Quatro em cada cinco cidades mundiais expostas a ameaças climáticas

Relatório indica que eventos climáticos extremos podem afectar mais de 70% da população de cidades portuguesas. O documento da organização CDP analisa dados disponibilizados por quase mil cidades do mundo, incluindo 21 em Portugal.

Foto
Chicago figura no relatório como um estudo de caso por envolver 2100 habitantes na elaboração de planos climáticos Nancy Bourque/DR

Quatro em cada cinco cidades do mundo enfrentam hoje ameaças associadas à crise climática, tais como seca hidrológica ou inundações, revela um relatório da organização sem fins lucrativos CDP. O documento, divulgado esta quinta-feira, analisou dados disponibilizados por quase mil cidades incluindo 21 em Portugal, onde eventos climáticos podem afectar mais de 70% da população.

“Quase todas as cidades portuguesas [18 em 21] afirmaram ter protocolos centrados nas pessoas, o que globalmente é bastante positivo”, afirmou ao PÚBLICO Mirjam Wolfrum, directora de Políticas de Participação da CDP, fazendo uma avaliação favorável do desempenho português. A responsável dá como exemplo o Porto, onde um projecto europeu vai permitir a criação de corredores verdes entre três bairros sociais na freguesia de Campanhã.

Todas as cidades portuguesas que participam no estudo também dispõem de avaliações de risco e vulnerabilidade climática, uma ferramenta considerada essencial para planear e executar medidas para proteger as populações à medida que as temperaturas sobem. O trabalho olhou para os indicadores de 21 municípios de norte a sul do país, desde Braga a Faro, passando por Porto, Matosinhos, Figueira da Foz, Castelo Branco, Lisboa e Évora.

Contudo, apenas 13 das 21 participantes nacionais têm uma meta clara para redução de emissões. “Há certamente oportunidades para melhoria aqui”, observa Wolfrum, que elogiou a participação portuguesa. “Portugal tem uma longa história de partilha de dados, o que é óptimo”, acrescenta a responsável da CDP.

A CDP é uma organização sem fins lucrativos que, até há pouco, se chamava Carbon Disclosure Project (e daí a sigla em inglês). Esta entidade financiada pela União Europeia apoia investidores, empresas, cidades e regiões na avaliação dos impactos ambientais.

Quase mil cidades envolvidas

O documento intitulado Proteger as Pessoas e o Planeta compila e analisa informação facultada este ano por 998 cidades até ao dia 16 de Agosto. Chicago, nos Estados Unidos, Hermosillo, no México, e Atenas, na Grécia, são alguns dos municípios internacionais que partilharam com a CDP pormenores sobre as suas acções climáticas.

A capital grega, por exemplo, foi escolhida como caso de estudo no relatório por ter, nas suas respostas, referido o projecto Adopte Uma Árvore. A iniciativa consiste em envolver a população na rega de espécies arbóreas. Já Chicago destaca-se no relatório por afirmar ter envolvido 2100 habitantes na elaboração de planos climáticos​.

Os resultados revelam que uma em cada três cidades mundiais está exposta a ameaças climáticas que podem afectar pelo menos 70% da população. Um quarto das cidades enfrenta riscos de eventos climáticos extremos – como as ondas de calor – que se podem tornar mais intensos e frequentes até 2025.

As respostas recebidas pela CDP indicam ainda que as cidades estão cientes dos benefícios colaterais que resultam da luta contra a crise climática. Entre as principais vantagens identificadas estão os ganhos em termos de saúde pública (62%); de coesão social (62%); económicos (61%), por via da criação de empregos, e por fim ambientais (55%), que se traduziram no aumento da biodiversidade.

“Este documento sublinha os maiores riscos que as cidades mundiais enfrentam com a mudança do clima, assim como os benefícios de agir – incluindo a purificação do ar, a melhoria da saúde pública e a expansão das oportunidades económicas”, diz Michael Bloomberg, enviado especial das Nações Unidas para a Acção Climática, no comunicado de imprensa.

O relatório mostra que, globalmente, as quase mil cidades que aceitaram participar no estudo estão expostas a riscos climáticos que ameaçam pelo menos 70% das populações. À luz deste número alarmante, o documento recorda que são as pessoas que sofrerão os efeitos concretos da subida da temperatura. E, por isso mesmo, cabe aos decisores “não só proteger vidas e meios de subsistência, mas também melhorá-los”.

Planos centrados nas pessoas

O documento indica que 63% das cidades inquiridas afirmaram ter pelo menos uma das acções dos planos climáticos centrada nas pessoas. E que quase metade (45%) procura envolver a sociedade civil na definição de planos climáticos. Numa nota menos positiva, apenas 39% têm em conta as populações mais vulneráveis, quando fazem avaliações de riscos decorrentes da crise climática.

“Este relatório mostra que a acção climática que põe as pessoas em primeiro lugar melhora as vidas da população. Cria benefícios sociais, económicos e ambientais, melhora a inclusão, e apoia uma transição justa para uma economia de baixo carbono. As cidades que identificam, envolvem e compreendem os grupos vulneráveis vêem benefícios claros e criam um futuro sustentável para as pessoas e para o planeta”, afirma Maia Kutner, directora global interina no CDP, citada na nota de imprensa.

Afinal, o que é exactamente delinear acções climáticas centradas nas pessoas? Os dados solicitados pelo CDP às cidades não olhavam apenas para os esforços de redução de emissões – que são sem dúvida importantes –, mas também (ou sobretudo) para o modo como esses mesmos esforços estão a ter em conta as necessidades humanas, especialmente de grupos vulneráveis como idosos, crianças, famílias com rendimentos baixos, minorias e pessoas com deficiência.

Se as pessoas estiverem no centro das avaliações, da definição de objectivos, do planeamento e da execução dos planos de acção climática, refere o relatório, então está aberto o caminho para cidades mais saudáveis, felizes e inclusivas. Zonas urbanas com estas características estarão mais bem posicionadas em termos económicos, porque atraem investimentos, recursos humanos e contribuintes.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários