O Árctico está cheio de lixo plástico vindo da Europa

Estudo que teve a colaboração de turistas que visitaram Svalbard conclui que os resíduos plásticos da Europa representam 8% dos que chegam ali, e a maioria destes provêm da Alemanha.

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"Cerca de 11% da produção global de plástico acaba nos nossos cursos de água", salientam os investigadores alemães EPA/Orlando Barría

O arquipélago de Svalbard, que fica a cerca de 560 km da costa norueguesa, é o local habitado permanentemente mais próximo do Pólo Norte. Mesmo assim, são abundantes os lixos que o mar para ali traz. E, segundo um projecto de ciência-cidadã coordenado pelo Centro Hemholtz para Investigação Polar e Marinha do Instituto Alfred Wegener, na Alemanha, 80% deste lixo são plásticos e um terço vem da Europa.

De 2016 a 2021, os turistas que fizeram cruzeiros em grandes veleiros até Svalbard, em viagens em que podem ver baleias e ursos polares, foram convidados pelo instituto científico alemão a recolher o lixo que encontrassem na costa das ilhas. “Em 2016 começamos a trabalhar com cidadãos para investigar a composição dos lixos plásticos que chegam às costas do Árctico”, diz a investigadora Melanie Bergmann, citada num comunicado de imprensa do Instituto Alfred Wegener.

Durante esses cinco anos, em colaboração com as empresas que fazem os cruzeiros no Árctico, foram recolhidos 23 mil fragmentos, com um peso combinado de 1620 quilos, relata a equipa de Bergmann, que analisou o lixo e acaba de publicar os resultados na revista científica Frontiers in Marine Science.

“Estudámos os destroços que ainda tinham algumas marcas ou etiquetas que revelassem a sua origem. Concluímos que a larga maioria (80%) deste lixo é plástico”, explica Anna Natalie Meyer , também do Instituto Alfred Wegener e primeira autora do artigo.

A maior parte destes destroços podem ser classificados como desperdícios que resultam da actividade pesqueira, mas é difícil identificar a sua origem. Só cerca de 1% apresentava ainda marcas reconhecíveis – que revelavam que vinham sobretudo da Rússia e da Noruega, países do Árctico.

“Sabemos, de outros estudos e através de modelos de computador, que a poluição de plástico vem tanto de fontes remotas como locais”, precisou Meyer, citada no comunicado de imprensa.

“Localmente, o lixo plástico que acaba no oceano provém de navios e das comunidades do Árctico que não têm bons sistemas de gestão dos resíduos”, explicou. “Mas há destroços de plástico e microplásticos que são transportados para o oceano Árctico por vários rios e correntes oceânicas, e têm origem no Atlântico, no Mar do Norte e no Pacífico Norte”, acrescentou.

Plásticos da Europa representam 8%

Por exemplo, os cientistas encontraram lixos provenientes de locais tão distantes de Svalbard como o Brasil, a China e os Estados Unidos. Os resíduos plásticos da Europa representam 8% do total, e a maioria destes provêm da Alemanha. “Considerando que a Alemanha é a ‘campeã europeia’ tanto em termos de produção de plástico como exportação de resíduos, esta percentagem relativamente elevada não é surpreendente”, comentou Melanie Bergmann.

“Os nossos resultados mostram que mesmo países industrializados e prósperos, que poderiam ter melhores sistemas de gestão dos resíduos, contribuem significativamente para a poluição de ecossistemas remotos, como o Árctico”, conclui Bergmann.

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Pequenos fragmentos de plástico recolhidos no Árctico Alfred-Wegener-Institut / Melanie Bergmann

De acordo com o estudo, uma grande quantidade do lixo plástico acaba nas costas do Árctico, que é uma espécie de ponto final do esgoto. Este é mais um problema para uma região que já está a sofrer desproporcionalmente os efeitos das alterações climáticas – o aquecimento global está a acontecer quatro vezes mais rápido no Árctico do que a média global.

“Cerca de 11% da produção global de plástico acaba nos nossos cursos de água”, salienta a investigadora alemã. “Para lidar com o problema de forma eficaz, é preciso melhorar a gestão dos resíduos localmente, em especial nos navios e na actividade pesqueira. Também é importante que se reduza de forma maciça a produção global de plásticos, em especial nos países industrializados da Europa, América do Norte e Ásia”, afirma.

Este estudo é mais uma demonstração da “necessidade urgente de um Tratado das Nações Unidas sobre os Plásticos que seja vinculativo”, salienta Melanie Bergmann. Esse tratado está actualmente em negociação, e o objectivo é que entre em vigor em 2024.

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