areia da praia As Lapas, na Corunha CABALAR/EPA
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A União Europeia está a preparar uma directiva específica para limitar a poluição por pellets de plástico – como a das toneladas de minúsculas bolinhas que começaram a dar à costa na Galiza e, entretanto, alastraram às Astúrias e Cantábria, no Norte de Espanha. “Quando se perdem no ambiente, terrestre ou marítimo, tornam-se praticamente impossíveis de recuperar”, explica o eurodeputado socialista João Albuquerque, relator da proposta de regulação que vai ser discutida nesta quinta-feira pela primeira vez no Comité de Ambiente do Parlamento Europeu.

“Os pellets são o terceiro maior causador de poluição por microplásticos neste momento”, adiantou ao Azul João Albuquerque. Em primeiro lugar estão os pneus e as tintas. “Mas estes estão a ser resolvidos através de outras directivas que estão em discussão, os pneus na regulamentação Euro 7 [para reduzir as emissões de veículos, não só dos motores de combustão, mas de todos os componentes automóveis] e as tintas nas emissões industriais”, explicou.

A Comissão Europeia apresentou a sua proposta de directiva no final do ano passado, que o Parlamento Europeu está agora a apreciar, para fazer sugestões de emenda, seguindo o normal processo legislativo da UE. João Albuquerque é o relator desta proposta legislativa.

O objectivo da directiva é reduzir o derrame de pellets na UE entre 54% a 74%, seguindo o plano de acção europeu para reduzir em 30%, até 2030, o derrame de microplásticos na natureza.

Estima-se que entre 52.140 toneladas e 184.290 toneladas de pellets tenham sido derramadas no ambiente no espaço da União Europeia só em 2019 – isto equivale a perder entre 2100 e 7300 camiões cheios de pellets todos os anos, contabiliza ainda o mesmo documento.

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Os pequenos fragmentos de plástico que deram à costa na Galiza EPA/SALVADOR SAS

Esta poluição de plásticos pode ser ingerida por muitos microorganismos marinhos e ter efeitos daninhos não apenas por serem tóxicos, mas simplesmente porque não os conseguem digerir, e deixam de conseguir comer, por exemplo. Actividades económicas como a pesca ou o turismo podem ser prejudicadas. E estes plásticos não só entram na cadeia alimentar dos seres humanos, com efeitos na saúde, em diferentes órgãos, como prejudicam toda a vida na Terra porque para os produzir são emitidas grandes quantidades de gases com efeito de estufa, que produzem alterações climáticas e provocam redução da biodiversidade.

Isto quer dizer que há uma quantidade gigantesca de pellets a serem produzidos, transportados e manuseados em todo o mundo anualmente. Em 2021, só na União Europeia, estima-se que foram produzidos 57 milhões de toneladas deste material de moldar com polímeros, que pode assumir várias formas, incluindo pós e flocos, que são usados para a produção industrial de artigos em plástico como garrafas de água.

“As actuais práticas de manuseamento levam a perdas em todas as fases da cadeia de abastecimento, sobretudo na produção, processamento, transporte e outra logística, e operações de gestão de resíduos”, diz o texto da proposta de directiva da Comissão Europeia.

Difíceis de recolher

“As imagens que estamos a ver agora na Galiza mostram muito bem a dificuldade que é recolher aqueles pellets”, diz João Albuquerque, referindo-se às pessoas que andam nas praias do Norte de Espanha com peneiras, vassouras, tubos de aspiração, baldes, vários métodos para tentar destrinçar o trigo do joio, ou mais propriamente a areia das bolinhas de plástico branco.

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Operações de limpeza dos pellets que deram à costa em Espanha LAVANDEIRA JR

“Mesmo quando é possível recolher os pellets, é um esforço absolutamente hercúleo, e a própria recolha pode danificar os ecossistemas. As máquinas usadas podem afectar a areia, o ambiente onde se encontram”, sublinha o eurodeputado socialista.

A proposta de emendas ao texto apresentada por João Albuquerque pretende tornar mais apertadas as malhas das regras do texto da Comissão. “Não temos uma crítica muito profunda em relação àquilo que é a proposta da Comissão, mas achamos que ela podia ser um pouco mais ambiciosa”, disse.

Por exemplo, criando regras para que os contentores em que são transportados os pellets sejam absolutamente isolados, explicou. “Em muitos casos, os contentores são apenas cobertos por uma lona, o que pode, obviamente, originar perdas muito significativas para o meio ambiente”, adiantou João Albuquerque. “Os próprios recipientes em que os pellets são transportados devem ser verificados anteriormente, para garantir que não há rasgões ou qualquer tipo de fuga”, disse.

Por outro lado, pretende-se que haja maior vigilância e inspecção das autoridades para garantir que as empresas garantem as normas de segurança. “Isto passa também por garantir que a penalização, em caso de derrames, seja maior. A nossa proposta é que as multas sejam no valor de 4% do volume de negócios anual destas empresas na União Europeia, e não no Estado-membro, como a Comissão propõe. Isto aumenta significativamente a penalização, portanto coloca uma maior pressão sobre as empresas para cumprirem com as obrigações que estão previstas”, exemplifica João Albuquerque.

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Um homem limpa parte dos milhões de pellets que invadiram as praias da Galiza no início de Janeiro EPA/BRAIS LORENZO

A proposta da Comissão Europeia determina que estas regras se apliquem só a empresas que manuseiem cerca de 1000 toneladas de pellets de plástico por ano, mas a proposta do relator do Parlamento Europeu é que esse limite seja reduzido para 250 toneladas. “Pequenas empresas já movimentam um volume muito significativo de pellets. Portanto, propomos que a isenção seja apenas para as microempresas”, explicou o eurodeputado.

Mas será possível concluir as negociações para esta nova directiva até ao fim do mandato das instituições europeias? As próximas eleições para o Parlamento Europeu serão no início de Junho. “Vamos ter uma primeira discussão sobre o tema no Comité de Ambiente do Parlamento Europeu nesta quinta-feira. Estamos a fazer um esforço muito significativo, embora não esteja certo de que será possível, para acelerar e conseguirmos concluir os processos ainda durante esta legislatura”, reconhece João Albuquerque.

Não se sabe ainda se haverá consenso entre os partidos políticos sobre estas ideias. “Estamos [o grupo Socialistas e Democratas] muito sintonizados com as propostas d’Os Verdes e do grupo Liberal. Ainda não tive um feedback mais significativo da parte do Grupo Popular Europeu, mas ainda a decorrer o período em que estes grupos podem apresentar emendas”, adianta.

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