Rankings, exames nacionais e a Lei de Gresham

Ao longo destes mais de 20 anos, os rankings foram dos instrumentos com maior impacto no sistema de que há memória.

Ainda que com notável atraso, temos finalmente divulgados os rankings dos exames de 2021. São os vigésimos primeiros; odiados por muitos, defendidos por poucos, são, apesar de tudo, 22 anos de contínua e consistente divulgação de informação e indicadores úteis sobre uma dimensão importante dos resultados da educação em Portugal. Não é um feito de somenos: a par da taxa de abandono escolar precoce (jovens que abandonam o sistema educativo sem o secundário completo), os rankings são o único indicador de educação em Portugal com que podemos contar de forma continuada e consistente. Porém, enquanto a taxa de abandono precoce é uma medida muito estimada por especialistas e governos e ignorada pela população em geral (incluindo as escolas e os professores), os rankings são vilipendiados por todos, mas seguidos com a maior atenção no recato das suas casas.

Ao longo destes mais de 20 anos, os rankings foram dos instrumentos com maior impacto no sistema de que há memória. Todos querem ficar bem na fotografia e todos analisam as razões pelas quais não ficaram. E não se trata só dos lugares cimeiros. A generalidade dos diretores olha para a sua posição e vai comparar com a de outras escolas que conhece e que sabe servirem uma população semelhante à sua. Basta andar nas redes sociais para ver os sub rankings regionais, locais, distritais… Todos dizem que mal, mas todos procuram ficar melhor na fotografia seguinte. E isto tem algum valor.

Não há conhecimento sem informação e em Portugal temos muito pouca informação relevante sobre o que se passa no sistema educativo. Logo, o conhecimento é muito rudimentar. É certo que a Direção Geral das Estatísticas da Educação e Ciência tem feito um esforço para apresentar estudos mais robustos sobre os percursos dos alunos e para trazer a público mais informação sobre as escolas. Mas a verdade é que mesmo esses estão ainda no início e não têm tido o impacto que têm os rankings. Algum dos leitores sabe o que é um “percurso direto de sucesso”? Sabe se a escola que frequenta, ou a dos seus filhos ou netos, tem bons ou maus resultados neste indicador? Mas aposto que sabe se está bem ou mal no ranking. Duvido que todos os docentes tenham lido o Decreto-Lei n.º 55/2018 de fio a pavio (diploma legal que estabelece a estrutura e regras do currículo nacional), mas desconfio que todos olham para os rankings, todos os anos. A esmagadora maioria dos encarregados de educação não conhece a plataforma infoescolas (plataforma do Ministério da Educação que contém informação sobre as escolas), mas todos conhecem os rankings. O mesmo se diga quanto a alunos, professores universitários, opinion makers, etc…

É claro que as notas dos alunos obtidas em exames finais têm limitações grandes como instrumento de avaliação de uma escola. Mas, na ausência de outro indicador claro e relevante, são o principal instrumento que as pessoas usam para fazer juízos de valor. Nunca pensei que os rankings resistissem tantos anos, mas resistiram. E mostram bem a importância que as pessoas dão à educação. Ao longo dos anos, diferentes ministros tentaram retirar-lhes o monopólio do interesse do público. Seja criando rankings alternativos, seja inundando as redações de informação. Foram sempre mal sucedidos.

Mas algo se passou nos últimos anos que pode mudar drasticamente a história dos rankings. Em 2020 e 2021, por causa da pandemia, não houve exames do 9.º ano e os exames do ensino secundário só foram realizados pelos alunos que deles precisam como prova específica de acesso ao ensino superior. Isto significa mais um ano sem rankings do básico e que o número de exames por escola com que se construíram os rankings em 2021 e 2022 é muito menor. Em paralelo, continuam a ser produzidos indicadores de qualidade com base no número de alunos que completam o básico ou o secundário sem ser retidos nenhum ano. Curiosamente, desaparecendo os exames este indicador disparou…

É simplista usar uma só medida para opinar sobre uma escola, os rankings podem dizer menos do que aquilo que se pensa e muitas vezes é mais acertado ter provas de aferição do que exames. Mas um sistema de ensino sem uma avaliação externa de alunos rigorosa, sistemática e regular vai-se tornando um sistema de ensino mais pobre. A Lei de Gresham também vale na educação.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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