CDS quer vestir a pele do partido moderado contra a “radicalização”
Proposta de actualização da declaração de princípios é apresentada amanhã numa convenção que junta três ex-líderes do partido.
Afastado do Parlamento desde 2022 e com uma forte concorrência no espaço político não socialista, o CDS prepara-se para actualizar a declaração de princípios escrita na sua fundação, em 1974. Assume-se como um partido de “centro-direita e de direita”, inspirado nos valores da democracia cristã, mas opõe-se ao “discurso que fomenta o ódio e espalha a mentira no combate político”, rejeita os que atacam o “prestígio do Parlamento ou dos tribunais” e é a favor da “imigração regulada”. O partido liderado por Nuno Melo procura demarcar-se do Chega.
Com 19 pontos, a proposta de declaração de princípios actualizada é apresentada este sábado pelo histórico militante António Lobo Xavier numa convenção programática que junta três dos antigos líderes do partido: Paulo Portas, Manuel Monteiro e Assunção Cristas. Ao retrato de (alguma) união do partido, que viveu fortes divergências internas na anterior liderança, o actual líder mostra-se empenhado em diferenciar o CDS dos seus dois novos mais fortes concorrentes — o Chega e a Iniciativa Liberal.
É neste quadro que a nova versão da declaração de princípios do CDS coloca o partido como “adversário da linguagem agressiva, violenta ou de exclusão, do discurso que fomenta o ódio e espalha a mentira e a falta de rigor no combate político”, o que é muitas vezes atribuído ao Chega.
“O CDS rejeita, por isso, todos os populismos, sejam eles de esquerda ou de direita, de feição marcadamente doméstica ou de inspiração internacionalizada, enquanto instrumentos de ataque à democracia, de manipulação política, de radicalização e de excessiva conflitualidade”, lê-se no documento em que o partido reitera ser um “refúgio de moderação”.
Além da actualização da linguagem — foram retiradas palavras da época como “proletariado” e referências ao Movimento das Forças Armadas —, a nova versão reitera a defesa das instituições da democracia e do Estado de direito, assumindo que, “na frente interna, o CDS encontra-se do lado oposto aos que atacam o prestígio das instituições constitucionais, como o Parlamento, os tribunais, a lei, os direitos e garantias fundamentais, as Forças de Segurança e as Forças Armadas”. A posição pode ser vista como um recado para o Chega, que mantém um diferendo com o Tribunal Constitucional e tem sido acusado de desprestigiar a Assembleia da República.
Com uma contínua discussão interna sobre o posicionamento ideológico, umas vezes mais acesa, outras mais apagada, o CDS assume ser “dirigido ao espaço político do centro-direita e da direita democrática” e “com uma história de resistência contra o totalitarismo”. A nova versão da declaração de princípios deixa cair a abertura a todos os “democratas do centro‑esquerda e do centro-direita”, que constava no texto original do partido, que foi fundado em Julho de 1974 como Centro Democrático Social (CDS).
Democrata-cristão sim, mas não confessional
Na proposta de declaração, que será apreciada em conselho nacional e no próximo congresso do partido no início de 2024, o CDS adopta os valores cristãos, mas numa “perspectiva não confessional e inclusiva”.
No plano social, o CDS defende um sistema de saúde em “complementaridade” com o privado e social. Na educação, o ensino público deve ser “gerido de forma descentralizada e autónoma” e “no respeito pelas opções educativas individuais”. Em ambos os casos, a nova versão da declaração de princípios reflecte as propostas políticas defendidas nos últimos anos.
Defensor de um Estado social “moderno”, o partido propõe um “compromisso nacional, entre os partidos de Governo, que garanta a estabilidade das políticas de família e da imigração regulada” com vista a “reverter” o declínio demográfico, uma posição que também se distancia do que tem sido defendido pelo Chega.
Além de sublinhar a primazia dada às pessoas (“as pessoas antes do Estado”), o novo texto introduziu o dever “cuidar da ecologia” para garantir às gerações futuras uma vida humana “sustentável”.
Reiterando o compromisso com a NATO e com a União Europeia, o CDS defende “uma economia livre”, assente no “trabalho digno com salários justos, no empreendedorismo moderno, na inovação, na ciência e na tecnologia, com impostos moderados e baseados efectivamente na equidade”.
Se fica claro que o partido rejeita o modelo de um Estado que “monopoliza toda a energia colectiva e solidária de um povo”, também não encarna as vestes mais liberais quando assegura que “não se limita a confiar cegamente nas virtualidades do mercado livre ou da livre iniciativa” e quando assegura afastar-se “da visão exclusivamente liberal das causas da pobreza”. Um piscar de olhos aos sectores mais conservadores da sociedade.