Os equívocos de Pedro Nuno e de Montenegro

Não interessa a uma economia que um governo, por mais bem-intencionado que seja, crie poderosos comités para antecipar os setores que mais incentivos merecem.

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A teoria de que Portugal cresce menos do que podia por culpa da dimensão do Estado está estafada, mas continua válida. Basta ouvir os dois candidatos a primeiro-ministro: Pedro Nuno Santos quer o Estado a desenhar os setores da economia nos quais deve aplicar os seus recursos; Luís Montenegro hesita entre apoiar start-ups e lançar políticas públicas que favoreçam o investimento nas transições digital e climática.

Estão os dois equivocados. Está tudo inventado: o que não está é aplicado.

A primeira dessas velhas invenções é a que nos assegura que tanto as teorias minimalistas de atuação pública (por vezes tão sedutoras) como as teses centralizadoras do planeamento económico (por vezes tão lógicas) não resultam. Demonstra-o a história e Daren Acemoglu, no livro Porque Falham as Nações: o que justifica que alguns países sejam ricos, e outros não, é o facto de os primeiros favorecerem “instituições inclusivas”, enquanto os segundos desenvolvem “instituições extrativas” geradas por elites que usam o seu poder para extrair a riqueza da sociedade.

Não pensem apenas em elites corruptas – isso seria mais simples de combater. Pensem antes em elites que, no Governo, se esforçam por desenhar minuciosamente o caminho do crescimento económico.

A segunda invenção demonstrada é a teoria dos incentivos como indutora de comportamentos. Isso é conhecido de todos os governos na fiscalidade, mas continua a parecer um bicho de sete cabeças na economia – mesmo tendo Garry Becker vencido o Nobel da Economia em 1992 explicando que tudo se transforma no capital humano: as mudanças que se incentivam ao nível micro (indivíduo) são a ferramenta mais poderosa para induzir comportamentos ao nível macro (sociedade).

A terceira invenção constatada é a miríade de ferramentas públicas já testadas com sucesso, justificando-se olhá-las na perspetiva das duas primeiras invenções.

A primeira é a que atua no capital humano: educação. Não basta defender a escola pública, como fazem os candidatos. É preciso desenhar mecanismos que permitam aplicar a teoria de Becker: quanto mais estudam e mais aprendem ao longo da vida, mais produtivos se tornam. Isto pode ser feito com subsídios ou programas públicos destinados a ensinar a última tendência aos trabalhadores. A forma mais eficaz, porém, é aquela que Stuart White e Julian le Grand levaram ao Reino Unido da Terceira Via: permitir que parte dos descontos obrigatórios para a segurança social sejam usados livremente em investimento pessoal. E não é justo atacar esta ideia pela incapacidade que alguns demonstram de fazer bem estas escolhas. A escola pública produz as mesmas limitações.

O que se ganha com este livre-arbítrio é justamente o que se prova na primeira invenção – nem liberalismo em excesso, nem centralismo em demasia. O Governo fornece os meios, cada um usa-os na forma que considera melhores resultados gerar, sem desvio positivo que aponte que estudar Direito possa ser mais eficaz do que abrir um negócio de canalização.

A segunda é a que se manifesta junto das empresas. Não interessa a uma economia que um governo, por mais bem-intencionado que seja, crie poderosos comités (mesmo recheado de personalidades do “mundo empresarial” e da “academia”, como sugere o PS) para antecipar os setores que mais incentivos merecem receber. Esta tarefa é simplesmente impossível: um grupo nunca será capaz de antecipar realmente o que a maioria fará perante as circunstâncias do seu tempo.

Assim, fica mais simples perceber o poder indutivo dos seguintes dois vetores: o primeiro consiste em capitalizar as empresas através de uma aposta consistente no capital privado, incentivado via fiscalidade pública: taxar apenas os lucros distribuídos, não os reinvestidos. O segundo aponta para o poder transformador da capitalização via capital privado. Portugal é o país da Europa com o menor peso de “private equity” no PIB, mesmo sabendo que as empresas investidas por estes fundos geram dez vezes mais vendas e nove vezes mais emprego que a média.

Nenhum dos candidatos a primeiro-ministro parece ter-se lembrado de políticas como estas, simples e testadas. Se o fizessem, a economia responderia quase de imediato.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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