Jerónimo deixa a liderança do PCP e o lugar de deputado

Líder demissionário do PCP diz que sai desta responsabilidade “de cabeça erguida”.

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Jerónimo de Sousa faz a última conferência de imprensa enquanto secretário-geral do PCP Rui Gaudêncio

Jerónimo de Sousa vai deixar o lugar de secretário-geral do PCP e também o lugar de deputado à Assembleia da República. “Há uma alteração qualitativa das minhas capacidades e, tendo em conta a dimensão da nossa bancada, não se compadece com a ausência” de um elemento. Pela lista da candidatura por Lisboa, deverá ser Duarte Alves a reentrar no Parlamento e isso poderá acontecer mesmo antes do final do processo orçamental.

Numa conferência de imprensa sobre a reunião do Comité Central (CC), o líder do PCP assumiu que a sua saída foi “uma decisão própria” e que se deveu à sua condição física. Não quis especificar quando tomou tal decisão nem quem indicou o nome de Paulo Raimundo para o substituir.

Começou por dizer que “houve alguma surpresa” no CC sobre o nome de Paulo Raimundo, mas, depois, questionado sobre quem havia proposto o nome, Jerónimo recusou dizer, descreveu que a solução começou no secretariado, passou pela comissão política e depois chegou à reunião conjunta do CC. Ainda há duas semanas, numa entrevista à Lusa, Jerónimo de Sousa dizia que iria participar na escolha do seu sucessor.

“Uma confidência que me dá uma satisfação profunda: o comité resolveu concordar comigo [sobre a saída devido à sua saúde e a sua substituição por Raimundo], aplaudindo com quatro minutos de pé este desfecho”, contou Jerónimo sobre a reunião deste sábado, acrescentando que lhe “sabe mesmo muito bem” sentir essa solidariedade - incluindo de pessoas de outros partidos e ideologias.

“Olhando para trás, confesso que, na medida em que participei num processo longo, de 18 anos, como secretário-geral procurei sempre fazer o melhor que sabia (...) nos valores éticos da honestidade, franqueza, fraternidade; tive sempre a posição de pensar o que é melhor para o meu povo”, respondeu Jerónimo de Sousa na conferência de imprensa em que apresentou as conclusões da reunião do CC de ontem.

“Saio desta responsabilidade de cabeça erguida. Conheci derrotas, vitórias, recuos”, vincou, quando questionado sobre se sente alguma responsabilidade pela tendência de queda dos resultados eleitorais do PCP nos últimos anos. “Saio como entrei em termos económicos, independentemente de qualquer subvenção, que não será para mim.”

“Tendo em conta que fui eu que tomei a iniciativa [de sair], a consideração foi feita e posso dizer que o Paulo Raimundo pode ser desconhecido do grande público. Mas quero falar do meu exemplo: quando fui eleito, houve sectores que perguntavam se eu comia e dançava e nem sabiam o meu nome”, descreveu, contando que havia militantes que o chamavam de Germano.

“Como seguimento de uma avaliação própria, resultante de uma reflexão sobre as minhas condições de saúde e as exigentes correspondentes às responsabilidades que tenho vindo assumir como secretário-geral do PCP, coloquei a minha substituição nestas funções, mantendo-se como membro do comité central”, afirmou Jerónimo de Sousa.

Que deixou longos elogios a Paulo Raimundo, cujo nome será ratificado pelo Comité Central no próximo sábado à noite, numa reunião durante a conferência nacional que o partido realiza no Seixal.

“O Paulo Raimundo é um camarada estudioso, que conhece os problemas, que tem tido tarefas de reforço da organização do partido, que tem acompanhado grandes regiões e grandes sectores e teve uma actividade unitária tendo em conta as suas características de envolvimento de democratas, patriotas nos debates do partido.” Acrescentou que “é um homem sensível, que compreende as coisas de uma forma célere. É um camarada modesto, que ouve muito os outros.”

Porém, nunca teve qualquer responsabilidade sobre sectores sindicais - e a rua, já se sabe, será muito importante num período de maioria absoluta no Parlamento e quando a direita também tenta aproximar-se do movimento sindical.

Para Jerónimo, Paulo Raimundo “é uma solução segura, uma solução que corresponde às necessidades do partido neste momento. Tenho a profunda confiança de que ele vai ser capaz de dar conta do recado e concretizar estas responsabilidades e tendo em conta que pertença a uma nova geração que só prestigia e garante ao partido o seu próprio futuro.”

Antes, ladeado por Inês Zuber e por Luís Silva, Jerónimo de Sousa fizera uma longa declaração sobre a reunião do Comité Central da tarde de sábado onde insistiu nas críticas ao Governo de António Costa tanto pelas opções políticas gerais como pelas soluções contidas na proposta do Orçamento do Estado para 2023. Que acabaram por ficar para último plano tendo em conta a substituição do secretário-geral.

“Com o aumento do custo de vida a crescer há mais de um ano, o país assistiu à total inércia do Governo, surdo durante meses perante a necessidade de prevenir e programar atempadamente a tomada de medidas extraordinárias em defesa das condições de vida dos trabalhadores e do povo”, apontou o líder comunista.

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