Governo antecipa criação de 30% de áreas marinhas protegidas para 2026

O primeiro-ministro reafirmou a aposta de Portugal na economia azul, nomeadamente na produção de energia eólica offshore.

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Governo espera atingir meta de criação de áreas marinhas protegidas quatro anos antes do inicialmente previsto Rui Gaudencio

O Governo antecipou para 2026 a meta de criação de 30% de áreas marinhas protegidas, inicialmente prevista para 2030, anunciou esta quarta-feira o primeiro-ministro, que afirmou que Portugal pretende manter uma "posição de charneira na economia azul".

Estes anúncios foram feitos por António Costa no Fórum de Investimento na Economia Azul Sustentável, que decorre esta quarta no Centro de Congressos do Estoril, em Lisboa, e visa "debater o crescimento económico impulsionado pela economia do oceano".

No seu discurso, o chefe do executivo salientou que a economia do mar "emprega hoje directamente, só na União Europeia (UE), cerca de 4,5 milhões de pessoas, gerando um volume de negócios de cerca de 667 milhões de euros e um valor acrescentado de 184 mil milhões de euros".

"Mas o seu potencial é muito superior, estimando-se que à escala global o peso da economia azul possa duplicar no horizonte de 2030 e que, no seu conjunto, os investimentos sustentáveis na economia produzem benefícios pelo menos cinco vezes superiores aos custos num horizonte de 30 anos", referiu.

Destacando que Portugal tem "jurisdição sobre quase 50% do espaço marítimo europeu e quase 50% dos respectivos solos e subsolos marinhos", o primeiro-ministro garantiu que o Governo vai continuar a trabalhar para que a temática dos oceanos continue "a ser central na agenda dos líderes europeus".

"Por outro lado, mantemos a nossa posição de charneira na economia azul. Vamos antecipar a meta para a criação de 30% das áreas marinhas protegidas já para o final de 2026", anunciou o primeiro-ministro. Até agora, o Governo tinha previsto atingir essa meta até 2030.

Na área das energias renováveis, António Costa referiu que Portugal tem a ambição de "atingir uma capacidade instalada de produção de energia eólica offshore de dez gigawatts até 2030".

"Este foi o compromisso que assumi precisamente aquando da 2.ª Conferência dos Oceanos das Nações Unidas [que decorreu em Lisboa em 2022], mas posso agora anunciar que abriremos, ainda neste mês de Outubro, a manifestação de interesse para a participação em projectos eólicos offshore", indicou.

Segundo o primeiro-ministro, o Governo vai "proceder à identificação de promotores interessados no procedimento concorrencial e dar início à fase de diálogo para apresentação de projectos". "E vamos começar a atribuir, de forma faseada, as licenças para a produção dos dez gigawatts offshore."

A par destes anúncios, António Costa salientou que Portugal está "fortemente empenhado na descarbonização do transporte marítimo" e "continua a investir activamente em infra-estruturas para a economia azul", referindo que, no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), está previsto um "plano de financiamento de 87 milhões de euros para a criação do Hub Azul" Portugal, "uma rede de centros de investigação e desenvolvimento e de universidades focadas na ciência, tecnologia e inovação marinhas".

Esse hub, segundo o primeiro-ministro, irá "duplicar o número de startups a operar em Portugal na área da economia azul, bem como o número de projectos apoiados por fundos públicos".

Costa destacou que Portugal quer ser "um pólo europeu de excelência na área da biotecnologia azul, atraindo investimento e know-how (em português, saber como) de todo o mundo para desenvolver ciência de ponta e gerar novo valor de mercado", estando a ser criado, nos terrenos da antiga refinaria de Matosinhos, o Centro Internacional de Biotecnologia Azul.

O chefe do executivo referiu que, "para poucos países o mar é tão fundacional como para Portugal" e sublinhou que, a nível nacional, "a bioeconomia e a biotecnologia azul já desempenham um papel fundamental".

"Mas o potencial de crescimento é enorme e, neste sentido, Portugal tem integrado a sua política marítima, ordenado o seu espaço marítimo e promovido energias renováveis oceânicas de forma a criar todas as condições para estar na linha da frente ao nível da economia azul", frisou.

Associação ambientalista pede mais meios para proteger áreas marinhas

A Associação Natureza Portugal (ANP/WWF) vê "com agrado" o anúncio de que Portugal vai antecipar para 2026 o objectivo de ter 30% de áreas marinhas protegidas, mas pede meios efectivos de protecção, "para que não existam apenas no papel".

"Apesar de a ANP/WWF ver com agrado um anúncio que é indicador do compromisso do Governo com a protecção do meio marinho — feito na sequência da sua condição de país anfitrião da Conferência das Nações Unidas sobre Oceano em 2022 —, a Organização Não Governamental de Ambiente tem também várias reservas e preocupações", lê-se num comunicado divulgado esta quarta-feira.

"Para declarar áreas marinhas protegidas (AMP) para abranger 30% em apenas três anos (até final de 2026) é preciso ter em conta as linhas estratégicas e as áreas prioritárias para classificação já identificadas em 2019", em resolução do Conselho de Ministros, e "para que estas AMP sejam verdadeiramente eficazes, ou seja, para que cumpram a sua função de protecção da biodiversidade e não existam apenas no papel", é desde logo necessário que "sejam designadas nos locais certos para proteger as espécies e habitats de forma adequada".

Para isso, "é preciso envolver a ampla comunidade científica marinha que há décadas estuda e conhece as dinâmicas da biodiversidade marinha e dos impactos das actividades económicas e de lazer nas águas nacionais", defende a Associação Natureza Portugal, que pede planos de gestão, objectivos definidos e medidas de conservação claros, assim como monitorização e fiscalização eficazes e meios de financiamento que garantam o "adequado funcionamento" destas áreas protegidas.

A organização defende que é também necessário desde o início avaliar entidades afectadas de forma positiva e negativa pelas AMP, como os sectores da pesca e do turismo, entre outros, e pede uma gestão "com mecanismos transparentes, previsíveis e democráticos de participação das partes interessadas".

"É preciso também assegurar que as AMP não sejam criadas de forma desgarrada, ou seja, precisam de formar uma verdadeira rede, ecologicamente coerente, protegendo habitats e espécies de forma representativa: a proposta de revisão da Lei de Bases de Ordenamento do Espaço Marítimo, que esteve em discussão esta quarta na Assembleia da República, prevê a criação de AMP, mas não prevê que estas funcionem como uma verdadeira rede ecológica, nem como será gerida", refere o comunicado da AMP/WWF.

"Também é importante esclarecer como se articulará o Governo central com as Regiões Autónomas na criação e gestão de uma rede nacional de AMP, sendo que os Açores já estão a avançar com a sua própria rede até final deste ano", acrescenta a associação, que recorda que "a maioria das AMP em Portugal é apenas moderadamente protegida, e em várias delas não existe qualquer protecção, monitorização, fiscalização ou gestão adequadas, na maior parte dos casos por falta de investimento e recursos humanos".

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