Carla Castro, a “espécie de supermulher” que pareceu conquistar o conclave

A candidata liberal estava feliz, mas os votos só são contados neste domingo.

Foto
Carla Castro "feliz" depois de bo recepção na convenção NFS Nuno Ferreira Santos
Reserve as quintas-feiras para ler a newsletter de Ana Sá Lopes em que a política vai a despacho.

Se houvesse um medidor que fosse capaz de associar uma sala aos gritos a uma vitória, Carla Castro já teria conquistado a presidência. Mas o barulho não é uma sondagem perfeita: dois votos de “membros” [a Iniciativa Liberal não tem militantes, tem membros] calados valem mais do que o voto de um membro ruidoso. Com a agravante da convenção do partido decorrer não só presencialmente, no Centro de Congressos de Lisboa, mas também à distância. E os militantes à distância, nas suas casas, apesar de não contribuírem para o entusiasmo da velha FIL, votam. Usar um decibelímetro num congresso pode dar resultados enganadores.

E, no entanto, a confirmar-se a vitória de Carla Castro na convenção da Iniciativa Liberal, ela será “against all odds” ou como quem diz “contra ventos e marés”. É isto que acha Pedro Serrasqueiro, professor de Estatística no ISCTE, apoiante de Carla Castro que usa duas expressões inglesas para tentar explicar porque a eventual vitória de Carla Castro, em que acredita “pela dinâmica da sala” e “percepção do descontentamento nas estruturas do partido”, não foi um caminho fácil.

A acontecer, a vitória será o sucesso de uma candidata “underdog” [desfavorecido], diz Serrasqueiro. “É evidente para todos que a candidatura de Carla Castro é a de underdog, há um grande desequilíbrio de meios entre as campanhas”. Afinal, Rui Rocha é apoiado por João Cotrim Figueiredo e por boa parte da sua direcção a que, aliás, pertencia Carla Castro. Serrasqueiro, que já trabalhou com a deputada na Comissão de Orçamento e Finanças da Assembleia da República, e também na comissão do Novo Banco, acha-a “uma espécie de supermulher”.

“A Carla tem uma invejável capacidade de trabalho”, diz, admirando “a quantidade de coisas que consegue fazer ao mesmo tempo” e a sua “gravitas”: “Se for Rui Rocha o eleito, isso vai-se perceber. E é o futuro da direita em Portugal que está em jogo”, afirma.

Bernardo Blanco, o deputado de 27 anos que também levantou a sala com o seu discurso, é apoiante de Rui Rocha e candidato a seu vice-presidente. Diz-se “confiante”, mas afirma que o confronto, desde o início, sempre esteve “muito equilibrado”. E aponta que os resultados de uma “convenção mista” como esta da Iniciativa Liberal podem ser mais inesperados – e até os participantes à distância podem, com mais facilidade, decidir não votar e optar por um passeio de domingo.

É verdade que os gritos de uma sala dão sinais sobre o entusiasmo à volta de determinada candidatura, mas nesta convenção da Iniciativa Liberal também foi um candidato a produzi-los. Rui Rocha esteve perto de destruir os tímpanos dos presentes quando abriu o discurso com uma saudação-berraria, símbolo do seu entusiasmo e dotes vocais: “Boa tarde liberais”.

A voz de Rui Rocha voltou a atingir os máximos no elogio a Cotrim de Figueiredo que durante muito tempo foi “um deputado único que honrou a Iniciativa Liberal com a sua qualidade democrática”. O tom subiu novamente quando Rui Rocha proclamou que o partido sob a sua liderança iria “virar o país do avesso” e é capaz de ter ultrapassado a barreira de som (tomando como amostra congressos nacionais de todos os partidos) quando fechou a intervenção gritando “Portugal, Portugal!”.

Apesar do apoio de pesos-pesados, Rui Rocha parecia estar em perda. Afinal, foi muito rapidamente que enfiou o casaco de candidato da continuidade contra uma candidata da renovação, ainda que Carla Castro também fizesse parte da Comissão Executiva. Inúmeras intervenções defendiam a “mudança”.

No fim, quando a convenção interrompeu para jantar, Carla Castro era uma mulher “feliz”. Se já tinha sentido “um crescendo na campanha” interna, com a adesão dos núcleos, o primeiro dia da Convenção “foi a confirmação”. “É bom quando se vê que conseguimos fazer aquilo que achamos que está correcto e que vemos a adesão ao nosso projecto”, diz ao PÚBLICO. Falta contar os votos, mas “amanhã logo se vê”. “Hoje sabemos que fizemos o caminho certo e isto tem que nos dar satisfação”.

Um delegado citava Camões, à entrada do Pavilhão, na fala do Velho do Restelo: “Ó glória de mandar, ó vã cobiça/desta vaidade a quem chamamos fama”. A vida toda – incluída a vida política – vem inteirinha nos clássicos.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários