Reformar e inovar a Administração Pública… com mais do mesmo

A média de idades nos vários organismos públicos só tem subido, o que revela que não é uma carreira atractiva.

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Mario Lopes Pereira

Já não é novidade, apesar de ainda ir sendo notícia, que a Administração Pública em Portugal tem demasiada “papelada”, é burocrática, complicada, de difícil acesso, sendo ineficiente e ineficaz, o que resulta em insatisfação e prejuízo para o funcionamento normal da actividade privada.

Contudo, sempre que se fala em orçamentos, descentralização, despesa pública, vemos novas promessas de uma administração pública eficiente, simples e renovada, com respostas mais rápidas, económicas e ecológicas e outras afirmações inspiradoras. Mas quem tiver conhecimento da realidade sabe serem apenas “palavras ao vento” ou medidas com efeitos marginais, provindas de governantes que parecem querer causar-nos uma dissonância cognitiva… e das grandes!

A Administração Pública conta com mais de 740 mil recursos humanos, mas conforme muitas vezes denotam as estruturas de representação colectiva (vulgo, sindicatos) da função pública, estes são recursos que estão subaproveitados e subpagos. Acrescente-se que o estereótipo de que “não se faz nada” não só atrai quem não deveria, como todos os outros pontos afastam quem tiver melhor hipótese.

Afastam quem, desde logo, no momento da procura. Apesar da transparência e acesso aos vários concursos, o tempo entre concorrer a uma vaga até começar a exercer funções é colossal. Por exemplo, o caso do concurso centralizado de 2019 (que tinha como objectivo de colocar 1000 técnicos), em Setembro de 2021 ainda só tinha colocado 260 técnicos.

Afasta quem possa ter vontade de dirigir os serviços públicos para conseguir inovar e melhorá-los, pois o acesso inclui, por regra, vários anos de experiência em “funções semelhantes” — enquanto for necessário dez anos de experiência, obviamente não haverá inovadores. Os inovadores (que o são, verdadeiramente) arranjam lugar no privado, ou perdem a veia inovadora e vontade de mudar “o mundo” nos dez anos que estariam a “acumular experiencia”.

A média de idades nos vários organismos públicos só tem subido, o que revela que não é uma carreira atractiva. As 35 horas semanais até vão sendo atraentes — à primeira vista —, mas a diferença entre salários privados e da função pública não serve os “melhores”. E mesmo os “bons soldados”, não passam de “cabo raso”, pois até uma módica subida no salário, graças ao SIADAP, demora no mínimo uns quatro anos (para cerca de 5%) ou uma década inteira para a maior parte atingir os “10 pontos” necessários. Só se e quando conseguirem ser colocados… o que também pode ser difícil, dada a quantidade de lugares “pré-reservados” (alegadamente), provas de conhecimento, avaliação psicológica e entrevistas ao longo de seis a nove meses, com sorte.

Em suma, a Administração Pública, mesmo na era da tecnologia, depende das pessoas que a servem com os meios que lhes damos. Quando se quiser beneficiar o saber, sobre o tempo de existência, poderemos ter uma administração jovem, eficiente e eficaz.

É preciso implementar-se, de facto, o que se pretende ver na actividade pública e, ao fazê-lo, escolher quem possa realmente estar na posição de o fazer, dando meios para concretizar e atraindo quem tenha a capacidade e motivação para o fazer. No fundo, tudo menos reformar com mais do mesmo .

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