Mortágua terá de responder em tribunal sobre o que ganhou no comentário na SIC

Cidadão que fez a denúncia ao Ministério Público pediu a abertura da instrução do processo. BE diz não ter conhecimento formal. Advogado foi o sexto da lista do Chega por Lisboa às legislativas.

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Quando foi tornado público que o pagamento do comentário televisivo era incompatível com o regime de exclusividade, a deputada do Bloco devolveu os apoios pagos durante cinco meses Rui Gaudêncio

Devolver o dinheiro e corrigir as suas declarações de registo de interesses não bastou: Mariana Mortágua terá mesmo que ir a tribunal explicar todo o processo de acumulação do subsídio de exclusividade como deputada com o pagamento pelo seu comentário televisivo na SIC Notícias depois de ter sido pedida a abertura da instrução do processo.

De acordo com a revista Sábado, o autor da denúncia do caso de Mortágua junto do Ministério Público não se conformou com a decisão de arquivamento do inquérito pelo Departamento de Instrução Criminal, e insistiu junto do Tribunal Central de Instrução Criminal pedindo a abertura da instrução do processo, que já foi aceite. A juíza que aceitou o pedido terá já considerado que a deputada do Bloco deve ser constituída arguida, acrescenta a revista.

Ao PÚBLICO, fonte da bancada do Bloco disse ser desconhecida qualquer nova decisão sobre o assunto depois do despacho de arquivamento. De acordo com a Sábado, estará já marcada a data do debate instrutório para 17 de Abril, a menos de um mês da convenção do partido em que Mariana Mortágua é candidata à liderança do Bloco.

O advogado do cidadão queixoso, Luís Gonçalves Pereira, foi o sexto candidato do Chega às legislativas do ano passado pelo círculo de Lisboa. Ainda em 2022, André Ventura pediu que a Comissão de Transparência se pronunciasse sobre as actividades de Mortágua como colunista do Jornal de Notícias.

Neste processo estarão em causa os crimes de peculato e de recebimento indevido de vantagem por parte de Mariana Mortágua. Para a deputada do Bloco ser constituída arguida terá que lhe ser levantada a imunidade parlamentar, porém, o pedido não tinha ainda chegado à Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados nesta quinta-feira, confirmou ao PÚBLICO a presidente Alexandra Leitão.

Foi, aliás, a Comissão de Transparência e Estatuto dos Deputados que considerou que o assunto estaria arrumado do lado do Parlamento depois de a deputada Mariana Mortágua ter devolvido o subsídio de exclusividade que recebeu da Assembleia da República durante cinco meses, de ter comunicado à SIC que passaria a exercer o seu comentário político pro bono, no programa Linhas Vermelhas, e de ter corrigido as informações das suas declarações de registo de interesses.

Em Março do ano passado, foi também a Sábado que noticiou que a deputada do Bloco estava a acumular desde Outubro de 2020 o subsídio de exclusividade na AR e o pagamento pelo comentário televisivo quando tal tinha passado a ser considerado proibido por um parecer da Comissão de Transparência de 2020 que esclarecia que esse tipo de colaboração era permitido mas não podia ser remunerado.

As colaborações remuneradas de deputados com a imprensa escrita – como Mariana Mortágua teve com o Jornal de Notícias desde 2014 até ao ano passado – são consideradas como “percepção de rendimentos provenientes de direitos de autor" e, por isso, são compatíveis com o exercício do mandato em exclusividade.

Porém, as colaborações regulares pagas com canais de televisão em programas de comentário ou debate televisivo não são consideradas conteúdos ao abrigo do regime de direitos de autor e, por isso, são incompatíveis com o regime de exclusividade, concluiu um parecer do grupo de trabalho dos registos de interesses, que funciona na dependência da Comissão de Transparência.

Embora esse parecer fosse de Fevereiro de 2020, Mariana Mortágua argumentou que não conhecia o seu teor porque nessa altura não tinha colaboração com qualquer canal de televisão. A deputada tinha exercido a actividade de comentadora televisiva entre Julho de 2015 e Setembro de 2019. No entanto, também não havia declarado nos seus registos de interesse que essa actividade era paga. E foi isso que também teve que corrigir no ano passado quando a questão veio a público.

A violação das regras de incompatibilidade do Estatuto dos Deputados e do Estatuto Remuneratório dos Titulares de Cargos Políticas é punida com a perda de mandato.

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