Fisco já avaliou IMI das barragens, mas imposto de 2019 continua em risco

Concessionárias e autarquias podem pedir segundas avaliações, o que fará derrapar a cobrança para 2024. Se assim for, a AT pode exigir o imposto de 2020, mas já não o de 2019.

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Nuno Santos Félix durante a audição parlamentar desta terça-feira, sobre o IMI em Portugal Daniel Rocha
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O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Santos Félix, garantiu esta terça-feira no Parlamento que a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) já concluiu a avaliação da “generalidade” das barragens, para poder avançar com a cobrança do IMI sobre os edifícios e construções das centrais exploradas para a produção de energia eléctrica. Mas o imposto de 2019 — o mais antigo que, à luz da lei, o fisco ainda pode exigir até ao final deste ano — está em risco, porque as concessionárias e os próprios municípios podem recorrer do primeiro apuramento do valor patrimonial e, tendo em conta os prazos de reavaliação, não é certo que a AT consiga dar esse passo até 31 de Dezembro.

“A última informação que recebi da AT sobre esta matéria, relativa ao final do mês passado, vai no sentido de ter sido concluída a avaliação da generalidade das barragens. Entretanto, estarão os sujeitos passivos e os municípios a exercer os seus direitos de defesa, designadamente pedindo segundas avaliações ou recorrendo a outros meios para contestar a avaliação, o que é normal num Estado de Direito democrático”, afirmou o secretário de Estado de Fernando Medina.

Depois da primeira avaliação, realizada por peritos externos contratados pela AT, as empresas são notificadas do apuramento do valor patrimonial tributário e quer as empresas, quer as autarquias onde as barragens estão instaladas, quer o próprio fisco, podem pedir uma segunda avaliação, tendo 30 dias para reclamar. Exercer este direito implica repetir todo o processo de avaliação, cabendo a segunda apreciação a um grupo de dois peritos regionais (indicados pelo director de Finanças) e pelo contribuinte (e o seu representante).

O IMI de 2019 está em dúvida porque o direito à liquidação do imposto (isto é, o período que a AT tem para notificar um contribuinte para exigir a entrega do tributo) dura quatro anos, o que significa que até ao final de 2023 ainda é possível ao fisco exigir o IMI de 2019. Só que, para garantir o valor desse, seria necessário que a AT concluísse todos os passos necessários — incluindo as notificações aos contribuintes — até 31 de Dezembro de 2023. Nalguns casos pode conseguir fazê-lo, noutros não.

Se as concessionárias e as autarquias solicitarem segundas avaliações, o processo poderá apenas ser concluído em 2024 e, nessa altura, se a AT ainda poderá ter tempo para liquidar o imposto de 2020, já não poderá exigir o de 2019.

A partir do momento em que, em Fevereiro deste ano, deu ordem ao fisco para fazer a avaliação patrimonial das barragens de acordo com o entendimento que resulta de um parecer do Conselho Consultivo da PGR de 2006 que esclarece de que forma devem ser qualificados juridicamente os bens incorporados nas concessionárias das barragens, o secretário de Estado determinou à AT que tivesse em conta “o risco de caducidade ou de prescrição” do IMI, o que significava dar os passos necessários nos meses seguintes para que, até 31 de Dezembro deste ano, as empresas pudessem ser notificadas do imposto relativo a 2019. Em relação ao IMI de 2020, 2021 e anos mais recentes, a AT ainda tem tempo para emitir as liquidações, o risco que se coloca é em relação a 2019, tendo em conta o momento em que as avaliações ocorreram e o prazo legal para as contestações.

No Parlamento, Nuno Santos Félix foi confrontado pelo deputado do PCP, Duarte Alves, sobre se o Governo pode garantir que a AT irá conseguir liquidar o IMI de 2020 mesmo que já não seja possível avançar com a cobrança de 2019, mas Nuno Santos Félix não comentou essa possibilidade.

O atraso do fisco no processo de avaliação levou o próprio secretário de Estado a emitir um despacho, em Agosto, crítico para a direcção do fisco, a reforçar à liderança da AT que a cobrança deveria avançar mesmo que a AT pudesse antever que as concessionárias se preparam para abrir uma frente de contestação nos tribunais.

Subir IMI fora de horizonte

Boa parte da audição do secretário de Estado no Parlamento centrou-se noutra questão do IMI: o facto de a Comissão Nacional para a Avaliação dos Prédios Urbanos (CNAPU), responsável por coordenar as directrizes para a apreciação dos imóveis, estar a preparar uma revisão do zonamento do imposto, o que poderá ter implicações no valor patrimonial tributário (VPT) de apartamentos e outros prédios.

À semelhança do que disse o ministro das Finanças em Outubro, Nuno Santos Félix insistiu que não está no horizonte um agravamento da tributação, lembrando que nem o Orçamento do Estado para 2024 prevê qualquer subida nem o Programa de Estabilidade traça um aumento da receita decorrente de uma actualização do IMI.

A comissão — que funciona junto da AT e que é formada por membros de vários ministérios e entidades externas, como a Associação Nacional de Municípios, as associações de proprietários e de inquilinos — é responsável por propor anualmente o valor médio de construção por metro quadrado e de sugerir, de três em três anos, os coeficientes de localização mínimos e máximos a aplicar em cada município, o zonamento e os respectivos coeficientes de localização, por exemplo.

Nuno Santos Félix disse que, durante a pandemia de covid-19, a comissão chegou a apresentar uma proposta, mas que o Governo acabou por não a seguir, por considerar não ser o momento certo para isso, dada a situação de crise pandémica. E, neste momento, frisou, ainda não há qualquer nova proposta.

Embora o Governo esteja em gestão e a palavra seja devolvida aos portugueses, não estava previsto qualquer agravamento, voltou a dizer Santos Félix.

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