Posso deixar o meu cão lamber-me a cara? Quais são os riscos?

A probabilidade de ficares doente é tão reduzida quanto a de seres atingido por um raio, ainda assim, deves ter cuidado. Para começar, não deixes que o teu cão se aproxime da tua boca, nariz ou olhos.

Foto
Posso deixar o meu cão lamber-me a cara? James Barker/Unsplash
Ouça este artigo
00:00
05:06

O meu cão costuma tentar lamber-me a cara. Devo deixar?

As probabilidades de ficares doente por causa de uma lambidela amigável na cara são muito baixas. No entanto, a verdade é que, de vez em quando, todos os cães são cães, ou seja, mastigam o cocó que está no passeio, lambem as partes baixas várias vezes por dia e trazem para casa uma ou outra criatura morta. Essa é a mesma boca com que se vai aproximar da tua cara.

Posto isto, existem boas razões para que a resposta oficial de muitos especialistas seja "não deixes", especialmente no caso de pessoas imunodeprimidas. As infecções contraídas a partir de animais de companhia provavelmente são subestimadas e pouco reconhecidas uma vez que os sintomas gerais são semelhantes aos da gripe e tendem a desaparecer por si próprios.

Ainda assim, são destacadas infecções bacterianas graves na literatura médica provocadas por lambidelas de cão. Por exemplo, um agente patogénico raro, mas potencialmente mortal — Capnocytophaga canimorsus — pode ser especialmente perigoso para os idosos, para quem consome muito álcool ou para pessoas imunodeprimidas, como é o caso das que não têm um baço funcional. Estas infecções são mais comuns depois de uma mordida, mas também podem acontecer sem a pessoa ser atacada.

Ainda assim, e embora esses riscos pareçam assustadores, é importante lembrar que são extremamente raros, explica Sonya Krishnan, especialista em doenças infecciosas na Johns Hopkins Univertiy School of Medicine, nos Estados Unidos.

Segundo as estimativas de alguns investigadores, a taxa de incidência da sépsis por Capnocytophaga está entre os 0,5-0,7 casos por um milhão de pessoas por ano. Tal como explica Sonya, é aproximadamente a mesma probabilidade de seres atingido por um raio.

Como posso reduzir os riscos?

Mesmo que sigas os conselhos de especialistas, podem existir alturas em que o teu cão te dá uma lambidela a meio de um abraço e te apanha desprevenido. Segundo a especialista em doenças infecciosas, para reduzires a probabilidade de ficares com problemas de saúde, certifica-te de que o teu animal tem as vacinas em dia, como a da raiva.

"A pele cria uma forte barreira à entrada de bactérias que causam infecções, pelo que há pouco risco de contrair uma infecção se um cão lamber a tua", destaca Sonya. Contudo, reforça, deves manter o teu animal longe de feridas abertas, como é o caso de borbulhas ou herpes labial.

Da mesma forma, é mais seguro evitares que se aproxime de membranas mucosas, como a boca, o nariz ou os olhos. E escusado será dizer que seres lambido por um cão vadio ou desconhecido é uma ideia pior do que deixares que o cão da família o faça.

Outra das preocupações ao aproximares o rosto de qualquer cão é o facto de te poder morder. Todos gostamos de acreditar que o nosso cãozinho nunca seria tão mau. No entanto, um estudo realizado com cerca de 1300 crianças tratadas devido a ferimentos provocados por mordidas de cães revelou que 37% das que deram entrada no hospital foram atacadas pelo um animal da família.

Na grande maioria dos casos, as mordidas de cães em crianças mais velhas e adultos acontecem nas mãos ou nos membros inferiores, mas, em crianças mais pequenas, pode ocorrer com mais frequência na cabeça e no pescoço. Por este motivo, é fundamental não deixar bebés ou crianças pequenas sem vigilância com o cão da família para evitar ferimentos, mesmo que acidentais.

Se tu ou os teus filhos forem mordidos por um cão — quer seja o teu ou o de outra pessoa —, limpa bem a área e liga imediatamente para o teu médico que poderá ter que prescrever antibióticos profilácticos ou, no caso de ferimentos graves, fazer uma cirurgia para tratar a ferida.

Não deixes de dar mimos ao teu cão

Nada disto quer dizer que não devas gozar plenamente das alegrias de estares com o teu cão. Muitos estudos descobriram que viver com um cão traz benefícios para a saúde, incluindo o alívio da solidão e a prática de exercício físico através de passeios diários.

Além disto, para muitos donos de animais de companhia, foram os cães que os ajudaram a ultrapassar a pandemia no meio de tanta dor e perda — é o meu caso.

Outra das vantagens é a eventual protecção imunitária que pode ser especialmente forte na infância, uma vez que há estudos que demonstram que os bebés que vivem com cães em casa têm menos probabilidades de desenvolver alergias alimentares e sintomas e infecções respiratórias.

Além disto, quando criamos uma ligação com o nosso cão, tanto o tutor como o animal recebem um impulso de oxitocina — a chamada "hormona do amor". Isto pode acontecer depois de fazermos festas ou falarmos com o cão. Lamber não é necessário.

O que deves saber

Certifica-te de que cuidas do teu animal de companhia como tratas da tua própria saúde. Até o cão mais inteligente precisa de exames de saúde preventivos, tal como um ser humano: bem vistas as coisas, os nossos estados de bem-estar estão ligados.

É importante fazer análises regulares às fezes do seu cão, que lhe dês um medicamento antiparasitário todos os meses e o habitues à escovagem regular dos dentes com pasta dentífrica canina. Se tiveres quaisquer preocupações ou perguntas, fala com o veterinário do teu animal.


Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post
Trisha Pasricha é médica no Massachusetts General Hospital, professora de Medicina na Harvard Medical School e jornalista especialista em saúde

Sugerir correcção
Ler 4 comentários