Cimeira Ibero-americana em prol da “paz duradoura” sem mencionar a guerra na Ucrânia

Líderes comprometem-se a trabalhar para regularizar os processos de migração e estão de acordo nas questões da carta ambiental, da segurança alimentar, da arquitectura financeira e do digital.

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A habitual foto de conjunto da Cimeira Ibero-Americana Dominican Republic Ministry of Foreign Affairs/Handout via REUTERS

Os líderes ibero-americanos comprometeram-se na cimeira de Santo Domingo, que decorreu sexta-feira e sábado na capital da República Dominicana, a trabalhar por uma “paz duradoura”, mas, em sinal das divergências entre os seus Estados quanto à questão da guerra na Ucrânia, em nenhum momento do seu apego à Carta das Nações Unidas se referiram ao conflito que desde 24 de Fevereiro de 2022 tem lugar na Europa.

“Trabalharemos pela paz completa, justa e duradoura em todo o mundo com base nos princípios da Carta das Nações Unidas, incluindo os princípios de igualdade soberana e integridade territorial dos Estados”, refere a Declaração de Santo Domingo acordada pelos chefes de Estado e de governo presentes, entre eles o Presidente, Marcelo Rebelo de Sousa, e o primeiro-ministro, António Costa.

O ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol, José Manuel Albares, referiu que Espanha fez várias propostas para incluir o conflito na Ucrânia na declaração final, mas nenhuma delas acabou por ser plasmada na declaração que precisa de ter a unanimidade dos 22 Estados para ser aprovada.

A primeira cimeira presencial em três anos, por causa da pandemia, acabou por não ser tão simbólica como à primeira vista se julgava. Não só porque o Presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, doente com pneumonia (que o levou a cancelar a sua viagem à China) não esteve presente, também porque não se concretizou a primeira presença de Nicolás Maduro numa Cimeira Ibero-americana em dez anos de poder na Venezuela. O chefe de Estado venezuelano esteve para viajar para Santo Domingo – a organização chegou a dar conta disso –, mas terminou por ficar em Caracas.

Seja como for, a ausência de menção à invasão russa da Ucrânia tem o dedo da Venezuela e da Nicarágua, que têm alinhado com a Rússia desde o princípio do conflito.

Guerra à parte, a cimeira encerrou no sábado (já noite em Portugal) com consenso em torno de quatro temas principais, a carta ambiental, o digital, a segurança alimentar e a arquitectura financeira. Neste último caso, embora os líderes tenham conseguido aprovar uma declaração especial sobre a arquitectura financeira internacional, adiaram para a cimeira de 2024, no Equador, o estabelecimento de uma “proposta mais concreta” para a reforma do sistema de financiamento internacional, como disse o presidente do Governo espanhol, Pedro Sánchez, citado pela Europa Press.

Os 22 Estados mandataram o Governo do Equador para que apresente essa “proposta mais concreta de reforma do sistema de financiamento” na cimeira de Quito, em Novembro de 2024.

Migrações

Na conferência final da XXVIII Cimeira Ibero-americana, o chileno que dirige a Secretaria Geral Ibero-americana, Andrés Allamand, referiu que, na questão da migração, os Estados concordaram com a ideia de organizar uma conferência sobre o tema no terceiro trimestre deste ano, num local e data ainda a fixar.

“O diálogo sobre a governança migratória deve ser aberto, inclusivo e transparente, baseado nos princípios da selectividade, inclusão, solidariedade, cooperação regional e internacional e nas responsabilidades partilhadas dos Estados”, dizem os líderes ibero-americanos, que se mostraram favoráveis a “uma migração segura, ordenada e regular” que respeite os direitos dos migrantes.

Daí que tenham apostado na “busca conjunta de mecanismos que garantam uma adequada gestão dos fluxos migratórios”, bem como de “processos de regularização migratória ágeis e acessíveis” que visem a inserção socioeconómica dos migrantes e o apoio às comunidades de acolhimento.

Os 22 também adoptaram uma “Rota Crítica de Segurança Alimentar, Inclusiva e Sustentável na Ibero-América”, um documento que propõe acções para enfrentar o impacto das crises actuais nos sistemas agro-alimentares, de modo a evitar o aumento da fome e garantir a alimentação adequada para todos. Para isso, pretende-se fortalecer o comércio livre e não discriminatório, desenvolvendo cadeias agro-alimentares de abastecimento que sejam inclusivas e resilientes.

Os países deram luz verde a um documento sobre o ambiente com orientações para enfrentar os desafios ambientais globais que afectam de forma muito forte na Ibero-América em resultado das alterações climáticas, a perda da biodiversidade, a contaminação, a degradação dos solos, a escassez de recursos hídricos, entre outros.

Finalmente, também foi assinado um documento que se pretende venha a ser referência para actualização das legislações nacionais em matérias digitais. A Carta Ibero-americana de Princípios e Direitos Digitais visa ajudar na “construção da sociedade da informação” com base nas pessoas, onde os direitos humanos sejam protegidos.

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