MAC/CCB é como se chama o antigo Museu Colecção Berardo

Anúncio foi feito esta manhã pelo ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva. Futuro museu ainda não tem data de inauguração. Para o advogado de Joe Berardo, “este não é o momento de tecer comentários”.

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Telões com antiga sinaléctica de Museu Colecção Berardo a serem retirados na manhã desta segunda-feira Nuno Ferreira Santos
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Novo MAC/CCB: sinalética montada na manhã desta segunda-feira cortesia: ministério da cultura
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Antigo Museu Berardo foi inaugurado há 15 anos e entra agora na sua terceira vida Nuno Ferreira Santos

Ainda não tem data de inauguração, mas já tem nome definitivo: o antigo Museu Colecção Berardo passará a chamar-se Museu de Arte Contemporânea – Centro Cultural de Belém, anunciou esta manhã aos jornalistas o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, depois de uma reunião com a administração do CCB.

Na versão abreviada do novo nome, o museu assumirá a identidade MAC/CCB, com o hífen mais clássico a ver-se preterido em favor da barra oblíqua, uma moda que a Internet generalizou.

O futuro museu irá nascendo, por fases, ao longo deste ano. “Estamos num novo capítulo do CCB. Vamos, durante o ano de 2023, inaugurar aqui um novo museu — MAC/CCB”, disse, à porta do CCB, Pedro Adão e Silva, já depois de os telões com o nome do antigo Museu Colecção Berardo (MCB) terem sido retirados da fachada principal do centro cultural, numa operação que teve início pouco depois das 8h da manhã.

Ao longo do dia, os “b” de Berardo, como o néon luminoso no pátio central que anunciava o agora ex-MCB, foram sendo substituídos pela nova sinalética a indicar MAC/CCB. O vermelho e branco do antigo museu foi trocado por um grafismo que usa preferencialmente o preto e o cinzento e onde se poder ler rasgado a branco: “Futuro Museu de Arte Contemporânea MAC/CCB, um chão comum”, numa referência ao lema com que o CCB se prepara para comemorar 30 anos, em 2023. Esta imagem gráfica deverá, porém, ser temporária.

“O CCB recupera também uma parte da sua vocação, que é ser um chão comum: tem um centro de exposições e um centro de artes performativas. É um momento de viragem em que um grande equipamento da cidade de Lisboa assume a sua vocação de cruzamento entre as várias artes”, oficializou o ministro.

Sete meses depois, Adão e Silva cumpria assim a promessa que fizera na conferência de imprensa em que deu a conhecer que o Estado se preparava para denunciar o acordo de comodato assinado em 2006 com Joe Berardo, depois de a acção judicial movida pelos três bancos credores do empresário ter conduzido, em 2019, ao arresto da sua colecção de arte moderna e contemporânea.

Foi também em Maio deste ano que Adão e Silva anunciou a intenção de compra da Colecção Ellipse, acervo que pertencia ao universo do Banco Privado Português (BPP) de João Rendeiro — para assim criar, com base nestas duas colecções, e juntando-lhes ainda a CACE, o museu de arte contemporânea mencionado no programa do Governo.

Findo o protocolo entre o empresário José Berardo e o Estado que produziu efeitos até 31 de Dezembro, o Centro de Exposições (também chamado “módulo 3”), onde o MCB foi inaugurado há 15 anos, regressa agora à gestão do CCB. O novo museu, esse, é ainda um work in progress.

“O CCB recupera hoje um espaço expositivo de nove mil metros quadrados. Teremos aqui um novo museu que terá a Colecção Ellipse, a Colecção de Arte Contemporânea do Estado (CACE) e, enquanto se mantiverem os termos do arresto tal como existem hoje, naturalmente também a Colecção Berardo”, voltou a explicar Pedro Adão e Silva, não excluindo que, no futuro, outras colecções possam vir a juntar-se a estas.

Os termos do arresto determinam que a Colecção Berardo deverá continuar em exposição pública até haver uma decisão judicial definitiva sobre a sua propriedade, no âmbito do contencioso jurídico que opõe o empresário e o consórcio formado por três bancos que dele se reclamam credores. O tribunal nomeou o actual presidente do CCB como fiel depositário dos bens arrestados.

O nome do novo museu apenas faz referência à arte contemporânea, sem menção ao período moderno que constitui o coração da Colecção Berardo. Entre as suas mais de 800 obras, este acervo contem núcleos importantes dedicados às vanguardas históricas, como o surrealismo.

Numa informação enviada às redacções já ao final da manhã, o Ministério da Cultura justificava a escolha: “O termo ‘arte contemporânea’ não se vincula a um período específico, nem a qualquer determinação estilística. Pelo contrário, convoca um ponto de vista actual sobre a arte nossa contemporânea, tendo em consideração que a arte do século XX continua a ser relevante para a compreensão e fruição da arte de hoje.”

A administração do CCB, que desceu juntamente com o ministro para o encontro com os jornalistas, disse que o museu passará a encerrar à segunda-feira, deixando de estar aberto todos os dias da semana.

