Índice de preços alimentares da FAO está há três meses a recuar

Pelo terceiro mês consecutivo, o índice que agrega a média dos bens agrícolas mais utilizados na alimentação humana registou uma retracção, estando, ainda assim, 20% acima de 2021. FAO estima que, em dois anos de pandemia, a fome passou a afectar mais 150 milhões de pessoas no mundo.

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Guerra na Ucrânia, sem fim à vista, vai continuar a condicionar abastecimento mundial de algumas matérias-primas agrícolas Reuters/GLEB GARANICH

O índice de preços dos alimentos da Organização para a Alimentação e a Agricultura das Nações Unidas (FAO) recuou 2,3% em Junho, para 154,2 pontos, em cadeia. É o terceiro mês consecutivo em queda, após ter atingido o máximo histórico do indicador com 32 anos em Março. O desempenho do mês passado, explica a FAO no comunicado emitido na manhã desta sexta-feira, reflecte “quedas nos preços internacionais dos óleos vegetais, cereais e açúcar, enquanto os preços dos lacticínios e da carne aumentaram”.

O índice alimentar da FAO resulta numa média de cinco índices de preços de bens alimentares (carne, lacticínios, cereais, óleos vegetais e açúcar) ponderados pela média das quotas de exportação mundial de cada um dos grupos no período de 2014-2016. É realizado desde 1990 pela FAO (sigla em inglês para Food and Agriculture Organization of the United Nations).

Na comunicação divulgada esta sexta-feira, a agência da ONU reitera que a leitura dos dados tem que ser devidamente contextualizada. Por um lado, o desempenho de Junho de 2022 – com quatro meses de guerra a devastar a Ucrânia – representa ainda uma diferença, em alta, de 23,1% do índice agregado face a Junho de 2021 – quando o mundo lidava com as sucessivas vagas da pandemia.

Por outro, “os factores que elevaram os preços a nível global ainda estão presentes, como uma procura global elevada, condições meteorológicas adversas em alguns países com peso [no fornecimento mundial de alimentos], custos elevados de produção e de transporte, e disrupções na cadeia de abastecimento devido à covid-19, agravados pelas incertezas decorrentes da guerra em curso na Ucrânia”, explica Máximo Torero Cullen, economista-chefe da FAO, citado no comunicado.

Fome e subnutrição aumentam

Um contexto que deverá aumentar a insegurança alimentar, que nos últimos dois anos sofreu um agravamento extraordinário por causa da pandemia. Na edição deste ano do relatório “Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo (SOFI, na sigla inglesa)”, a FAO estima que “entre 702 e 828 milhões de pessoas foram afectadas pela fome em 2021”.

“O número” de pessoas em situação de fome “aumentou em cerca de 150 milhões desde o aparecimento do surto da pandemia de covid-19 – mais 103 milhões entre 2019 e 2020 e mais 46 milhões em 2021”.

Em 2021, conclui o relatório, “cerca de 2,3 mil milhões de pessoas (29,3% da população mundial) estavam em situação de insegurança alimentar moderada ou grave”: “mais 350 milhões do que antes da pandemia covid-19”. E “cerca de 924 milhões de pessoas (11,7% da população mundial) estavam em situação de grave insegurança alimentar, um aumento de 207 milhões de pessoas em dois anos”.

Apesar da expectativa de que “a segurança alimentar começasse a melhorar, a fome aumentou ainda mais em 2021”, lê-se no relatório. “O aumento da fome global em 2021 espelha desigualdades exacerbadas” dentro de cada Estado e entre nações, “devido a um padrão desigual de recuperação económica entre países e de perdas não recuperadas de rendimentos entre os mais afectados pela pandemia de covid-19”, explica.

Ainda longe de fazer o balanço de 2022, mas tentando já antever tendo em conta os acontecimentos do primeiro semestre, nomeadamente os impactos da guerra na Ucrânia, o relatório projecta, com base em simulações, que “no cenário de choque moderado, o número global de pessoas subalimentadas em 2022 aumentaria em 7,6 milhões”, um número que poderá atingir “13,1 milhões de pessoas” numa estimativa sob a hipótese “de choque mais severo”.

A análise prevê então que “cerca de 670 milhões de pessoas estarão a enfrentar situações de fome em 2030”, daqui a oito anos - o que representa “8% da população mundial, o que é o mesmo que se registava em 2015”, quando a Agenda 2030 foi lançada.

O SOFI é um trabalho conjunto da FAO, do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (FIDA), da Organização Mundial de Saúde (OMS) do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e do Programa Alimentar Mundial (PAM), e foi divulgado esta quarta-feira.

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