Ataque contra prisão no Sudão permite fuga de suspeito de crimes contra a humanidade

Ahmed Haroun é acusado de duas dezenas de crimes de guerra durante o conflito no Darfur. Cessar-fogo fez diminuir a intensidade dos combates, mas persistem confrontos em algumas zonas da capital.

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Cessar-fogo tem sido cumprido, mas persistem os combates em alguns locais de Cartum Reuters/STRINGER

As forças paramilitares que têm combatido o Exército sudanês tomaram de assalto várias prisões, permitindo a fuga de presos, incluindo um antigo político acusado de crimes contra a humanidade, segundo a BBC.

As Forças de Apoio Rápido (RSF) atacaram cinco estabelecimentos prisionais, incluindo a prisão de Kober, em Cartum, onde estavam detidas várias figuras destacadas da ditadura de Omar Bashir, incluindo o ex-Presidente. O Exército sudanês informou que Bashir, de 79 anos, tinha sido transferido para um hospital-prisão ainda antes da eclosão dos combates que continuam em curso.

No entanto, entre os presos que conseguiram deixar a prisão está Ahmed Haroun, que chegou a ser ministro do Interior e é acusado pelo Tribunal Penal Internacional de 22 crimes de guerra e 20 crimes contra a humanidade, incluindo atrocidades cometidas durante o conflito no Darfur.

Haroun estava preso desde 2019, na sequência do golpe militar que derrubou o regime de Bashir, que estava no poder há três décadas.

Numa gravação áudio, o ex-dirigente político disse ter saído da prisão com outros antigos governantes por razões de segurança, mas garantiu estar disposto a voltar a apresentar-se à justiça assim que a situação no Sudão se normalizar. “Tomámos a decisão de nos proteger por causa da falta de segurança, água, comida e tratamento, bem como depois da morte de muitos detidos em Kober”, disse Haroun ao jornal Al-Sudani, próximo de Bashir.

A ditadura de Bashir foi derrubada numa operação conjunta entre o Exército e as RSF, em 2019, mas hoje as duas entidades estão em lados opostos em confrontos que ameaçam arrastar o Sudão para uma guerra civil, com potencial para se tornar num conflito regional. Em causa estão divergências sobre a integração das RSF nas forças regulares militares e sobre rumo do processo de democratização do Sudão.

Em 2021, os militares já tinham afastado o governo interino civil e passaram a governar o país africano.

Desde que os combates se iniciaram, a 15 de Abril, mais de 450 pessoas morreram e mais de três mil ficaram feridas, segundo a Organização Mundial de Saúde. Esta quarta-feira cumpre-se o segundo dia de um cessar-fogo que tem permitido a retirada de cidadãos estrangeiros do Sudão, bem como a saída de civis das zonas mais violentas.

No entanto, continuaram a registar-se combates em alguns locais da capital e em Omdurman, nas suas imediações, apesar de se verificar uma descida da intensidade dos confrontos.

“Ainda não surgiu qualquer sinal inequívoco de que cada um [dos lados] esteja preparado para negociar de forma séria, sugerindo que ambos acreditam que assegurar uma vitória militar sobre o outro é possível”, disse o enviado especial da ONU para o Sudão, Volker Perthes.

Apesar dos esforços, para muitos civis uma saída de Cartum é uma missão praticamente impossível por causa da escassez de combustível e pela inflação dos preços dos bilhetes de autocarro. “Estamos mesmo a sofrer, acabou o combustível, as padarias estão a fechar, o preço do tomate e da carne disparou, para além da falta de medicamentos”, disse um homem sudanês citado pela Al-Jazeera.

A interrupção das actividades de várias organizações humanitárias, num país onde pelo menos um terço dos 46 milhões de habitantes já dependia de ajuda externa para sobreviver antes da guerra, deverá agravar a situação para a generalidade da população.

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