HRW acusa Arábia Saudita de matar centenas de pessoas na fronteira com o Iémen

Riad terá usado força letal contra migrantes e requerentes de asilo etíopes, incluindo mulheres e crianças, diz a organização de defesa de direitos humanos.

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O migrante etíope Jemal Ahmed, fotografado em 2019 num abrigo temporário da Organização Internacional de Migrações, depois de ser repatriado do Iémen para a Etiópia. Afirmava que tinha sido ferido a tiro pelos sauditas Tiksa Negeri/REUTERS
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Na fronteira com o Iémen, os guardas fronteiriços da Arábia Saudita fazem uso regular de força letal, tendo matado centenas de pessoas, no mínimo, entre Março de 2022 e Junho de 2023, denunciou a organização de defesa de direitos humanos Human Rights Watch.

No mesmo dia, o site noticioso Axios dava conta da possibilidade de o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, se encontrar com o príncipe herdeiro e líder de facto do país, Mohammed bin Salman, à margem da cimeira do G20, que decorre no próximo mês em Nova Deli.

A Human Rights Watch diz que, se este uso de força letal tiver sido cometido no âmbito de uma política oficial, será um crime contra a humanidade.

Estas acções parecem continuar, acrescenta ainda a organização, apelando a “países preocupados” que pressionem Riad para não manter esta política ou investigar os responsáveis por ela, e pedindo ainda uma investigação das Nações Unidas.

“Há responsáveis sauditas que estão a matar centenas de migrantes e requerentes de asilo nesta zona remota de fronteira, longe da atenção do resto do mundo”, disse Nadia Hardman, investigadora da HRW para as questões de direitos de refugiados e migrantes. “O gasto de milhares de milhões para comprar campos de golfe profissionais, clubes de futebol e grandes eventos desportivos para melhorar a imagem da Arábia Saudita não deve desviar a atenção destes crimes horríveis.”

Num relatório de 73 páginas, para o qual ouviram 42 pessoas, incluindo 38 migrantes e requerentes de asilo da Etiópia que tentaram passar a fronteira, a HRW diz que os guardas mataram muitas pessoas com armas explosivas, e outras a tiro, incluindo mulheres e crianças, “num padrão generalizado e sistemático de ataques”. Em alguns casos, os guardas fronteiriços perguntaram aos migrantes ou requerentes de asilo contra que membro do seu corpo deveriam disparar – e dispararam contra eles, à queima-roupa.

Um rapaz de 17 anos afirmou que os guardas o obrigaram, a si e a outros sobreviventes, a violar duas raparigas, depois de terem matado a tiro outro rapaz que se tinha recusado a violar outra rapariga.

Um grupo internacional de peritos forenses, o Independent Forensic Expert Group of the International Rehabilitation Council for Torture Victims, analisou vídeos e fotografias que mostravam migrantes e requerentes de asilo feridos ou mortos para determinar as causas dos seus ferimentos. Concluíram que alguns ferimentos apresentavam “padrões claros consistentes com a explosão de munições com capacidade de produzir calor e fragmentação”, outros tinham “características consistentes com ferimentos de bala” e, num caso, eram visíveis queimaduras.

Os crimes ocorreram no final de uma rota de migração conhecida como a “rota do Leste” entre o Corno de África, pelo golfo de Áden, passando por regiões controladas pelos houthis no Iémen.

Há cerca de 750 mil etíopes a viver e trabalhar na Arábia Saudita, incluindo muitos que saíram do país por razões económicas, mas também um número substancial de pessoas que fugiram de violações de direitos humanos, incluindo durante o recente conflito armado no Norte da Etiópia.

Quanto a Joe Biden, a consideração de um encontro com Mohammed bin Salman surge numa altura em que há alguma especulação sobre um potencial acordo entre Israel e a Arábia Saudita com o patrocínio dos Estados Unidos, desejosos de voltar a ter os sauditas na sua órbita após o reatar de relações entre a Arábia Saudita e o Irão e a aproximação saudita à China. Mas vários analistas apontam para os muitos obstáculos que existem para o que seria mais um acordo histórico na região, incluindo as políticas israelitas para com os palestinianos.

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