O vinho certo, com o sommelier Bruno Cunha

Vinhos para combinar com dias de Verão, escolhidos pelo sommelier e gerente de restauração do resort algarvio Palmares – que tem também a seu cargo o estrela Michelin Al Sud, onde assume a pedagogia sobre Vinhos Verdes como parte da missão.

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O vinho para a esplanada, sem comida nem nada, só boa companhia e boa conversa?

O Pequenos Rebentos Alvarinho/Trajadura 2021, do Márcio Lopes, revela um carácter de fruta e algo floral. É fácil de beber, passa perfeitamente sem comida um vinho para iniciar uma tarde que se prolonga por um churrasco à noite.

O Quinta de San Joanne Terroir Mineral, de avesso e loureiro, tem sensação mineral que acrescenta frescura, mas o que destaco é lado cítrico. Associo-o a uma esplanada junto à praia.

E o Quinta de Santiago Alvarinho/Loureiro, que, destes três, é o que tem acidez mais equilibrada. É também o que apresenta mais corpo, através de alguma bâtonnage. Associo-o ao momento de sair do trabalho e descontrair numa esplanada, em contexto citadino. O volume de boca prepara para o jantar que se segue.

E se, entretanto, se optar por mandar vir uma mariscada para a mesa?

No Afluente by Constantino Ramos Alvarinho 2018, destaco o equilíbrio completo em todos os níveis. Teve estágio em barrica, e sente-se leves notas tostadas. Acidez bastante vincada, algo cortante. A nível de estrutura, está bastante harmonioso. Essa acidez – a par de alguma salinidade – é o que faz a boa combinação com a mariscada. Por exemplo, marisco trabalhado na grelha.

O Casa de Paços Reserva Vinhas Velhas Loureiro 2020 tem a particularidade de ter um lote de barrica da colheita anterior, que lhe dá complexidade extra. O do ano foi sujeito a estágio com borras durante 10 meses. Esta junção dá complexidade extra. A sua “gordura de boca”, com a acidez, ajuda a acompanhar qualquer marisco: patés, mariscos mais carnudos (lagostim, sapateira) ou pratos com alguma cremosidade, como arroz de marisco.

O Quinta de Santa Teresa Avesso Unfiltered 2021 destaca-se pelo volume de boca – o avesso, por natureza, é uma casta que dá muito volume. Alguma maceração pelicular e estágio sobre borras dão-lhe ainda mais volume de boca. A sua bela acidez é perfeita para o marisco, apresenta carácter de fruta – mais delicada, de caroço. É um vinho muito versátil e casa bem com marisco ao natural.

Uma sugestão que vá contra tudo o que se imagina para o tempo quente?

O Terrunho d’Alma Reserva Bruto Alvarinho 2016 do José Domingues é um espumante diferenciado. Destaco as notas de biscoito, de mel e algum marmelo. Com esse perfil, à primeira vista, imagino para acompanhar a doçaria de Natal. Nesta altura, pode ser interessante para acompanhar sobremesas, queijos, com a presença da compota de abóbora e frutos secos. Ou rabanada com gelado. Apresenta algum açúcar residual no princípio, mas no final a acidez limpa ajuda a torná-lo harmonioso.

O Aphros Silenus Vinhão 2016, pelo perfil, seria fácil para acompanhar arroz de lampreia ou de cabidela. Contudo, provei recentemente com sabores de maior acidez. Foi trabalhado de forma diferente dos vinhões tradicionais e todo esse processo ajudou a suavizar a acidez e os taninos. É uma boa combinação para comida mais condimentada, como a indiana, e para cozinhas asiáticas – nomeadamente, molhos agridoces.

O Covela Reserva 2007 tinto é um vinho algo complexo, não só pelo estágio mas pela combinação de castas, que ainda mostra alguma fruta fresca. Facilmente o associava ao Inverno, a uma lareira. Ao mesmo tempo, associo-o, numa temperatura mais baixa, a um churrasco de Verão, se possível com carne maturada. Tem os taninos menos intensos, mas ainda brilha com carnes com alguma gordura.

* Depoimento recolhido e editado por João Mestre


Este artigo foi publicado no n.º 5 da revista Singular.

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