Senhorios só poderão exigir dois meses de renda adiantada, mas alteração pode ser pouco eficaz

O Bloco de Esquerda viu aprovada uma proposta de alteração ao OE que determina que os senhorios só poderão exigir até dois meses de rendas adiantadas, bem como uma caução equivalente a duas rendas.

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Os senhorios só poderão exigir até dois meses de rendas adiantadas e uma caução equivalente a duas rendas Miguel Manso

A partir do próximo ano, os senhorios vão passar a só poder exigir até dois meses de rendas adiantadas, um limite que é inferior ao que está hoje definido na lei. Os representantes dos inquilinos falam numa mudança positiva, mas alertam para o risco de a mesma ser pouco eficaz, tendo em conta que o limite já existente, muitas vezes, não é cumprido.

A mudança resulta de uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado para 2023 apresentada pelo Bloco de Esquerda, que foi aprovada esta quarta-feira na discussão que decorre na Assembleia da República. De acordo com a alteração, “o pagamento da renda pode ser antecipado, havendo acordo escrito, por período não superior a dois meses”. Ao mesmo tempo, “as partes podem caucionar, por qualquer das formas legalmente previstas, o cumprimento das obrigações respectivas, até ao valor correspondente a duas rendas”.

Esta proposta vem alterar aquilo que está hoje definido no Código Civil, que determina que o pagamento da renda pode ser antecipado por um período até três meses e que os senhorios podem exigir uma caução, sem limites quanto ao montante da mesma.

A justificar a proposta de alteração dos bloquistas, aprovada na especialidade com os votos favoráveis do Bloco, PS, PCP, Livre e PAN, está “a pressão que se faz sentir no acesso a uma casa por via do arrendamento”, que leva a que exista “um abuso” nas garantias pedidas pelos senhorios para celebrarem contratos de arrendamento. “O valor exigido em rendas antecipadas e cauções impossibilita que muitas pessoas possam aceder ao arrendamento e é uma exigência desproporcional que urge corrigir, limitando os valores que podem ser pedidos para garantir a execução de um contrato de arrendamento”, pode ler-se no documento.

Contactada, a Associação dos Inquilinos Lisbonenses (AIL) vê nesta uma medida “positiva”, que irá “beneficiar, sobretudo, as pessoas com menos rendimentos, que não possam pagar mais do que duas rendas adiantadas”, diz Romão Lavadinho, presidente da associação. Contudo, admite, “esta é uma medida que poderá não ter grande efeito prático na realidade”, tendo em conta que a lei actual já impõe limites ao pagamento adiantado de rendas (o limite actual é de três meses), mas, em muitos casos, não é cumprida.

Isso mesmo, aliás, reconhece o Bloco na proposta de alteração que apresentou: “São comuns os relatos de exigências de um ano de rendas adiantado (algo ilegal, mas que se contorna, alegando que esse montante é a título de caução) ou de valores absurdos, a que se juntam sempre um ou mais fiadores.”

E este não é um fenómeno recente. Já em 2018, por exemplo, o Diário de Notícias dava conta de casos em que os potenciais inquilinos propunham pagar até um ano de renda adiantada, para convencer os senhorios com uma proposta melhor do que outros candidatos, num mercado já então com escassa oferta.

A proposta agora aprovada vem, ainda assim, salvaguardar esse desrespeito pela lei, já que, para além do novo limite ao pagamento adiantado de rendas, impõe-se agora que, sendo exigida caução, esta também não poderá ultrapassar um montante equivalente a duas rendas (uma novidade face à lei actual, que não impõe qualquer limite no que diz respeito à cobrança de caução).

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