Do nascimento à menopausa precoce

Fosse a menopausa um nicho de mercado e, creio, teríamos uma miríade de soluções ao nosso dispor. Fosse a população masculina afectada pela menopausa, precoce ou não, e, creio, teríamos uma miríade de soluções ao nosso dispor.

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Teymur Gahramanov/Unsplash

Acompanhando de perto este casal nosso amigo, nos seus desafios, inesperados, precoces, encontrámos os nossos desafios. E na sua vida, a vida de todos nós e o tempo é mesmo uma questão: dificuldade em concentrarmo-nos, insónias, metade da noite em pé sem saber porquê, cansaço constante de tudo e de todos, falta de apetite sexual, labilidade emocional, tristeza e depressão mas também ansiedade, falta de autoconfiança, irritabilidade, incontinência, dores durante o acto sexual, dores nas articulações, dores no peito, obstipação, inchaço abdominal, unhas quebradiças, perda de cabelo, prurido, palpitações, aumento de peso, dores de cabeça, períodos irregulares, perda abundante de sangue durante o período e a resposta do médico de clínica geral, que nem para eles olhou, de costas voltadas a teclar no computador atrás dos objectivos, disparada de imediato: “Aos 35 anos de idade a senhora é demasiado nova para estar na menopausa. O que a senhora precisa é de pilates”.

“Pilates?”, disseram, incrédulos a olhar um para o outro, e o médico “pilates”, a repetir “pilates” e a dizer que sim, “pilates”, de modos que “pilates” não fizeram e se calhar está aí o cerne do problema.

E não, nem uma pergunta sobre intervenções cirúrgicas, vulgo histerectomia, tratamentos contra o cancro ou sequer um mínimo de consideração estatística quando uma em cada 100 mulheres com menos de 40 anos sofre de menopausa precoce.

E quando se convive diariamente com os sintomas acima descritos ao longo de anos, onde está a voz do paciente e a acuidade auditiva do médico?

A menopausa precoce ocorre quando algo já não está bem ao nível dos ovários com o consequente declínio hormonal condutor do fim da vida reprodutiva de uma mulher.

A menopausa precoce existe e não é senão depleção hormonal, a mesma depleção hormonal pela qual todas as mulheres, sem excepção, passam ou estarão em vias de passar. Basta deixar passar os anos. Basta viver. E com o aumento da esperança de vida, a menopausa sempre presente durante 1/3 da vida.

Castração química. E natural. Faz parte do ciclo de vida e com tudo o que daí advém. Face a face com o declínio hormonal, isoladas, a falta de apoio, de ajuda e diálogo podem ser mortais, não, são mortais. E neste campo podem os médicos prescrever todos os antidepressivos e mais alguns, todos de efeito nulo quando o problema é hormonal.

Porque é que ninguém nos avisou? Porquê continuar a sofrer em silêncio algo que diz respeito a metade da humanidade? Infelizmente, a compreensão será sempre escassa numa sociedade cada vez mais distante de quem paga o saber dos anos com o peso da idade.

Porque a menopausa não é nem deslumbrante nem glamorosa. E não se fala da menopausa como não se fala da morte.

E, no entanto, fosse a menopausa um nicho de mercado e, creio, teríamos uma miríade de soluções ao nosso dispor. Fosse a população masculina afectada pela menopausa, precoce ou não, e, creio, teríamos uma miríade de soluções ao nosso dispor.

Enquanto lá não chegamos, tenhamos o orgulho de, sem desculpas, falar abertamente sobre a menopausa quando falar salva vidas e falar é o começo, para não dizer a continuação da sororidade.

E ao mesmo tempo exigir mais investimento e mais investigação, uma compreensão mais profunda do sistema endócrino e, quem sabe, a supressão das suas faltas.

Não temos medo de envelhecer. Temos medo de não viver e do que pode acontecer. Agora menos. Agora já sabemos o que nos está a acontecer e o que nos está a acontecer tem um nome.

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