Premiada, genuína, a série In My Skin é para já

Chamar-lhe uma série de “coming of age” é pouco. Uma história risonha e dorida sobre as vitórias de uma adolescente apesar das derrotas com que a vida a esbofeteia todos os dias. Premiada, genuína, In My Skin, na Filmin, já na terça-feira.

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Rhodri Meilir, Gabrielle Creevy e Jo Hartley em "In My Skin" BBC

O que dizer de In My Skin, a excelente série britânica que terça-feira, dia 5, chega à plataforma de streaming Filmin? Isso mesmo: que é excelente e que seria fácil dizer que navega nas águas em que há décadas a referência mais evidente para histórias de “gente comum”, seja lá o que isso for, da grande ilha britânica seria Mike Leigh. Mas passou um ror de tempo e as vozes aqui são delas, e dessa geração polifónica aqui encabeçada por Kayleigh Llewellyn mas cuja hidra parece exigir à crítica a referência outras autoras de uma certa “voz”, como Michaela Coel e Phoebe Waller-Bridge. Não é preciso. In My Skin é uma série apoiada nos seus dois pés e é de agora, e para já. Galeses, premiados, adolescentes, tristes e cheios de alegria. Reais.

Referências quasi obrigatórias ultrapassadas, vamos a In My Skin. Sinopse: Bethan tem 16 anos e faz parte de um trio de amigos cujas tardes passam por beber álcool nos parques de Cardiff ou cravar batatas fritas gordurosas depois de uma escola onde saltitam as habituais personagens do “bully” obsceno e da princesinha popular; o que ninguém sabe é que o pai é alcoólico e ameaçador e a mãe bipolar. Autoria: Kayleigh Llewellyn cresceu com uma mãe com um caso grave da doença e sonhou ser actriz; escreveu várias propostas de série e nenhuma foi aceite. Até que verteu o seu olhar privilegiado sobre as múltiplas realidades de se ser feliz apesar da tristeza e pôde passar de viver de uma beneficência para profissionais de televisão e cinema em apuros e fez o que o Guardian considerou “uma preciosidade” e o site Vulture “uma vencedora”.

Que é o que Bethan é. “Vivia com o terror de que os miúdos na minha escola descobrissem que a minha mãe era internada com frequência”, dizia Llewellyn ao Guardian em 2020, dois anos depois de a série ter sido estreada e um ano antes da estreia da segunda temporada (a Filmin disponibiliza ambas na íntegra, num total de dez episódios de meia hora cada). “Pensei que iam gozar comigo, ostracizar-me — ou pior, gozar com a minha mãe.”

Quando a BBC3 disse sim a In My Skin, a autora, que entregou a realização a Lucy Forbes (The End of the F***ing World), deu-lhe tudo. A sua história e até as suas ruas de Cardiff, bem como a genuína pobreza que algumas das suas regiões (estão entre as mais pobres da Europa ocidental) encerra e que outras séries não mostram. Mas esta não é uma série sobre pessoas pobres (só). É uma série sobre a vitória da adolescência sobre a sexualidade, a responsabilidade, a injustiça e, basicamente, crescer. É, por isso, uma série cheia de risos e piadas, de pura diversão e de momentos.

Faltou a ficha técnica: Gabrielle Creevy é uma espantosa Bethan, Jo Hartley é a sua mãe hipnotizante, Rhodri Meilir o pai dos Hell’s Angels mais desconjuntados alguma vez vistos e depois há a avó, os amigos e, mais para a frente, outros temas que tornam a segunda temporada numa sequência, mas sem repetições de refrão, da canção de Bethan.

A primeira temporada, disse Kayleigh Llewellyn quando aceitou o BAFTA de Melhor Drama e Melhor Argumento em Maio último, foi “escrita em cinco semanas, filmada em cinco semanas e feita com um orçamento de 500 libras [577 euros]”. A segunda vinha com toda a expectativa de uma pequena série que foi unanimemente elogiada, e cumpriu. Uma espectadora em particular disse a Llewellyn: “Estou tão orgulhosa de ti”. Foi um telefonema da sua mãe.

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