Cumprindo o novo horário, o museu permaneceu encerrado neste primeiro dia útil do ano, devendo reabrir na terça-feira, 3 de Janeiro. Cobrará, “para já”, o mesmo preço aos visitantes, precisou ao PÚBLICO Elísio Summavielle, presidente do CCB, ladeado por Delfim Sardo, o administrador responsável pela programação. Será a administração do CCB, aliás, a assegurar a direcção do MAC/CCB, em colaboração com a equipa do ex-Museu Colecção Berardo, que tinha como directora artística Rita Lougares.

Abertura faseada

Neste primeiro dia da sua nova encarnação pós-MCB, os visitantes vão encontrar no CCB, como até aqui, a Colecção Berardo exposta. “É preciso fazer um conjunto de alterações, pequenas intervenções e obras, e ao longo de 2023, de forma faseada, abriremos o MAC/CCB. Haverá um calendário que será apresentado ao longo do ano”, disse Pedro Adão e Silva. O ministro adiantou que a compra da Colecção Ellipse à comissão liquidatária do falido BPP, através da troca de créditos, está a ser concluída. “É uma grande colecção que enriquecerá o museu.”

Pedro Adão e Silva não explicou como será escolhida a nova direcção do museu e se vai ser aplicado o modelo de concurso público que tem vigorado para os museus nacionais tutelados pela Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC). “Para já, essa questão não se coloca. Nós queremos estabilizar o quadro em que operará aqui o novo museu e temos um conselho de administração do CCB que nos dá todas as garantias de que é capaz de também assumir esse lado de direcção.”

Sobre o papel que terá Rita Lougares, o ministro foi vago: “Sobre a questão dos trabalhadores do Museu Berardo aquilo que procurámos foi transmitir no último mês uma mensagem de tranquilidade. As relações laborais manter-se-ão tal como existem hoje. Isso aplica-se também à directora do museu. E mais à frente veremos como é que a situação evolui.” Contactada pelo PÚBLICO, a até aqui directora artística do MCB não quis prestar declarações.

Interrogado sobre se o cargo de direcção será agora assumido por Delfim Sardo, Pedro Adão e Silva também negou esse cenário. Mas se o administrador do CCB não terá o cargo, ao que tudo indica terá a função. “Delfim Sardo é, como sabem, membro do conselho de administração do CCB, alguém que tem um currículo e um perfil que permite assumir essas responsabilidades enquanto membro do conselho de administração”, declarou Adão e Silva.

Um dos mais conhecidos curadores portugueses, Delfim Sardo já dirigiu o Centro de Exposições entre 2003 e 2006. E assumiu em Janeiro de 2020, seis meses depois de os tribunais terem decretado o arresto da colecção, o pelouro da programação do CCB.

“O contemporâneo é o que connosco convive”

No âmbito de um processo judicial cujo desenlace continua a ser incerto, o ministro voltou a repetir que, “naturalmente”, estará interessado em negociar com quem for decretado proprietário da colecção. “[Nesse momento, que ninguém consegue prever quando será conhecido,] estaremos interessados em negociar os termos da continuidade [da Colecção Berardo] aqui no espaço do novo museu. Até lá, neste contexto de incerteza, o que nos cabe é garantir a fruição pública da colecção.”

Adão e Silva lembrou que recentemente, conforme o PÚBLICO noticiou, foi pedido aos tribunais que esclareçam se os termos do actual arresto se vão manter. “Qualquer cenário alternativo ao CCB significa que as peças sairão daqui e terão outro destino. Isso não é do interesse público, mas também não é do interesse das partes do processo, porque nem os bancos nem o sr. Berardo têm algo a ganhar, se tiverem de assumir a responsabilidade de pagar a conservação e a manutenção das peças.”

Na nota enviada pelo gabinete do ministro às redacções, há uma referência à futura programação de exposições temporárias, que também ainda não tem data para ser anunciada: “Trata-se, portanto, de apresentar colecções (entre as quais a Ellipse) e exposições temporárias que contribuam para o enquadramento histórico da arte de hoje, produzindo conhecimento, mas também experiência estética no contexto globalizado da arte dos nossos dias.”

É nesse quadro de entendimento da contemporaneidade que o MAC/CCB se propõe “repensar, em termos actuais, os vários legados que os artistas em diferentes momentos produziram, sob um ponto de vista crítico”. “Em suma, o contemporâneo é o que connosco convive e nos interpela; é o que, no nosso tempo que é diverso e múltiplo, nos interroga criticamente.”

O novo museu do CCB receberá, para já, a mesma verba de 2,1 milhões do Orçamento do Estado que o antigo museu recebia através da Fundação de Arte Moderna e Contemporânea — Colecção Berardo, extinta na semana passada. Para já, não há reforço da verba, disse o ministro ao lado do presidente do CCB, sem, contudo, afastar essa possibilidade: “Veremos, cada coisa a seu tempo.”

Elísio Summavielle disse que, pelo menos para já, tenciona recorrer ao velho sistema de “vasos comunicantes” na gestão do centro cultural. Excluindo a verba do museu, está previsto que o CCB receba do Estado em 2023 uma transferência de 8,4 milhões de euros, disse ao PÚBLICO a secretária de Estado da Cultura, Isabel Cordeiro, que fez parte da administração do CCB até ao ano passado. A esse valor falta acrescentar as receitas próprias, quer da bilheteira, quer do aluguer de espaços. Em 2022 estas receitas chegaram quase a quatro milhões de euros.

Notícia actualizada às 17h30 com declarações do advogado André Luiz Gomes

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