Carcinoma de Células Renais: o que conhecer desta doença?

A maioria é diagnosticada no sexo masculino, correspondendo ao sexto tumor sólido (e o terceiro urológico) mais diagnosticado.

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O tabaco está entre os factores de risco Nuno Ferreira Santos/Arquivo

Existem vários tipos de células que compõem um rim, mas são aquelas do epitélio dos túbulos proximais que vão originar o carcinoma de células renais.

Desde 2016, existem 16 diferentes entidades no carcinoma de células renais reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a maioria correspondendo ao subtipo de células claras (70-80% dos casos). Como tal, quer seja por biópsia ou peça operatória, é obrigatória a avaliação microscópica (pela especialidade de Anatomia Patológica) que, além do subtipo histológico em causa, informa sobre vários aspetos biológicos que podem ajudar o oncologista a orientar a terapêutica sistémica. Cada vez mais se espera a integração de dados genéticos que podem ser importantes na individualização prognóstica e terapêutica.

No que diz respeito a quantidade de novos casos em Portugal, a estimativa do Globocan (OMS) para 2020 refere cerca de 1200 casos no país, encontrando-se entre os 12 tumores sólidos mais diagnosticados, numa lista que ultrapassa 30 entidades. No entanto, a maioria é diagnosticada no sexo masculino, correspondendo ao sexto tumor sólido (e o terceiro urológico) mais diagnosticado. Ainda neste ano, cerca de 500 mortes foram atribuídas a esta doença (também na lista dos 12 tumores mais fatais).

É um dos cancros cuja incidência mais deverá aumentar nas próximas décadas.

Para a sua deteção existem vários fatores de risco descritos, como hipertensão arterial, obesidade, diabetes mellitus, tabagismo ou sexo masculino. Exposição ambiental a certos carcinogéneos (ex. tricloroetileno) e hemodiálise também são mencionados como fatores de risco. Antecedentes familiares de carcinoma renal pode aumentar o risco nos descendentes; numa minoria dos casos existe risco genético identificado, como na doença de Von Hippel-Lindau (mutação no gene VHL) entre outras síndromes hereditárias. Diagnóstico antes dos 50 anos, tumores bilaterais ou subtipos histológicos específicos devem alertar para a realização de teste genético.

Ainda assim, este é um cancro reconhecidamente “silencioso”: a tríade classicamente descrita (hematúria, dor e massa palpável no flanco) apenas ocorre em 10% dos doentes. No entanto, há casos em que o tumor pode produzir substâncias que vão exercer efeitos noutros órgãos (manifestações paraneoplásicas) como hipercalcémia, hipertensão, disfunção hepática (síndrome de Stauffer), desregulação da glicémia e outros distúrbios metabólicos.

A ocorrência de síndromes paraneoplásicas neste tumor é das mais elevadas que se conhecem (10 a 40% dos casos), algo que valeu a designação do “tumor do internista” pela variedade e complexidade das suas manifestações clínicas.

Atualmente, a maioria dos tumores são diagnosticados de forma “acidental”, isto é, quando é realizado algum exame por algum motivo e daí resulta a identificação de uma massa renal. A acuidade e disponibilidade dos exames de imagem fez com que a maioria destes tumores seja diagnosticado numa fase inicial, o que melhora o prognóstico e permite tratamentos menos radicais pelo urologista, que visam poupar parte do rim afetado (como nefrectomia parcial ou terapêuticas ablativas). Não existe rastreio populacional preconizado para o carcinoma de células renais.

O risco de recidiva, após cirurgia, varia de acordo com, por exemplo, estadiamento TNM, grau ou presença de diferenciação sarcomatóide, e pode até rondar 70% durante os cinco anos seguintes, em doentes de alto risco, o que é significativo.

Segundo a melhor evidência, no carcinoma renal de células claras, nos casos de maior risco a imunoterapia (inibidor do checkpoint imunitário durante um ano) pode reduzir a probabilidade de recidiva e é a única terapêutica adjuvante aprovada na Europa, pelo que, sistematicamente, todos os casos devem ser discutidos em reunião multidisciplinar.

Nos casos não candidatos a imunoterapia adjuvante, os doentes ficam em vigilância (follow-up), habitualmente por realização de exames de imagem em períodos de três a seis meses, durante vários anos. A imunoterapia e inibidores de tirosina cinase (pequenas moléculas que atuam inibindo processos celulares) são pilares fundamentais do tratamento sistémico na doença avançada (inoperável) ou metastática.


O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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