A ética e a integridade não se adquirem por questionário

Quem serve a “coisa pública” deve estar ciente de que assume um compromisso pessoal com os princípios éticos do serviço público. Se assim não for, impõe-se a rejeição do cargo de nomeação.

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Com o objetivo de minimizar o prejuízo causado pela sequência de "casos e casinhos" do terceiro Governo liderado por António Costa, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 2-A/2023, de 13 de janeiro, aprovou um questionário de verificação prévia à propositura de membros de Governo ao Presidente da República, a ser preenchido pelas personalidades convidadas pelo primeiro-ministro ou indigitadas para integrar o Governo. De acordo com o teor do comunicado do Conselho de Ministros de 12 de janeiro de 2023: “[…] Em face da responsabilidade política inerente ao exercício de cargos públicos, e do ponderoso grau de exigência e de responsabilização a que aqueles que querem assumir funções políticas se encontram sujeitos, este mecanismo adicional de escrutínio visa robustecer o processo de verificação das condições e exigências inerentes à assunção das funções para as quais aqueles são propostos, em benefício do escrutínio democrático e da confiança dos cidadãos no sistema político nacional.”

A Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, aprovou o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 42/2022 aprovou o Código de Conduta deste XXIII Governo Constitucional, e conforme ali referido, esta resolução “reafirma os princípios e deveres já consagrados na legislação vigente, nomeadamente no Código do Procedimento Administrativo e no Código de Conduta do XXII Governo Constitucional, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 184/2019, de 3 de dezembro, atualizando a concretização dos mesmos, face ao disposto na Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, na sua redação atual, que aprova o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos e altos cargos públicos”.

A aprovação daquele questionário não nos deve orgulhar, bem pelo contrário. O que o questionário vem demonstrar é a ineficácia de um quadro legal criado para prevenir condutas ilegais por parte dos detentores de cargos políticos e/ou equiparados e, nessa medida, contribuir para uma maior transparência na formação e tomada de decisões. O aproveitamento de cargos públicos para a obtenção de benefícios privados não pode deixar de merecer um especial juízo de censura, quando o exercício de funções públicas pressupõe um sentido de missão, orientado pela prossecução do interesse público. Quem serve a “coisa pública” deve estar ciente de que assume um compromisso pessoal com os princípios éticos do serviço público, e com os valores da transparência, integridade e imparcialidade. Se assim não for, impõe-se, a nosso ver, a rejeição do cargo de nomeação. Infelizmente, a ética e a integridade não se adquirem por questionário.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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