Poeta João Luís Barreto Guimarães é o Prémio Pessoa 2022

João Luís Barreto Guimarães sucede a Tiago Pitta e Cunha. No valor de 60 mil euros, o prémio que é uma iniciativa do semanário Expresso está na 36.ª edição.

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João Luis Barreto Guimarães é o Prémio Pessoa 2022 Nelson Garrido

O poeta, tradutor e médico João Luís Barreto Guimarães ​é o Prémio Pessoa 2022. O anúncio foi feito ao final desta manhã no Palácio de Seteais, em Sintra, por Francisco Pinto Balsemão, que preside ao júri.

"João Luís Barreto Guimarães, médico e cirurgião é uma voz inconfundível na poesia portuguesa contemporânea desde 1989, quando publicou o primeiro livro aos 22 anos", diz a acta do júri.

"Com uma obra vasta que se inscreve simultaneamente na tradição lírica portuguesa, tanto na sua nota histórica como intimista, e numa modernidade europeia e anglo-saxónica, João Luís Barreto Guimarães tem dezenas de livros publicados em Portugal e traduzidos no estrangeiro, na Europa e na Ásia, na América do Sul e do Norte. Nos Estados Unidos foi galardoado com o Willow Run Poetry Book Award, em Filadélfia. Em Portugal, o livro Movimento ganhou em 2022 o Grande Prémio da Literatura. Está representado em variadas antologias e revistas literárias do mundo, com relevo para as de língua inglesa", prossegue a nota.

"João Luís Barreto Guimarães alia à virtude da palavra e da imaginação, uma reflexão por vezes irónica, por vezes realista, sempre duramente trabalhada, sem prejuízo do efeito estético na construção do poema. Homem culto, participante activo da cultura europeia cosmopolita, a sua sensibilidade poética transita da literatura para as outras artes com uma fluidez que não recusa a tinta sentimental ou a demonstração consciente da inconsciência da condição humana", conclui o júri, que além de Francisco Pinto Balsemão incluía ainda Paulo Macedo (vice-presidente), Ana Pinho, António Barreto (cronista do PÚBLICO), Clara Ferreira Alves, Diogo Lucena, Eduardo Souto de Moura, José Luís Porfírio, Maria Manuel Mota, Pedro Norton, Rui Magalhães Baião, Rui Vieira Nery e Viriato Soromenho-Marques.

A Quetzal, editora de João Luís Barreto Guimarães, apressou-se a congratular o novo Prémio Pessoa. Em comunicado enviado à imprensa, destaca a forma como, na obra do poeta e tradutor que é, também, cirurgião plástico no Hospital de Gaia e professor de Introdução à Poesia no curso de Medicina do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, da Universidade do Porto, se foi apurando "uma ironia raríssima entre nós" e uma "melancolia nascida das coisas simples e quotidianas, sem ocultar uma raiz profunda que vai buscar referências à cultura europeia nas suas diversas geografias, do Mediterrâneo à Mitteleuropa, das margens do Levante à contemplação do Atlântico".

"Um poeta europeu"

João Luís Barreto Guimarães nasceu no Porto em Junho de 1967 e fez a sua estreia literária aos 22 anos, em 1989, com a publicação de Há Violinos na Tribo. Em 2011, foi publicada Poesia Reunida, antologia da obra que fora construindo nos sete livros que compunham até então a sua bibliografia. Nova antologia, formada por cem poemas, chegaria em 2019: O Tempo Avanço por Sílabas.

Quando da edição daquela antologia, o poeta dava conta ao Ípsilon de um labor criativo em constante diálogo com o que o antecedera. "Cada vez que edito um livro, tento perceber como se situa em relação aos anteriores; tenho a ideia da continuidade da obra", afirmava. "De certa forma, deve até ser escrito na continuidade da obra e contra essa própria obra no sentido em que haja uma voz e uma obra que cresçam".

Na mesma entrevista, definia-se como "um poeta europeu e não meramente um poeta nacional", tão influenciado pela tradição portuguesa como pela "tradição das traduções". "Respondo por uma tradição que não é só a portuguesa, embora não a renegue. Sou discípulo de Cesário Verde, de Alexandre O’Neill, quero ser discípulo de João Miguel Fernandes Jorge e do Manuel António Pina e de outros, mas também sou de Philip Larkin, de Wislawa Szymborska."

Foi em 2016 que publicou um dos seus livros mais reconhecidos, Mediterrâneo, traduzido em diversos países europeus, no Egipto e nos Estados Unidos, e que lhe valeu o Prémio Nacional de Poesia António Ramos Rosa e o supracitado Willow Run Poetry Book Award. Movimento (2020) é a sua obra mais recente. Em Janeiro do próximo ano, anuncia a Quetzal, será publicado novo livro do poeta, Aberto Todos os Dias.

Enformado pela história e pela tradição, inscreve na sua poesia o desejo de abarcar o mundo global contemporâneo, aquilo que definiu ao Ípsilon como "a multitude de vozes e línguas que constituem a poesia europeia e a poesia anglo-saxónica nos dias de hoje". Nele, o impulso para a escrita nasce de um "espanto inicial", da "capacidade de as coisas me surpreenderem".

Sobressai então uma das marcas da sua escrita, a ironia, recurso a que chama "a vitória dos derrotados", instrumento a que, diz, não pode escapar quem escreve no nosso tempo. "O mundo é absurdo e a maneira mais eficaz de reagir às adversidades é ter essa vitória dos derrotados de plasmar esses momentos através da aparente vitória da ironia; é uma linguagem que permite avançar."

Cronista do Jornal de Notícias durante um ano, aventurou-se pela prosa em Lugares Comuns (2000), sem, ainda assim, abandonar a poesia — tratava-se, afinal, de 52 poemas em prosa.

O Prémio Pessoa é uma iniciativa do semanário Expresso, com o patrocínio da Caixa Geral de Depósitos. No valor de 60 mil euros, vai na sua 36.ª edição, sendo atribuído anualmente a uma personalidade que “tiver sido protagonista de uma intervenção particularmente relevante e inovadora na vida cultural ou científica do país”.

Nos últimos anos foram distinguidos o jurista especializado em assuntos do mar Tiago Pitta e Cunha (2021); os cientistas e investigadores Elvira Fortunato (2020), Miguel Bastos Araújo (2018) Maria do Carmo Fonseca (2010), Henrique Leitão (2014) e Maria Manuel Mota (2013); o actor e encenador Tiago Rodrigues (2019); o arquitecto Manuel Aires Mateus (2017); o artista plástico Rui Chafes (2015); o professor, escritor e tradutor Frederico Lourenço (2016); o escritor e tradutor Richard Zenith (2012) e o ensaísta Eduardo Lourenço (2011).

Mas também já receberam este prémio, que existe desde 1987, os historiadores José Mattoso e Irene Flunser Pimentel; os poetas António Ramos Rosa, Vasco Graça Moura, Manuel Alegre e Herberto Helder (que recusou o galardão), o fotógrafo José Manuel Rodrigues; a artista plástica Menez; os escritores José Cardoso Pires e Mário Cláudio ; o actor Luis Miguel Cintra; o arqueólogo Cláudio Torres; a pianista Maria João Pires; os arquitectos Eduardo Souto de Moura e João Luís Carrilho da Graça; o compositor Emmanuel Nunes; o académico e empreendedor António Câmara; o constitucionalista José Joaquim Gomes Canotilho; o filósofo Fernando Gil; os cientistas António e Hanna Damásio; os médicos João Lobo Antunes e Manuel Sobrinho Simões ou o actual cardeal-patriarca de Lisboa D. Manuel Clemente.

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