Exposição inédita de Coco Chanel explora ligações da criadora à Resistência Francesa

A mostra, que abre ao público no Museu Vitória e Alberto, em Londres, a 16 de Setembro, revela uma faceta desconhecida da criadora de moda que se sabe ter colaborado com os nazis.

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A vida da designer é esmiuçada na exposição Gabrielle Chanel. Fashion Manifesto Hulton Archive/Getty Images
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Gabrielle Chanel foi uma das personagens mais fascinantes da moda do século XX. E ao mesmo tempo uma das mais paradoxais. Se, por um lado, “libertou as mulheres [da tirania do espartilho] e as empoderou”, como chegou a declarar Yves Saint Laurent, por outro, a história conta que foi espia nazi e que alinhou, sem reservas, ao lado dos homens do Führer durante a ocupação de França.

Certo é que, durante esse período, Chanel manteve privilégios bem conhecidos (como a suíte no Hotel Ritz, que à data era reservada aos mais altos funcionários de Berlim) e uma relação com o barão Hans Günther von Dincklage, reputado agente alemão condecorado por Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda, e pelo próprio Hitler.

Mas, agora, surge o outro lado de uma intrincada história: Gabrielle Chanel apoiava os alemães ao mesmo tempo que operava para a Resistência Francesa.

Documentos inéditos, que podem ser consultados na exposição Gabrielle Chanel. Fashion Manifesto, mostram o nome de “Gabrielle aka Coco Chanel” numa lista de 400 mil pessoas cujo papel na Resistência é apoiado por registos oficiais.

“Temos verificações do Governo francês, incluindo um documento de 1957, que confirma a sua participação activa na Resistência”, revelou a curadora Oriole Cullen, citada pelo Guardian.

Além disso, destaca a Harper’s Bazaar, a sua propriedade na Riviera, La Pausa, tinha extensas caves que foram utilizadas pela Resistência, nomeadamente para esconder refugiados judeus, como o arquitecto Robert Streitz, que projectou La Pausa, em 1929. A revista revela ainda que o nome da designer aparece num ficheiro confidencial relacionado com uma rede secreta, que fornecia informações aos Aliados. Sem esquecer a sua ligação afectiva ao poeta Pierre Reverdy, que integrava a Resistência.

A confirmar-se a actividade de Chanel na Resistência, é mais difícil de perceber a sua ligação aos alemães, que não é branqueada com esta nova informação. O museu irá também exibir provas de que Chanel colaborou com os nazis na Paris ocupada, incluindo transcrições de interrogatórios no pós-guerra de três oficiais alemães que a referem como uma fonte de confiança. Ao Guardian Cullen considerou que “as novas provas não a ilibam”. E continua: “Apenas tornam o quadro mais complicado. Tudo o que podemos dizer é que ela esteve envolvida com ambos os lados.”

Para lá desta vertente política na vida da designer, a exposição mostra cerca de 200 peças, incluindo os icónicos casacos de tweed ou os seus afamados vestidos pretos, além de imagens que caracterizam a sua vida e carreira.

Coco Chanel (1883-1971) foi uma estilista francesa que dominou a alta-costura parisiense durante quase seis décadas. Os seus designs, elegantes, mas de estilo descontraído, inspiraram as mulheres da moda a abandonar as roupas complicadas e desconfortáveis, como os espartilhos.

A sua tónica no conforto vinha, provavelmente, da sua infância, passada num convento, depois de a mãe ter morrido e o pai a ter abandonado.

Começou como vendedora até ter conhecido quem lhe abriu as portas da moda. Em 1913, com a ajuda financeira de Arthur Capel, abriu uma pequena chapelaria em Deauville, França, onde também vendia roupa desportiva simples, como camisolas de jersey.

A sua máxima de que “o luxo deve ser confortável, caso contrário não é luxo” atraiu uma influente clientela, ansiosa por se libertar dos preceitos de uma moda que instava ao sofrimento. E, no fim da década de 1920, as indústrias Chanel valiam milhões e empregavam mais de duas mil pessoas, repartidas pelo estúdio de alta-costura, pelo laboratório de perfumes, fábrica de têxteis e oficina de joalharia. Tudo impulsionado pelo icónico Chanel n.º 5, o perfume de sucesso que lançou em 1921.

Chanel fechou a sua casa de alta-costura em 1939, com o início da Segunda Guerra Mundial. E as suas ligações aos nazis forçaram-na a sair do país e da indústria.

Depois de um exílio de nove anos na Suíça, regressou triunfante a Paris, em 1954, conquistando também as passerelles em Londres e Nova Iorque.

Após a sua morte, em 1971, a casa de alta-costura da Chanel foi dirigida por vários designers, sendo o mandato de Karl Lagerfeld (1983-2019) o mais longo e mais influente. Desde a morte de Lagerfeld, o cargo pertence a Virginie Viard, que, nas suas colecções, evoca o estilo de Coco.

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