Voltar para casa dos pais não significa que falhaste na vida

A ideia de que o futuro das pessoas jovens ficará melhor se estas fugirem das pequenas cidades e áreas rurais para cidades maiores está profundamente enraizada. Mas nem sempre é boa ideia.

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Reuters/MARTON MONUS

“Quando eu andava no secundário”, escreveu recentemente a ensaísta Anne P. Beatty, “ambição significava duas coisas: sair da minha cidade natal e tornar-me uma escritora”.

A ideia de que o futuro das pessoas jovens ficará melhor se estas fugirem das pequenas cidades e áreas rurais para cidades maiores está profundamente enraizada. O sociólogo David Farrugia chamou a isto “centralidade metropolitana da juventude”. No entanto, mantém-se a dúvida sobre se fazer esta mudança é sempre tão fácil assim e se é a melhor forma de conseguir o que alguém quer da vida.

Eu tenho investigado como é que jovens em comunidades rurais escocesas pensam sobre perspectivas futuras. Descobri que deixar ou não a tua cidade natal é uma boa ideia dependendo das tuas aspirações e dos recursos que tens.

Como é que fazemos decisões sobre as nossas vidas

O sociólogo francês Pierre Bourdieu identifica como é que os nossos recursos (a que chama “capitais") potenciam certas oportunidades. Na sua ideia de “hábitos”, no entanto, ele considera como é que os nossos ambientes sociais influenciam a forma como vemos o mundo e as aspirações que desenvolvemos. Estas ideias foram usadas para desenvolver uma teoria de evolução de carreira chamada “careership”.

Os hábitos ajudam-nos a explicar como os lugares onde crescemos influenciam os tipos de futuro que prevemos: aquilo a que aspiramos, não só em termos de emprego, mas também de habitação, vida familiar e comunidade. O conceito mais amplo de capital de Bourdieu, no entanto, pode ser utilizado para explicar como as pessoas têm diferentes capacidades para se afastarem das suas cidades de origem, dependendo dos seus recursos financeiros, redes pessoais e experiências anteriores de mobilidade. Isto sugere que a forma como decidimos onde viver nem sempre é uma escolha simples. As nossas ideias emergem do nosso contexto social e são moldadas pelos recursos de que dispomos.

A investigação sugere que o afastamento das zonas rurais está particularmente ligado à entrada para o ensino superior. Em lugares como o Reino Unido, onde ir para a universidade é uma tradição de longa data, os jovens podem também ter os recursos necessários para se mudarem para estudar, sob a forma de bolsas ou empréstimos, entre outros. Aqui podemos ver como as aspirações e os recursos combinados proporcionam oportunidades para partir.

No entanto, notavelmente, a investigação com jovens de zonas rurais mostrou que não são as oportunidades em si mesmas que explicam porque muitos deixam as suas comunidades. Pelo contrário, o afastamento está associado ao auto-desenvolvimento, à confiança crescente e à independência. Esta distinção é importante. Mostra como o afastamento pode ser algo que se escolhe fazer por outras razões para além do acesso ao que pode ser considerado como “melhores” oportunidades.

Ficar e voltar

Apesar do apelo de partir, nem todos os jovens são capazes ou querem afastar-se das suas cidades de origem. De facto, estudos sugerem que os jovens estão cada vez mais a ficar em casa para os seus estudos ou a regressar a casa depois de se formarem.

Descobri que, em alguns casos, as escolhas para ficar ou regressar são escolhas positivas, relacionadas principalmente com relacionamentos e carreiras. Alguns jovens escolhem regressar para estar perto da família ou para viver com um parceiro e “assentar”.

O regresso a casa também pode ser uma experiência positiva em relação ao trabalho. Os licenciados — especialmente em profissões como o direito, medicina e educação podem descobrir que as suas residências rurais oferecem oportunidades de emprego de acordo com as suas aspirações profissionais.

Trabalhar em lugares mais pequenos pode também apelar àqueles que querem empreender um trabalho mais ligado à comunidade. Além disso, ainda que os salários possam ser mais elevados em algumas grandes cidades, os custos de habitação podem tornar a vida em locais regionais mais acessíveis.

Mas voltar para casa não é necessariamente uma coisa positiva. Por vezes, o regresso a casa é motivado pela insegurança financeira e por dificuldades em encontrar trabalho ou alojamento noutro local. A decisão de regressar também pode ser motivada por circunstâncias de vida difíceis e mais vastas, por exemplo, a ruptura de relações ou a adoecimento de familiares idosos. Na minha investigação, estas experiências de regresso são especialmente desafiantes se os jovens perceberem oportunidades limitadas nas suas carreiras escolhidas na sua cidade natal.

Estudos anteriores mostraram que a “centralidade metropolitana da juventude” influencia frequentemente a forma como os jovens pensam sobre para onde ir e o que fazer. Isto corre o risco de o regresso (ou permanência) em casa ser posicionado como um fracasso pessoal. No entanto, pelo contrário, ficar ou regressar a uma pequena comunidade pode ser uma escolha positiva. Além disso, as escolhas de ficar ou partir são muitas vezes motivadas por circunstâncias fora do nosso controlo.

À medida que as circunstâncias da vida mudam, as decisões de mudança ou de permanência podem ser revistas. O que decides num determinado momento não irá necessariamente moldar o teu futuro para sempre.


Exclusivo P3/The Conversation
Rosie Alexander é docente em Desenvolvimento de Carreira e Orientação na University of the West of Scotland​

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