Truss estreia-se no pingue-pongue parlamentar a marcar distância para os trabalhistas

Debate muito centrado nos elevados custos da energia serviu para separar ideologicamente as águas entre a nova primeira-ministra e a oposição. Liz Truss disse ainda que não pretende convocar eleições antecipadas.

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Elizabeth Truss teve o primeiro frente-a-frente com Keir Starmer e até fez uma piada sobre a liderança do Labour UK PARLIAMENT/JESSICA TAYLOR HANDOUT/EPA

O primeiro dia completo de Liz Truss como primeira-ministra britânica começou com aquilo que vários antigos governantes descrevem como a prova mais desafiante dos mandatos: uma sessão de perguntas ao primeiro-ministro. É um ritual semanal na Câmara dos Comuns e quase uma lotaria – qualquer deputado pode fazer perguntas sobre qualquer assunto, o que pode mexer com o estado de nervos de um líder de executivo até ao momento em que abandona Westminster.

A sessão desta quarta foi a primeira em que Liz Truss e o líder dos trabalhistas, Keir Starmer, estiveram frente-a-frente. E o chefe da oposição gastou exactamente dois segundos a congratular a adversária antes de passar ao ataque. Como sublinharam vários jornalistas britânicos no fim da sessão, foi uma discussão ideológica, de separação das águas.

Nos minutos em que Truss e Starmer jogaram a um pingue-pongue de perguntas e respostas em que, como habitualmente, nenhum tem muito tempo para pensar (o que exige fazer bem o trabalho de casa), o debate girou sobretudo em torno dos elevados custos da energia.

“As produtoras de energia vão ter 170 mil milhões de libras de lucros excessivos nos próximos dois anos”, denunciou o líder do Labour, disparando: “Está mesmo a dizer-nos que vai deixar estes lucros excessivos intocados enquanto os trabalhadores pagam a factura pelas décadas vindouras?”

Durante a campanha para a liderança dos conservadores, Liz Truss prometeu travar a subida de imposto sobre os lucros empresariais aprovada pelo seu adversário e ex-ministro das Finanças, Rishi Sunak. Esta quarta-feira, no Parlamento, a primeira-ministra reafirmou a posição: “Sou contra a windfall tax [imposto sobre lucros inesperados]. Acredito que é errado desincentivar as empresas de investirem no Reino Unido no preciso momento em que precisamos de fazer a economia crescer.”

Truss também aproveitou para anunciar que esta quinta-feira apresentará um plano para ajudar os britânicos a pagar as contas da luz e do gás.

“Mas o dinheiro tem de vir de algum lado”, disse-lhe Keir Starmer. “Este país não vai conseguir crescimento [económico] com impostos”, contrapôs a governante. “Como raio é que pensa que agora é o momento certo para proteger os lucros da Shell e dar um desconto fiscal à Amazon?”, atirou o trabalhista.

O duelo entre ambos não terminaria sem que cada um pronunciasse frases orelhudas, para gáudio das respectivas bancadas. “Não há nada de novo numa líder conservadora que, quando questionada sobre quem paga a factura, responde ‘é você, trabalhador britânico’”, atirou Starmer. “Pois, não há nada de novo num líder trabalhista que pede mais impostos”, devolveu Truss.

Não haverá eleições antecipadas

Devidamente traçadas as linhas claras que separam ideologicamente o Governo da oposição – o que a generalidade dos analistas considerou ser uma novidade face aos tempos de Boris Johnson –, Truss recebeu um apoio em forma de questão por parte de Theresa May. “Porque será que as únicas mulheres primeiras-ministras foram todas conservadoras?”, perguntou a antiga governante, deixando pronto o palco para que a actual líder tory desse uma bicada política em forma de piada. “É realmente extraordinário que pareça não haver capacidade no Partido Trabalhista para encontrar uma líder mulher ou, sequer, um líder que não seja da zona Norte de Londres.”

Numa sessão que teve perguntas e comentários sobre um pouco de tudo, incluindo uma deputada escocesa a chamar “corrupto” a Boris Johnson e vários trabalhistas a procurarem colar Truss à actuação do antigo Governo, a primeira-ministra rejeitou a necessidade de convocar novas eleições gerais. “O país está a enfrentar problemas muito graves, parcialmente devidos às consequências da covid, parcialmente devidos à guerra de Putin na Ucrânia”, justificou. “O que o povo britânico quer é que o seu Governo resolva os assuntos.”

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