A odisseia de Marcelinho do Rio vai continuar

O lateral-esquerdo despediu-se do Real Madrid, depois de 16 anos em que se tornou no jogador mais titulado da história do clube. Futuro pode passar por um regresso ao futebol brasileiro. Ou por Jorge Jesus.

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Marcelo esteve 16 temporadas no Real Madrid Reuters/ISABEL INFANTES

Quem descobriu o talento de Marcelo para o futebol foi o avô. Quem o levava aos treinos, onde quer que fossem, num Carocha laranja, era o avô. Foi o avô que fez Marcelo desistir de desistir de jogar à bola. A odisseia de Marcelinho começou aqui, numa família do bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro, e prosseguiu no Real Madrid, onde ficou 16 anos e se tornou no jogador mais titulado da história de um clube habituado a ganhar. Nesta segunda-feira, Marcelinho do Rio despediu-se em lágrimas do Real Madrid, clube ao qual chegara com 18 anos para ser o sucessor de outro gigante brasileiro da ala esquerda, Roberto Carlos. “Choramos porque temos muitas memórias”, disse, a certa altura, o carioca de 34 anos na conferência de imprensa de despedida no Bernabéu. “Na verdade, estou muito feliz.”

Este não será o fim da linha para o lateral-esquerdo. Mas a decisão sobre o destino seguinte ainda não está tomada — ou, pelo menos, ainda não foi anunciada. Fala-se de um regresso ao futebol brasileiro — ao Botafogo, treinado por Luís Castro e reforçado com o músculo financeiro do seu novo dono, John Textor, ou ao Fluminense, onde começou. Também pode continuar na Europa, onde há várias possibilidades em aberto para cumprir um desejo do jogador, continuar a jogar na Liga dos Campeões — o Fenerbahçe, de Jorge Jesus, dá-lhe essa possibilidade, tal como o Marselha ou o Olympiacos. E há ainda os destinos endinheirados do Qatar, Emirados e Arábia Saudita.

Depois de ter perdido influência nas últimas temporadas, mais um suplente de luxo do que um titular indiscutível, Marcelo deixa o Real Madrid como o jogador que mais títulos conquistou pelos “merengues”. Foram 25: cinco Ligas dos Campeões, seis Ligas espanholas, quatro Mundiais de clubes, três Supertaças Europeias, cinco Supertaças de Espanha e duas Taças do Rei.

Vestiu a camisola dos “blancos” em 545 jogos, marcou 38 golos e fez 103 assistências — números que fazem dos 6,5 milhões de euros que o Real pagou ao “Flu”, em 2006, uma das maiores pechinchas da história do futebol. Fez parte de uma equipa que ganhou como poucas e que, ano após ano, vai perdendo os seus decanos e se renova sem deixar de ganhar — em épocas anteriores já saíram Casillas, Sergio Ramos ou Cristiano Ronaldo, nesta saem Marcelo e Gareth Bale.

“Champions do quê?”

Marcelo chegou ao Bernabéu em 2006. Tinha 18 anos e apenas época e meia na primeira equipa do Fluminense, ainda sem qualquer internacionalização pela selecção brasileira, e iria partilhar balneário com alguns dos maiores craques do futebol mundial, entre eles os compatriotas Roberto Carlos, Emerson, Robinho e Ronaldo. O jovem Marcelinho tinha pouca experiência e nenhum conhecimento do futebol europeu, como contou num artigo publicado em 2017 no Players Tribune: “Até aos 16 anos, eu nem sabia que existia uma Champions League. Um dia, alguns caras assistiam a um jogo na TV, era o FC Porto-Mónaco [final da Champions em 2004]. O jogo parecia diferente […]. A certa altura, eu estava tipo, ‘Ei, que caralho de jogo é esse?’. Meu amigo diz, ‘Champions League’. ‘Champions do quê?’. Não fazia menor ideia do que ele tava falando.”

Mal sabia Marcelo que iria ganhar essa competição desconhecida por cinco vezes, a primeira em 2014, a mais recente há poucas semanas, em Paris. Foram cinco pontos altos a marcar a carreira de um lateral com especial apetência para atacar e que nem sempre era dos mais seguros a defender. Voltando ao artigo do Players Tribune, Marcelo diz que a sua prioridade sempre foi atacar, tal como o seu ídolo, Roberto Carlos. “Ia pra cima e pra baixo como um animal na ala esquerda. Eu adoro atacar. Não é atacar como todos os laterais fazem. É A-ta-car como se eu fosse um ponta mesmo, entende?”

Com 34 anos, o lateral barbudo e cabeludo vai continuar a andar por aí, já um homem feito comparativamente com o “miúdo” que era em 2006. “Não pensei em aposentar-me. Ainda posso jogar — e bem, creio eu”, disse Marcelo, na despedida. E, se for preciso, contra o clube do qual se despediu e do qual saiu como capitão. “Creio que não seria um problema jogar contra o Real Madrid. Fiz tudo o que tinha de fazer com o Real Madrid. Creio que fiz bem.”

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